Foi uma quarta-feira em quem as atenções se voltaram para o que seria dito pelo médico Nelson Teich, na CPI da Covid-19, e sobre o que seria sinalizado na decisão do Copom.
Na CPI poucas novidades, a não ser pelo fato de Teich ter dito o que todos já sabiam. Ele saiu do ministério por divergir do presidente Bolsonaro, que queria “forçar uma barra” sobre o uso da cloroquina. Negacionismos, delírios de um presidente muito mal orientado ou “sem a dimensão” do cargo que exerce (como queiram). Inevitável dizer isso. A cloroquina, a invermetcina, são remédios para malária, contraindicados para o tratamento do vírus, inócuos na sua cura ou mesmo “perigosos”, dado o risco hepático. Isso já parece demonstrando pela OMS e as várias autoridades médicas pelo mundo. Um ou outro achar o contrário não representam a totalidade.
O que se tem de protocolo hoje sobre este vírus, enquanto a vacina não é suficiente, é o isolamento social. Fim de papo. Não tem outra saída. É uso de máscaras, isolamento social, higiene pessoal. E, claro, a urgência da vacinação. Foi isso que Portugal fez com vários planos de emergência, confinamentos, e hoje as mortes gravitam em zero a cinco por dia. Há dias em que não acontecem novos casos. E isso não significa que se deva relaxar. Todo cuidado é pouco para se evitar mais uma onda.
Outro erro do presidente no ano passado, dentre tantos, foi se sentir “incomodado” com o governador Dória, por ele ter partido na frente nas campanhas de vacinação com a Coronavac. A partir daí, o presidente passou a negar a vacina chinesa e se apoiar nestes “remédios” citados acima. Mais uma sucessão de decisões desastrosas. Tivemos a total “politização da vacina e da pandemia”. Diante disso, será inevitável pagar por isso. E a CPI está aí para isso.
Mas voltemos à decisão do Copom. Era meio que dada. Todos sabiam o que o BACEN iria decidir nesta reunião, pelo ajuste de 0,75 ponto percentual da taxa Selic, a 3,5% anuais. De novidade, foi o Banco Central manter a sinalização de que a “normalização parcial” deve se manter, com mais um ajuste de 0,75 ponto percentual na próxima reunião do Copom em junho.
No aguardado comunicado disse que o “comitê antevê a continuação do processo de normalização parcial do estímulo monetário com outro ajuste da mesma magnitude”. Sendo assim, não teremos um “freio de arrumação”, depois da reunião de ontem, mas sim a continuidade do processo de “normalização parcial”.
Objetivo da autoridade monetária é trazer a inflação para o centro da meta do ano que vem, mais próxima a 3,5%. A pesquisa Focus, por exemplo, trabalha com o IPCA a 3,6%, depois de 5,1% para este ano. Sobre este repique, temos as commodities esticadas pela retomada global, mas também o alinhamento tarifário de energia elétrica, na “zona vermelha”, devendo resultar num impacto de 0,2 ponto para o índice do IBGE. Ou seja, o IPCA deve fechar este ano mais próximo de 5,3%, rompendo então o teto da meta, de 5,25%.
Disse o Copom que “a recuperação da economia deve ser mais lenta do que o esperado”. Me parece que se considera aqui o atraso da vacinação como fator preponderante. Embora considere a retomada mais “robusta” do que o esperado, acha também que a segunda onda da pandemia é maior que o antecipado. Observa-se que a autoridade monetária não faz juízo de valor sobre as causas, mas considera que o processo de retomada da economia deve se normalizar, embora haja alguma incerteza sobre a sua intensidade.
Falando do cenário externo, comenta sobre o avanço dos “programas de imunização“, ajudando na recuperação global, ainda mais diante da elevada ociosidade, o que deve permitir que os estímulos monetários se mantenham por uma “longa duração”. Não há esta certeza, e isso se reflete nos treasuries de 10 anos, próximos de 1,6%, mas podendo “imbicar para cima”.
No mercado de commodities, a expectativa é de que devem se manter em elevação, com exceção do petróleo, o que deve impactar nos preços dos bens industriais e alimentos. Há, portanto, riscos inflacionários no horizonte, temporários que sejam, embora o presidente do Fed, Jerome Powell, tenha jogado estes para 2022 a 2024.
No Brasil, a leitura também é de que este repique inflacionário é “temporário”, e a estratégia do Copom deve visar 2022, ano de eleição em que a política de juros será ainda mais agressiva, dadas as incertezas sobre a trajetória da inflação no ano que vem. A Focus trabalha com a Selic de 5,5% neste ano, avançando a 6,4% no ano que vem. O objetivo do Bacen deverá ser voltar a “ancorar as expectativas”, ir atrás da curva de juro, já que antes estava um pouco atrás, devido ao juro real negativo.
Pela Focus, as expectativas de inflação para 2021, 2022 e 2023 são de 5,0%, 3,6% e 3,25%, respectivamente, em muito, pela ação preventiva do BACEN.
Já pelo cenário básico do Copom, com taxa de câmbio de R$5,40/US$, pela paridade do poder de compra (PPC), a inflação prevista é de 5,1% para 2021 e 3,4% para 2022. Segundo o Copom, esse cenário pressupõe juro elevado a 5,50% a.a. neste ano e 6,25% a.a. em 2022. Nesse cenário, as projeções para a inflação de preços administrados são de 8,4% para 2021 e 5,0% para 2022.
Ainda segundo o Copom, o seu cenário básico para a inflação permanece cercado de fatores de risco para ambas as direções.
“Por um lado, o processo de recuperação econômica dos efeitos da pandemia pode ser mais lento do que o estimado, produzindo trajetória de inflação abaixo do esperado. Por outro, novos prolongamentos das políticas fiscais de resposta à pandemia que piorem a trajetória fiscal do país, ou frustrações em relação à continuidade das reformas, podem pressionar ainda mais os prêmios de risco do país.”
Ou seja, os diretores do BACEN têm consciência de que o cenário de pandemia é de “açodamento político”, com o ministro Guedes pressionado, o que tende a tornar o cenário fiscal cheio de incertezas. Segundo o Copom, “o risco fiscal elevado segue criando uma assimetria altista no balanço de riscos, ou seja, nas trajetórias para a inflação acima do projetado no horizonte relevante para a política monetária”.
Enfim. O Copom considera o processo de reformas e de ajustes necessários na economia brasileira essencial para permitir a recuperação sustentável. Acha também, “que questionamentos sobre a continuidade das reformas e alterações de caráter permanente no processo de ajuste das contas públicas podem elevar a taxa de juros estrutural da economia”.
Nesta quinta-feira os mercados devem precificar a decisão do Copom de ontem e atenção para os dados de pedido de seguro desemprego nos EUA, para que tenhamos uma melhor noção de como está o mercado de trabalho por lá. A oferta de empregos do setor privado, pela ADP, acabou um pouco aquém do esperado, 800 mil. Aguardemos agora o payroll nesta sexta-feira.
Bons negócios a todos!