Com a renda fixa remunerando 1% de juro real ao ano, o investidor conservador foi colocado numa “sinuca de bico”. É saudoso lembrar onde aprendi essa expressão. Anos 1990, Snooker do Tigrão, zona sul de SP. Eu, Paulo Paulada, Armando Bala e Pablo Escobar, cercávamos uma mesa de bilhar cercada por outras muito próximas (Rui Chapéu já meteu o pé do taco na minha orelha).
Naquele local cheio de propostas pouco ortodoxas pra um “jovem de bem”, tivemos a chance de aprender um pouco da malícia necessária à vida, nesse caso, especificamente ao mercado financeiro. A relação risco x retorno nos foi apresentada muito cedo quando decidíamos se valia a pena ou não confiar numa dose de “Bala 12” pelo preço de um “Passaforte”. Ou encarar o cheese salada com a tal maionese da casa, receita que foi enterrada com o dono do lugar, sr. Talao. Nesse caso, preciso dizer, foi o primeiro GAIN da minha vida! Pagaria uma pequena fortuna pra sentir aquele sabor novamente.
A sinuca de bico é uma situação quase impossível. É o típico caso onde você deve assumir que, independente da sua destreza, você perderá se estiver focado apenas naquela jogada.
Solução? Assuma o LOSS e pense na próxima jogada ou em outra estratégia. Mais importante que perder o ponto é perder o jogo, ou como diz Buffet, a primeira regra é nunca quebrar.
É preciso entender que o cenário macroeconômico mundial não permite mais que se tenha 100% de concentração na renda fixa. Para os mais conservadores, a renda variável é algo insano, quase irresponsável. Não os culpo. Décadas e décadas recebendo indicações de investimento de agentes que atuam para o mercado, não para eles. Também tem a questão etimológica da raiz “poupar” e seu radical mais conhecido, a POUPANÇA, forma de investimento que consegue ser menos rentável que o FGTS.
Mas o mundo mudou. A curva de juros que o diga. Assumir risco controlado é o segredo para equalizar os lucros nos investimentos. E o que seria risco controlado? O equilíbrio entre o seu apetite ao risco e a escolha dos ativos mais adequados aos seus objetivos de vida.
O mercado de renda variável é belíssimo. Ao se tornar sócio de uma empresa você a financia ao menor custo possível para ela. Investir em boas empresas significa acreditar na sua marca, no seu produto ou serviço.
A confiança no profissional que montará a estratégia tem que ser absoluta, sem margens para, por exemplo, o receio de expressar sua angústia quando as coisas não vão bem. Afinal, é o gestor de carteiras tem que estar acostumado com a volatilidade, não seu cliente. Cabe a ele racionalizar o porquê da sua tese de investimento ainda se sustentar, e assim tranquiliza-lo.
Sendo assim, sugiro a você, gestor de ativos, que comece introduzindo o seu cliente na renda variável pelos aspectos mais tangíveis a ele como o valor e capilaridade de uma marca, a importância da governança e qual deve ser a aceitação de seus produtos no futuro. Depois se pode entrar em tecnicidades como o papel dos múltiplos na escolha dos ativos.
E isso se aplica também à estratégia de gestão passiva via fundos de ações e multimercados. Conhecer os vieses dos seus gestores e um pouco da sua personalidade (centralizadora, na tomada de decisão, ou aberta às decisões da equipe) também deve anteceder a análise do retorno histórico do fundo, sua volatilidade e índice sharpe.
Desta forma, a renda variável será aos poucos desmistificada, tornar-se-á interessante ao investidor e com o tempo, ele entenderá que a volatilidade pode ser mais amiga do que inimiga – principalmente se, nos momentos de queda, ele optar por abrir mão de mais um pouquinho daquela cepa que ainda está sob os braços dos Poupançudos.