O desempenho de Wall Street desde o dia da eleição nos Estados Unidos, na terça-feira, mostra que um presidente democrata e um Congresso dividido é o melhor cenário para os ativos de risco. E este parece ser o resultado mais provável, com Joe Biden desbancando Donald Trump e os republicanos mantendo o controle no Senado, após invadir a Câmara.
O ex-vice-presidente encurtou a diferença de votos na Pensilvânia e também na Geórgia, onde o candidato à reeleição ainda lidera. A contagem prossegue hoje e uma eventual virada pode garantir a vitória a Biden. Trump, então, voltou a falar em fraude, o que levou redes de TV a tirar o discurso do ar, ao colocar a lisura eleitoral nos EUA em dúvida.
Com a incerteza em torno da eleição diminuindo cada vez mais, os índices futuros das bolsas de Nova York amanheceram propensos a embolsar os ganhos acumulados nas últimas quatro sessões, em um típico movimento de “sobe no boato, realiza no fato”. Ainda assim, permanece a aposta de que é improvável que grandes mudanças políticas ocorram.
A leitura dos investidores é de que essa divisão de poder entre a Casa Branca e as duas alas do Capitólio reduz as perspectivas de aumento de impostos e regulamentações sobre as empresas, ao mesmo tempo em que eleva a chance de um novo pacote fiscal. A isso, soma-se a disposição do Federal Reserve em apoiar a economia com estímulos adicionais.
Ontem, o Fed disse estar “preparado” para ajustar a postura da política monetária conforme apropriado, caso a pandemia da covid-19 continue provocando riscos consideráveis às perspectivas econômicas. Essa disposição do Banco Central dos EUA mantém o dólar no menor nível em dois anos, mas o petróleo cai.
É a pandemia!
Portanto, ao invés de concentrar os esforços no combate à covid-19, com os EUA superando ontem a marca sombria de 100 mil casos diários pela primeira vez, os poderosos em Washington lançam mão de instrumentos artificiais para tentar evitar um duplo mergulho da atividade. Para o mercado financeiro, o importante é o dinheiro disponível no sistema.
Mas tais recursos neutralizam o “espírito animal” que impulsiona a recuperação econômica e não encorajam as pessoas a usar serviços ou frequentar lugares onde as medidas de contenção do vírus não funcionam. Ou seja, com o fim da disputa política e em alusão ao clichê eleitoral de 1992, “é a pandemia (!)” que pode provocar uma recessão nos EUA.
Dessa forma, esse cenário mais construtivo entre os ativos de risco tende a ser apenas no curto prazo, podendo se prolongar ao longo do tempo apenas se os obstáculos da disseminação do coronavírus forem superados. Aí só com ações de prevenção e protocolos de tratamento mais robustos - ou se uma vacina eficaz surgir nos próximos meses.
A Europa é a que mais vem sofrendo com uma segunda onda de contágio, que ameaça interromper a retomada econômica na região. Com isso, as bolsas europeias abriram no vermelho, após uma sessão mista na Ásia, que já avalia os impactos de um novo ciclo de infecção da doença no Ocidente.
Dia de IPCA e payroll
A semana chega ao fim com as atenções divididas entre os números oficiais de outubro da inflação ao consumidor brasileiro (IPCA) e do relatório sobre o mercado de trabalho nos EUA (payroll). Para o índice de preços, a previsão é de aceleração a 0,85%, com a taxa acumulada em 12 meses aproximando-se do centro da meta deste ano (4%), indo a 3,9%.
Para se ter uma ideia, até dois meses antes, o resultado acumulado do IPCA situava-se abaixo do piso do intervalo de tolerância perseguido pelo Banco Central, de 2,50%. Já a taxa mensal deve ser a maior para o mês desde 2002 (+1,31%). Os dados efetivos serão conhecidos às 9h. Pouco depois, às 10h30, é a vez do payroll.
A expectativa é de que tenham sido criadas 600 mil vagas nos EUA em outubro, dando continuidade ao ritmo de desaceleração na geração de postos de trabalho, após o pico em junho, o que mantém quase 5 milhões de pessoas sem emprego desde o impacto da pandemia. Ainda assim, a taxa de desemprego deve cair a 7,8%.
A agenda econômica norte-americana traz ainda os estoques no atacado (12h) e o crédito ao consumidor (17h) em setembro. Também por aqui, sai o IGP-DI do mês passado, que deve seguir com taxas “salgadas”, com alta mensal superior a 3%, levando a um resultado em 12 meses já na faixa de 20%.