Não comece errando
Não é novidade nenhuma dizer que o número de investidores na bolsa vem crescendo bastante. Saímos de pouco mais de 800 mil pessoas no final de 2018 para mais de 3,2 milhões de investidores no final de 2020. Por um lado, é uma evolução que temos que comemorar; por outro, acho que há muito a conquistar ainda.
Uma parte desse pessoal que colocou o seu pezinho na bolsa pela primeira vez nesse período certamente investia parcela significativa do seu patrimônio em títulos do governo – lembra daquelas épocas de bom e velho CDI?
Com a queda da taxa básica de juros que observamos até então (apesar da nova alta, entendo que ainda seguimos em patamares bem abaixo do que estávamos situados há não tanto tempo atrás), muitos se viram na situação de buscar outros meios para rentabilizar o seu patrimônio e obter, assim, retornos próximos ao que era de costume. Ou seja, tudo isso se traduziu, na prática, em investidores tomando mais risco.
Contudo, percebemos que muitos acabam entrando nesse mundo pela porta dos fundos, acreditando em retornos rápidos e partindo para apostas especulativas altamente arriscadas, como o daytrade, derivativos (algo que definitivamente não é recomendado pra quem está começando) ou até mesmo opções binárias.
Como entram sem saber o que estão fazendo, a maioria esmagadora dessas pessoas está, infelizmente, fadada ao fracasso. Aí, depois, a justificativa é que bolsa não é o caminho, é arriscado demais e que aquilo não é para elas.
Calma lá, não é bem assim! Por que não começar com o pé direito, indo aos poucos e em uma classe de ativos que apresenta menos risco? Pensando no longo prazo? Garanto que é um caminho menos doloroso e nem tão assustador assim…
O caminho certo
Por que não começar investindo em dividendos?
As ações que são conhecidas por serem boas pagadoras de dividendos – comumente chamadas apenas de ações de dividendos – são, em geral, empresas rentáveis, com lucratividade consistente, maduras e em setores mais consolidados.
As cotações dessas ações costumam ter uma oscilação muito mais amena do que ações de crescimento ou de turnaround, mas isso não quer dizer que, nos momentos de extremo caos no mercado, também não estejam sujeitas a irracionalidades, como quando os preços caem de maneira muito mais intensa que o valor/resultado.
Por outro lado, em ocasiões como essas, os proventos dessas empresas que são distribuídos para os acionistas costumam nem sofrer tanto – e vou além: se as ações caem sem motivo e o dividendo não muda, o yield (rentabilidade com dividendos) se torna ainda maior para quem está entrando. E quem busca dividendos busca yield…
Vamos fazer um exercício hipotético para representar um pouco do que estou falando!
Consideraremos que temos uma taxa de juros de 4 por cento ao ano e que uma ação de uma companhia de transmissão de energia elétrica (XPTO3) apresenta um dividend yield de 8 por cento ao ano – veja que, só aí, já temos duas vezes a taxa de juros apenas considerando os dividendos.
Agora, vamos supor que passamos por um momento de estresse de mercado que não afeta tão diretamente os fundamentos do setor de transmissão de energia, um segmento pouco dependente de PIB e da atividade econômica, uma vez que, com ou sem crise, a empresa continua sendo remunerada pela disponibilidade das suas linhas de transmissão, e não por quanta energia está passando por ali.
Vamos adotar, ainda, que a ação apresente uma queda de -30 por cento ao longo desse período de estresse, acompanhando boa parte do que está acontecendo no mercado como um todo.
Se o dividendo esperado não muda, já que não houve alteração nas perspectivas operacionais da Companhia e ela deve continuar a entregar bons resultados, e a ação cai -30 por cento, o yield iria de 8 por cento ao ano para 12 por cento ao ano, o que agora equivale a três vezes a taxa de juros.
Por isso, quando a bolsa cai, é imprescindível entender que isso nem sempre vai significar risco e adversidade, mas sim oportunidade.
Claro que, em cada crise, diferentes setores e empresas da economia são afetados de maneira distinta. Se, no exemplo, tivéssemos falado de uma crise regulatória no setor de energia, tudo seria diferente e, por conta disso, é importante ter uma carteira diversificada setorialmente. Sim, fazer análise importa, e importa muito!
Por que falei isso tudo: empresas com fama em dividendos são as mais resilientes e, quando o mercado proporciona janelas de oportunidade, você ainda consegue levar um yield bem melhor para casa. Cada novo aporte ou reinvestimento que for realizado a um preço mais baixo resultará em melhor remuneração de capital em termos de dividendos, tudo mais constante.
Portanto, quando a ação cai, o seu dividendo cai também? A resposta é NÃO!
Os dividendos apresentam relação direta com o lucro da Companhia e com o payout que é estabelecido. Logo, o dividendo por ação a ser distribuído não muda com as oscilações da ação, mas sim se o lucro tiver alguma alteração nesse momento de crise. Compre nas quedas e aproveite a oportunidade!
Por que começar com dividendos é interessante: i) você investe em classes de empresas que possuem, em condições normais, menos volatilidade que a média de mercado, o que é ótimo para o psicológico e para trazer maior segurança e conforto ao investidor que está entrando; ii) quando a irracionalidade toma conta, você compra o mesmo fundamento pagando menos e ainda leva um retorno com dividendos melhor; iii) o retorno com proventos acaba sendo uma rentabilidade adicional ao ganho de capital, compensando o retorno em momentos de queda; e iv) quando o dividendo é reinvestido, podemos ter uma alavanca bem interessante para a rentabilidade total com o passar do tempo.
Forte abraço e até a próxima.