Na semana passada, o IIF (Institute of International Finance) divulgou alguns dados sobre o nível de endividamento global que preocupam bastante, neste momento em que os principais bancos centrais do mundo se preparam ou avaliam a retirada de estímulos monetários, ao mesmo tempo em que estudam a próxima elevação dos juros básicos.
Lembramos que o Federal Reserve (Fed) já anunciou que vai deixar de comprar títulos no montante mensal de US$ 15 bilhões (sendo US$ 5 em títulos hipotecários), mas as últimas declarações de presidentes de Feds regionais deixaram uma dúvida se esse montante pode ser acelerado e, como consequência, com juros em alta também antecipada. Menos mal que o presidente Joe Biden anunciou a manutenção de Jerome Powell para novo mandato, com Lael Brainard de vice-presidente. Só não disse qual será o destino de Richard Clarida, até então um importante mentor da política monetária na área técnica.
Não é que isso vá influir na política monetária do Fed, já que as decisões são colegiadas e independem da postura do investido no cargo de presidente. Mas, certamente, a recondução de Powell para a presidência acalma um pouco. Para acalmar mais ainda, seria preciso que o Congresso americano desse uma solução sobre o teto da dívida americana que, segundo a secretária do Tesouro, Janet Yellen, pode deixar o governo sem recursos já em 15/12.
Mas, voltando ao tema, o IIF divulgou na semana passada que a dívida global no terceiro trimestre atingiu US$ 296 trilhões, em queda nos países desenvolvidos e em alta nos países emergentes. Desse montante, cerca de US$ 92,5 trilhões se referem aos emergentes e, desse valor, a China detém US$ 36,4 trilhões. Só para dar uma dimensão, em 2020, o PIB dos EUA era da ordem de US$ 22 trilhões, o da China se aproximava de US$ 15 trilhões e, na zona do euro, era próximo de US$ 13 trilhões.
Pois bem, fica fácil imaginar os estragos que uma alta de juros nos países desenvolvidos poderia ocasionar, com destaque para os países emergentes, principalmente aqueles desequilibrados em suas finanças públicas. Basta olhar para o crescimento do serviço da dívida nos países e empresas endividadas.
Se o ano de 2021 será de recuperação até mais rápida que em 2008 (crise do subprime) ou que a intuída pelos governos (até pelo efeito estatístico), em 2022 todas as projeções indicam crescimento mais comedido na avaliação anual, mas com os EUA, a zona do euro e a China mostrando ainda taxas de expansão do PIB.
O Brasil fica fora dessa visão, crescendo menos que alguns desenvolvidos em 2021, o que aumenta o gap, e mergulhando em um “voo de galinha” em 2022. Basta ver as projeções que estão saindo de PIB negativo ou muito próximo de zero, com uma dívida bruta largando de 83% do PIB, um governo fura-teto e com gastanças eleitoreiras.
É nesse quadro que se inserem as discussões dos economistas sobre estagflação e dominância fiscal. Se o PIB do terceiro trimestre for negativo (o que é possível pelos números mostrados de setembro), estaremos diante da recessão técnica, com dois trimestres negativos. O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse em live na sexta-feira passada (19/11) que se a Selic chegar a 2022 em 12%/13% e o PIB crescer 1% no próximo ano, a dívida pública assumiria tendência explosiva.
Só para dar uma dimensão, a pesquisa semanal Focus do Banco Central de 22/11 indica que a Selic no final do ciclo deve estar em 11,50% (com viés de alta), o PIB de 2021 em 4,80% (viés de queda) e o PIB de 2022 com desaceleração para somente 0,70%, também com tendência de encolher bem mais.
Diante de tudo isso, apenas um alívio. As empresas brasileiras com boas governanças se prepararam para um quadro mais complicado do que o governo tentava “vender” para 2022, de crescimento de 2,50% e agora reescrito pela SPE (secretaria de política econômica) para 2,10%. As empresas reduziram alavancagem financeira, se capitalizaram no mercado com IPOs e follow-on, mantiveram recursos e caixas e, com isso, podem atravessar o período projetado de vacas magras do ano eleitoral sem reformas estruturantes.
Por essa razão, intuímos que, para o mercado acionário, o ano pode não ser tão negativo, mas certamente de grande volatilidade.