O nível de tensionamento que atingiu as relações entre Planalto e Banco Central não pode passar desapercebido e, por mais que eu acredite ser apenas jogo de cena esta celeuma criada, há que se considerar alguns aspectos desta falsa disputa.
Digo falsa disputa porque, no limite, nenhum dos dois lados da questão vai de fato fazer o que os grupos que os cercam acham que deveriam fazer; Lula não vai acabar com a independência do Banco Central (simplesmente não vai gastar capital político nisso logo agora) e Campos Neto não vai deixar os juros no atual patamar até o fim do ano (a tendência é de queda da Selic segundo o próprio relatório Focus e no mais o aperto monetário de outros países irá ajudar a controlar a inflação por aqui também).
Dito isso, cabe entender alguns aspectos básicos de política monetária para podermos colocar a “bola no chão” e, por fim, separar o joio do trigo neste sarapatel indigesto dos últimos dias.
Em primeiro lugar, política monetária não é a Selic, mas também a Selic. Quem acha que a taxa curta é a mais relevante não sabe, ou ignora de maneira útil, que o mais importante é o complexo de taxas de vencimento mais longos, também conhecido como “curva de juros”. Cortar na marra a Selic no curto prazo, dependendo da forma que se faz isso, tem efeito deletério sobre o “resto do futuro”.
Neste sentido, fritar o Campos Neto até que saia ou peça para sair só vai trazer elevação do custo da dívida, seja porque ainda não há arcabouço fiscal definido e, agora, se terá dúvida sobre a condução do Sistema de Metas de Inflação. O custo que se está contratando para um eventual novo presidente do BCB ou um novo diretor é muito mais vezes elevado que seria necessário.
Não digo isso porque eu goste do presidente do BCB - apesar de poder assegurar que nunca presenciei nenhuma atitude que o desabone, muito pelo contrário, ele sempre foi absolutamente correto e tem prestado um grande serviço avançando pautas da agenda BC# que se iniciou na gestão de Alexandre Tombini e que irá revolucionar o mercado de capitais no Brasil criando mais competição - mas apenas para salientar que os que querem juros mais baixos estão fazendo um movimento errado.
Não é porque os juros estão altos que se pode achar que é possível remover por decreto a lei da oferta e da procura. Como se diz: dois erros não fazem um acerto.
O clima está tão poluído que algumas sandices estão correndo pelas redes justamente pelos que querem juros mais baixos e que assumo tacitamente que sejam de esquerda.
Há quem queira tirar Campos Neto por não ter cumprido a meta de inflação os últimos anos e sendo assim foi ineficaz na sua função. Pois bem, gostariam que ele e a diretoria do BCB tivesse colocado os juros mais altos? Certamente que não…
Outro argumento ainda mais falacioso é aquele que diz que Campos Neto não foi eleito e, por isso, não teria legitimidade. Ora, não era esse o mesmo argumento odiento que bolsonaristas radicais usavam para atacar os ministros do Supremo?
Atacar instituições - como o Banco Central - é o caminho da destemperança e de anomia.
Dois erros, já sabemos, não faz um acerto.
Fiquemos agora na questão prática desse embate e, como veremos, é bem mais simples e benigna do que parece numa primeira leitura.
É notório que Campos Neto e Haddad tem uma boa interlocução e isto é chave para melhorar a dinâmica das opiniões e consensos sobre os juros futuros no país. Haddad e equipe sabem muito bem que terão que construir certa austeridade este ano com vistas a organizar a casa para os anos que virão. O gasto vai se elevar uma vez que a máquina pública foi deixada rodando a seco na gestão passada, mas não há sinais de maiores gastos, especialmente com o Congresso que aí está, e que há evidências que não será gastador, por assim dizer.
Para além disso, os economistas ouvidos pelo Focus esperam que o IPCA retroceda na comparação em 12 meses ao longo deste ano. Segundo o TOP 5 de médio prazo, o IPCA em 12 meses em junho deste ano estará em 3,85%.
Alguém em sã consciência acredita que o Copom irá deixar a Selic em 13,75% com um IPCA em 3,85%?
Entendo o entorno do presidente pedir a cabeça de Campos Neto, só posso imaginar o quanto o presidente tem ouvido falar disso todo o dia e é justamente por isso que acredito que Lula está fazendo um jogo de cena: ele precisa aplacar sua base para poder negociar com mais liberdade depois com o BCB.
Política Monetária é muito mais que uma técnica, é uma arte que se equilibra no fio do bigode.
O futuro (e os juros) são uma invenção, e quem quer cravar hoje o que vai ser amanhã vai gastar uma energia brutal para aparar as arestas da realidade até chegar lá.
Não precisamos desse ruído agora, especialmente porque o cenário é benigno. Como já disse, o mercado financeiro sempre vai ganhar dinheiro, o segredo é fazer o mercado ganhar dinheiro na direção “certa”.
Digo falsa disputa porque, no limite, nenhum dos dois lados da questão vai de fato fazer o que os grupos que os cercam acham que deveriam fazer; Lula não vai acabar com a independência do Banco Central (simplesmente não vai gastar capital político nisso logo agora) e Campos Neto não vai deixar os juros no atual patamar até o fim do ano (a tendência é de queda da Selic segundo o próprio relatório Focus e no mais o aperto monetário de outros países irá ajudar a controlar a inflação por aqui também).
Dito isso, cabe entender alguns aspectos básicos de política monetária para podermos colocar a “bola no chão” e, por fim, separar o joio do trigo neste sarapatel indigesto dos últimos dias.
Em primeiro lugar, política monetária não é a Selic, mas também a Selic. Quem acha que a taxa curta é a mais relevante não sabe, ou ignora de maneira útil, que o mais importante é o complexo de taxas de vencimento mais longos, também conhecido como “curva de juros”. Cortar na marra a Selic no curto prazo, dependendo da forma que se faz isso, tem efeito deletério sobre o “resto do futuro”.
Neste sentido, fritar o Campos Neto até que saia ou peça para sair só vai trazer elevação do custo da dívida, seja porque ainda não há arcabouço fiscal definido e, agora, se terá dúvida sobre a condução do Sistema de Metas de Inflação. O custo que se está contratando para um eventual novo presidente do BCB ou um novo diretor é muito mais vezes elevado que seria necessário.
Não digo isso porque eu goste do presidente do BCB - apesar de poder assegurar que nunca presenciei nenhuma atitude que o desabone, muito pelo contrário, ele sempre foi absolutamente correto e tem prestado um grande serviço avançando pautas da agenda BC# que se iniciou na gestão de Alexandre Tombini e que irá revolucionar o mercado de capitais no Brasil criando mais competição - mas apenas para salientar que os que querem juros mais baixos estão fazendo um movimento errado.
Não é porque os juros estão altos que se pode achar que é possível remover por decreto a lei da oferta e da procura. Como se diz: dois erros não fazem um acerto.
O clima está tão poluído que algumas sandices estão correndo pelas redes justamente pelos que querem juros mais baixos e que assumo tacitamente que sejam de esquerda.
Há quem queira tirar Campos Neto por não ter cumprido a meta de inflação os últimos anos e sendo assim foi ineficaz na sua função. Pois bem, gostariam que ele e a diretoria do BCB tivesse colocado os juros mais altos? Certamente que não…
Outro argumento ainda mais falacioso é aquele que diz que Campos Neto não foi eleito e, por isso, não teria legitimidade. Ora, não era esse o mesmo argumento odiento que bolsonaristas radicais usavam para atacar os ministros do Supremo?
Atacar instituições - como o Banco Central - é o caminho da destemperança e de anomia.
Dois erros, já sabemos, não faz um acerto.
Fiquemos agora na questão prática desse embate e, como veremos, é bem mais simples e benigna do que parece numa primeira leitura.
É notório que Campos Neto e Haddad tem uma boa interlocução e isto é chave para melhorar a dinâmica das opiniões e consensos sobre os juros futuros no país. Haddad e equipe sabem muito bem que terão que construir certa austeridade este ano com vistas a organizar a casa para os anos que virão. O gasto vai se elevar uma vez que a máquina pública foi deixada rodando a seco na gestão passada, mas não há sinais de maiores gastos, especialmente com o Congresso que aí está, e que há evidências que não será gastador, por assim dizer.
Para além disso, os economistas ouvidos pelo Focus esperam que o IPCA retroceda na comparação em 12 meses ao longo deste ano. Segundo o TOP 5 de médio prazo, o IPCA em 12 meses em junho deste ano estará em 3,85%.
Alguém em sã consciência acredita que o Copom irá deixar a Selic em 13,75% com um IPCA em 3,85%?
Entendo o entorno do presidente pedir a cabeça de Campos Neto, só posso imaginar o quanto o presidente tem ouvido falar disso todo o dia e é justamente por isso que acredito que Lula está fazendo um jogo de cena: ele precisa aplacar sua base para poder negociar com mais liberdade depois com o BCB.
Política Monetária é muito mais que uma técnica, é uma arte que se equilibra no fio do bigode.
O futuro (e os juros) são uma invenção, e quem quer cravar hoje o que vai ser amanhã vai gastar uma energia brutal para aparar as arestas da realidade até chegar lá.
Não precisamos desse ruído agora, especialmente porque o cenário é benigno. Como já disse, o mercado financeiro sempre vai ganhar dinheiro, o segredo é fazer o mercado ganhar dinheiro na direção “certa”.