O real amargou o pior desempenho global na sessão de ontem fechando em R$ 5,22 com alta de 0,47%. O que prevaleceu foram as incertezas domesticas.
Inflação nos EUA e debate no Fed
Ontem pela manhã, o mercado abriu caindo devido ao índice de preços ao consumidor de julho nos EUA, que veio com alta em ritmo mais moderado e subiu em julho 0,5% e 5,4% em relação ao ano anterior. O que ocorreu foi uma desaceleração que não chega a ser um alívio total no aumento de custos que pesam sobre o sentimento do consumidor. Excluindo os componentes como alimento e energia que são mais voláteis o núcleo do IPC subiu 0,3% em relação ao mês anterior e 4,3% em relação a julho 2020.
A inflação em geral permaneceu historicamente alta por lá, em meio a interrupções na cadeia de suprimentos e uma demanda mais forte por serviços relacionados a viagens com a recuperação da atividade econômica. Com essa desaceleração no aumento de preços ao consumidor, a questão de retirada de estímulos da economia americana permaneceria em stand by, ou seja, aguardando a leitura e discursos dos membros do Federal Reserve (Fed), que tem visões divergentes de quando isso deve ocorrer. Se esse índice tivesse vindo mais forte o mercado entenderia que era sinal de que os estímulos poderiam ser retirados antes e desta maneira fortaleceria o dólar. O IPC vem em linha com opiniões como a do chairman do Fed Jerome Powell e John Williams e alguns membros do Fed mais moderados que estão se concentrando em um caminho mais lento para a normalização da economia americana.
O Senado dos Estados Unidos aprovou um plano de US$ 3,5 trilhões de desembolso para combater a mudança climática e a pobreza na manhã de ontem.
Na contra mão da leitura de um IPC com aumento mais moderado, a presidente do Fed de Kansas, Esther George, disse que chegou a hora da redução dos estímulos. Dentre os motivos ela citou as expectativas de avanço no mercado de trabalho. Segundo ela, a economia apertada de hoje não exige uma política monetária restritiva. George não vota sobre política monetária este ano, mas ela acredita que o progresso substancial foi alcançado ou está muito próximo disso. Ela ainda ressaltou que não há conexão entre diminuir a compra de títulos e aumentar as taxas de juros.
O presidente do Fed de Dallas, Robert Kaplan disse ontem, corroborando a opinião de George que o Fed deveria anunciar o cronograma para o início da redução de compra de títulos no mês que vem e começar a cortá-lo em outubro: "Minha visão é de que, se a economia avançar da maneira que espero ... eu serei a favor de anunciar um plano na reunião de setembro e começar a apertar (a política monetária) em outubro".
Incertezas domésticas no Brasil
Essa queda do dólar pela manhã (bateu mínima de R$ 5,1645) não se sustentou nem até as 11 horas , quando o dólar já batia R$ 5,21. Em um cenário de incertezas domésticas, os comentários do presidente referentes ao governo federal estar estudando a elaboração de uma proposta que proíba os Estados a cobrarem ICMS sobre a bandeira tarifária da conta de luz, durante cerimônia de assinatura de medida provisória que permite a venda direta de etanol para postos de combustíveis, voltando a dizer que a população precisa saber quem são os responsáveis pela elevação dos preços, fez o dólar não manter os níveis mínimos desta manhã.
Claro que não foi apenas isso que deu força ao dólar, afinal também temos que considerar o fluxo estrangeiro de compra de dólares. Além disso, o mercado observou demanda de importador e de tesouraria de bancos, recompondo posições ainda preocupados com os nossos problemas fiscais, com a votação do projeto de reforma do Imposto de Renda na Câmara. E os discursos de que o tapering esteja próximo.
Quando há incerteza, o dólar valoriza, pois é um ativo de segurança.
Dados Econômicos
Por aqui, as vendas do varejo de junho caíram 1,7% após dois meses de alta. Foi a maior retração do setor neste ano. Com isso, o varejo se encontra 2,6% acima do patamar pré-pandemia. No primeiro semestre, o setor acumula 6,7% e, nos últimos 12 meses, 5,9%. Esse resultado pode trazer certo desconforto ao governo, que deverá insistir em estímulos fiscais.
O risco Brasil continua em alta devido a preocupações com as dívidas públicas, a questão dos precatórios e a reforma tributária no geral, o Auxílio Brasil (ex-Bolsa Família) e as tensões e embates políticos, o que limita a valorização do real. A grande preocupação no ambiente local é com a política fiscal. Sob os holofotes está o esforço recente do governo para alterar a dinâmica do pagamento de precatórios diante das limitações do teto de gastos, que "cheira como pedalada fiscal" para os investidores estrangeiros. Se o governo conseguir parcelar os precatórios sem furar o teto de gastos, pode até aliviar um pouco para o real.
Por mais que o Banco Central esteja elevando os juros em ritmo mais intenso, a inflação rodando em 9% em 12 meses mantém o juro real em território negativo, corroendo ainda mais a atratividade do real. Enquanto o BC subiu a Selic neste ano de 2% para 5,25%, o IPCA em 12 meses saltou de 4,52% em dezembro de 2020 para quase 9% em julho de 2021.
Já o fluxo cambial estrangeiro do ano até 6 de agosto ficou positivo em US$ 17,089 bilhões. Depois de encerrar julho com entradas líquidas de US$ 831 milhões, o País registrou fluxo cambial positivo de US$ 917 milhões em agosto até o dia 6.
Agora as atenções devem estar na reforma tributária, a taxação de dividendos e o parcelamento dos precatórios aqui no Brasil e em como a variante delta do coronavírus está impactando na retomada econômica mundial (olhando com atenção os discursos do Federal Reserve para ter ideia do timing deles para retirada de estímulos e subida de juros) para saber para onde vai o dólar.