A aversão à perda
Uma das contribuições mais importantes das finanças comportamentais ao mundo dos investimentos é a famosa prospect theory (teoria da prospecção ou da perspectiva).
Kahneman e Tversky estudaram o comportamento dos indivíduos em situações que envolvem riscos dentro de prospectos de ganhos ou perdas e descobriram que os eles não são tão racionais quanto as teorias econômicas normalmente assumem.
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As escolhas das pessoas não são motivadas apenas por ganhos e perdas potenciais, mas pelo valor que elas atribuem a ganhos e perdas. Os resultados dos estudos demonstraram que as perdas são consideravelmente mais indesejadas do que ganhos da mesma magnitude são desejados.
Ainda, a linguagem usada para apresentar potenciais ganhos ou perdas também tem grande influência na decisão final que será tomada, na psicologia isso é conhecido como framing – a forma como as escolhas são apresentadas.
Por exemplo, a maioria das pessoas rejeita participar de um jogo de cara ou coroa em que se ganha 100 reais ao vencer e se paga 100 reais ao perder, mesmo sabendo que aposta é justa e que no final de algumas rodadas o valor esperado é zero: 0,5*100 + 0,5*(-100)=0.
Kahneman e Tversky testaram esse experimento com diversos indivíduos e foram variando a matriz de retornos até descobrirem que era necessário propor cerca de 250 reais no caso de vitória para que as pessoas aceitassem participar do jogo. Note que, nesse caso, o valor esperado da aposta é de 75 reais: 0,5*250 + 0,5*(-100)=75.
Dessa forma, os pesquisadores descobriram que perdas são 2,5x mais indesejadas do que ganhos equivalentes são desejados. Em outras palavras, perder 1 real é 2,5x mais doloroso do que ganhar 1 real é prazeroso.
No entanto, em um cenário em que se escolhe entre (i) uma perda certa de 750 reais e (ii) 75 por cento de chance de perder 1.000 reais e 25 por cento de chance de não perder nada, 90 por cento dos participantes escolheram a segunda opção.
Note que o valor esperado das duas opções é o mesmo (-750), mas quando as pessoas estão em uma situação em que a perda é uma realidade, o comportamento muda e elas não apenas toleram, mas buscam o risco.
Os pesquisadores também demonstraram como a forma de apresentar um problema influencia as escolhas dos indivíduos (framing effect). Quando as opções são apresentadas em termos de ganhos, o comportamento observado é o de aversão ao risco, entretanto, quando as opções são apresentadas em termos de perdas, as pessoas buscam o risco.
Por exemplo, em uma situação na qual é esperado que uma doença mate 600 pessoas, duas alternativas de programas são apresentadas: (i) 200 pessoas serão salvas e (ii) existe ⅓ de chance de salvar as 600 pessoas e ⅔ de chance de não salvar ninguém.
Novamente, o valor esperado para o número de pessoas salvas é o mesmo nas duas alternativas (200) mas, considerando os possíveis ganhos apresentados nas alternativas, 67 por cento das pessoas escolheram a primeira opção.
Contudo, quando o mesmo problema foi apresentado, mas as alternativas eram formuladas em termos de perdas: (i) 400 pessoas morrerão ou (ii) ⅓ de chance de que ninguém morra e ⅔ de chance de que todos morram, 75 por cento das pessoas escolheram a segunda opção.
Orgulho e arrependimento
Outra importante contribuição das finanças comportamentais ao mundo dos investimentos é o estudo da influência das emoções de orgulho e arrependimento no comportamento dos investidores.
Quem já investiu sabe que é difícil admitir que uma ação ruim foi escolhida (até para si mesmo). Sentimentos de arrependimento podem ser ainda mais amplificados quando é preciso admitir o erro para amigos ou familiares.
Por outro lado, os investidores costumam ficar bastante orgulhosos ao contar para o mundo inteiro (principalmente para o vizinho ou para o tio/primo no churrasco da família) sobre seus investimentos bem-sucedidos, que resultaram em grandes lucros.
É comum, principalmente dentre os menos experientes, o sentimento de que se uma posição perdedora for mantida, eventualmente ela vai se recuperar e o arrependimento será evitado.
Essas emoções de orgulho e arrependimento também podem estar por trás da tendência que os investidores têm de segurar suas posições com prejuízo por mais tempo do que deveriam e vender suas posições lucrativas antes da hora.
Foi isso que o estudo de Barber e Odean sobre o histórico de operações de mais de 10 mil clientes de uma grande corretora demonstrou, existe até um nome bonito para tal comportamento – disposition effect (efeito disposição).
Enquanto vender ações que subiram permite que o investidor realize lucros e infle sua autoestima, vender ações no prejuízo leva à realização dos dolorosos efeitos das perdas e do arrependimento.
Algo similar é observado no mercado imobiliário – quando o preço dos imóveis está subindo, o volume de vendas aumenta e as casas rapidamente são vendidas pelo preço pedido ou até acima. Já quando os preços estão caindo, o volume de vendas diminui e as pessoas deixam suas casas à venda por longos períodos, com preços anunciados bem acima dos de mercado no momento.
Contudo, essa relutância em realizar prejuízos é um comportamento subótimo no mundo dos investimentos, em que existe um benefício fiscal gerado ao realizar um prejuízo e as opções de investimentos são líquidas e abundantes.
Se ao vender uma ação com lucro você precisa pagar o imposto sobre o ganho de capital imediatamente, ao vender uma ação com prejuízo você acumula um benefício fiscal que reduzirá o imposto de renda devido em futuros lucros com ações.
Mesmo que você acredite que a ação no vermelho possa se recuperar no futuro, simplesmente não há nenhum motivo para recuperar o prejuízo com essa ação se existem oportunidades melhores de investimento no mercado.
Se for para vender, venda as que caíram, não as que subiram
A psicologia provou que as pessoas são muito mais impactadas por perdas do que por ganhos de mesma magnitude, mas que, paradoxalmente, tendem a assumir maiores riscos para evitar perdas do que para obter ganhos.
Isso significa que os investidores tendem a evitar vender as ações que caíram para não realizar perdas e não precisarem admitir que cometeram erros. Por outro lado, eles tendem a vender rapidamente as ações que subiram para sentir o gostinho do sucesso e de estarem certos.
Em alguns casos, especialmente quando o mercado como um todo está sofrendo fortes quedas ou quando você tem fortes motivos para acreditar que a companhia terá sucesso, faz todo o sentido não vender. Nessas circunstâncias, você poderia sofrer um arrependimento duplo ao ver as ações subirem logo depois de vendê-las.
Mas quando a confiança na empresa investida já não existe mais, independentemente se a realidade da empresa mudou ou se você descobriu um erro de análise, não faz sentido nenhum não vender apenas para não realizar um prejuízo.
Um prejuízo no papel é a mesma coisa que um prejuízo realizado, a decisão de não vender é exatamente a mesma decisão de comprar a ação no preço atual. Realizar o prejuízo, acumular o benefício fiscal e investir em uma ação que você confia mais e que tem mais potencial de valorização é a melhor decisão nessas situações.
Então, entenda de uma vez por todas que vender no prejuízo não é algo ruim, já vender na hora errada ou pelos motivos errados pode prejudicar os seus retornos no longo prazo.
Isso não quer dizer que se você comprou uma ação e ela caiu você deve vendê-la, afinal, no curto prazo os movimentos de preço das ações são aleatórios e apresentam pouca correlação com a realidade das empresas.
Logo, a variável mais importante de todas é a sua confiança na empresa, e o que você realmente precisa acompanhar são os eventos com potencial de aumentar/reduzir os futuros da empresa investida.
Se a ação caiu e os fundamentos não mudaram, não faça nada. Se a ação caiu e os fundamentos melhoraram, considere até aumentar sua posição.
No fim das contas, somos todos seres humanos e estamos sujeitos a vieses comportamentais e à influência negativa de nossas emoções em nossos investimentos, mas saber lidar com isso é um dos fatores que diferencia os grandes investidores dos investidores medíocres. Qual deles você quer ser?
Um abraço