Má administração, crise econômica e concorrência são apenas alguns dos motivos para que uma empresa acabe se envolvendo em problemas financeiros e, consequentemente, fique endividada. A crise em uma empresa pode chegar ao ponto em que se seja necessária a abertura de um processo de recuperação judicial ou, até mesmo, culminar na falência do negócio.
Recuperação judicial e extrajudicial são mecanismos legais, previstos na Lei nº 11.101/05, que visam a possibilitar a reestruturação de dívidas de empresas, por decisões de maioria, sob a supervisão do Poder Judiciário.
A Recuperação Extrajudicial, por sua vez, funciona como um acordo negociado entre a empresa devedora e um ou mais grupos de credores que pode ser submetido à homologação judicial e, nesse caso, seus termos passam a vincular todos os credores do grupo de credores abrangidos, mediante a adesão de 60% dos credores. A principal diferença para a recuperação judicial é que a efetiva negociação do Plano ocorre antes do ajuizamento do pedido.
Nos últimos anos, por diversas razões, muitas empresas têm encontrado dificuldades para manter as suas atividades de forma sustentável e lucrativa. Esse cenário ilustra o momento de instabilidade da economia brasileira e os desafios que os empresários têm enfrentado.
Embora a legislação de recuperação precise de aperfeiçoamento inclusive, o Projeto de Lei 10.220/18, propondo algumas mudanças, encontra-se em estágio avançado na Câmara dos Deputados, a experiência dos quase 15 anos de vigência da Lei de Recuperação e Falência de Empresas (LRF) tem demonstrado a utilidade da recuperação judicial e extrajudicial como instrumentos para evitar a falência de empresas viáveis.
Algumas empresas que solicitou Recuperação Judicial
- Odebrecht, dívidas de R$ 83,6 bilhões;
- Oi (SA:OIBR3), dívidas de R$ 64 bilhões;
- Sete Brasil, dívidas de R$ 19,3 bilhões;
- OGX (SA:OGXP3), dívidas de R$ 12 bilhões;
- Atvos (antiga Odebrecht Agroindustrial), dívidas de R$ 12 bilhões;
- OAS, dívidas de R$ 11,1 bilhões;
- Ecovix, dívidas de R$ 8 bilhões;
As empresas mencionadas acima, foram os maiores pedidos de recuperação judicial do país.
Como funciona a recuperação judicial de empresas?
O processo de recuperação judicial tem por objetivo viabilizar uma negociação ordenada entre a(s) empresa(s) devedora(s) e os seus credores, com o propósito de reorganizar a empresa e viabilizar a continuidade das suas operações.
Para tanto, a disciplina da recuperação judicial contempla um procedimento específico que ordena formalmente etapas relevantes da negociação, como a forma e o momento da apresentação de um Plano de Recuperação Judicial (“Plano”) e a disciplina da Assembleia Geral de Credores (“AGC”) que deliberará pela aprovação, modificação ou rejeição do Plano.
O ajuizamento de um pedido de recuperação judicial exige o cumprimento de determinados pré-requisitos exigidos pela Lei. São eles:
- Ter pelo menos dois anos de atividade regular;
- Não ter falido antes;
- Em caso de falência anterior, esta deve ter sido declarada extinta;
- Não pode ter obtido a concessão de recuperação judicial nos últimos cinco anos;
- Não pode ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por crime falimentar.
A legislação vigente só se aplica a empresários e sociedades empresárias. Outras organizações, como empresas públicas, sociedades de economia mista, cooperativas de crédito, instituições financeiras, entidades de previdência complementar, sociedades operadoras de planos de assistência à saúde, sociedades de capitalização, seguradoras e concessionárias de energia elétrica não podem requerer recuperação judicial (nem recuperação extrajudicial) e estão sujeitas a regimes próprios para reestruturação do seu passivo.
Etapas da recuperação judicial
Esse processo pode ocorrer em três etapas: a postulatória, deliberativa e a execução.
Na fase postulatória, a empresa ingressa com o pedido de recuperação judicial em si e deve apresentar uma série de documentos que comprovem a situação da crise. Geralmente são apresentados documentos contábeis dos últimos três anos.
Na etapa deliberativa, o juiz decidirá se a empresa tem ou não direito de abrir um processo de recuperação judicial. Caso a decisão seja positiva, será nomeado um administrador judicial. Uma assembleia entre os credores apresentará o plano de recuperação judicial, que deverá ser aceito por unanimidade.
Já na fase de execução, plano de recuperação judicial começa a ser colocado em prática e a sua validade é de dois anos. Para as micro e pequenas empresas esse plano já possui condições pré-estabelecidas pela legislação.
O plano de recuperação judicial e a assembleia geral de credores
A empresa devedora deverá apresentar em juízo o seu Plano de Recuperação, contendo os meios de recuperação e as formas de pagamento dos credores em até 60 dias, sob pena de convolação da Recuperação Judicial em Falência.
O Plano pode prever diversos meios de recuperação judicial, como:
- a reestruturação de dívida, por abatimentos e dilações;
- a conversão de dívida em participação societária;
- a venda de ativos e participação societária.
Após a apresentação do Plano e da lista de credores pelo administrador judicial, qualquer credor poderá apresentar uma objeção ao Plano, para que o juiz convoque uma Assembleia Geral de Credores, que deliberará sobre o plano de recuperação judicial. Há quatro classes de credores que votarão em AGC:
- a classe dos credores trabalhistas;
- a classe dos credores com garantia real;
- a classe dos credores subordinados, com privilégio e quirografários;
- a classe dos credores qualificados como micro e pequena empresa.
A aprovação do Plano dependerá da sua aprovação em todas as quatro classes, observados os quóruns previstos em lei. Se o Plano não obtiver aprovação em todas as classes, o juiz:
- Convolará a recuperação judicial em falência, ou, caso atingidos determinados requisitos legais.
-Imporá a recuperação judicial aos credores apesar da rejeição do Plano.
Créditos sujeitos e não-sujeitos à recuperação.
Há créditos que se sujeitam à recuperação judicial e à recuperação extrajudicial e há outros que não se sujeitam. Os créditos sujeitos (ou concursais) são aqueles que podem ser modificados pelo Plano; os não-sujeitos preservam, em regra, as condições originais. São exemplos de créditos que não podem ser alterados pelo Plano aqueles que passam a existir após o ajuizamento da recuperação e os garantidos por alienação fiduciária (modalidade mais comum de garantia do sistema financeiro).
Embora o Plano modifique apenas os créditos sujeitos, a viabilidade da empresa (e da execução do Plano) depende do pagamento dos créditos não-sujeitos também. Assim, é muito comum que haja negociações paralelas ao Plano envolvendo credores detentores de tais créditos.
Quando não há mais possibilidade de recuperação da empresa, é decretada a sua falência. Diferentemente do que ocorre nos processos de recuperação judicial ou extrajudicial, a empresa é fechada e deixa de funcionar.
A falência pode ser solicitada pela própria organização, pela Justiça ou pelos seus credores. Nesse processo, todos os bens da empresa são arrecadados para garantir o pagamento dos credores. O pagamento será realizado de acordo com a ordem prevista em lei e as obrigações trabalhistas têm prioridade.
Os funcionários e colaboradores da empresa que pediu falência têm direito a todos os créditos trabalhistas, incluindo o pagamento do FGTS, férias proporcionais e 13º salário.
Feitas todas as considerações a respeito da recuperação judicial e extrajudicial de empresas, fica claro que estes são relevantes mecanismos para permitir o alavancamento de empresas viáveis economicamente, mas que atravessam momento de crise.
Nem sempre a recuperação judicial ou extrajudicial serão o caminho adequado ou menos custoso para a solução da crise da empresa, de modo que a análise prévia das opções e seus efeitos, com orientação especializada, é sempre necessária.
Bons Negócios!