Dados de atividade no exterior e de inflação no Brasil deslocam o foco do mercado financeiro, que até então estava concentrado nos bancos centrais. Mas após o BC local e dos Estados Unidos reforçarem a mensagem da semana passada, de que novas ações são necessárias - não necessariamente de política monetária - o ambiente para os ativos de risco tende a ficar mais volátil, em meios às incertezas com a recuperação econômica.
Os investidores ainda tentam encontrar uma dinâmica para os mercados globais, mas já deram a entender que o fôlego para ampliar o rali dos últimos meses está mais curto, sendo necessárias doses adicionais de estímulos (monetários e fiscais) para manter o pique recente. Por ora, a caça por pechinchas sustenta as bolsas em alta, mas a postura nos negócios tende a ser mais defensiva do que ofensiva.
Tanto que também se observa uma busca por proteção, o que mantém os ganhos do dólar em relação às moedas rivais, enfraquecendo as commodities. O petróleo e o ouro recuam, sendo que o metal precioso testa a faixa de US$ 1,9 mil por onça-troy. O sinal positivo prevalece nos índices futuros das bolsas de Nova York, após uma sessão sem brilho na Ásia, embalando ganhos de mais de 1% entre as principais praças europeias.
As bolsas da região digerem a perda de tração dos setores industrial e de serviços na zona do euro neste mês, após a leitura preliminar do índice composto dos gerentes de compras (PMI) cair ao menor nível em três meses, a 50,1, de 51,9 no dado final de agosto, ficando, portanto, no limiar da linha que divide a atividade entre expansão e contração. O resultado foi puxado pelo setor de serviços, que caiu à mínima em quatro meses, a 47,6.
Já a indústria registrou a maior expansão desde fevereiro de 2018. Fica evidente, então, que a recuperação econômica na região da moeda única se dá em duas velocidades, com as fábricas relatando crescimento da produção diante do aumento da demanda, notadamente externa, enquanto as preocupações quanto ao aumento das infecções por covid-19 em vários países do bloco ainda afetam o consumo e a circulação das pessoas.
A letra é...
Esse caminho desigual de retomada que vem sendo percebido desde a virada do semestre fortalece a previsão de que a recuperação econômica global pós-coronavírus será em “K” - ou seja, um rápido declínio da atividade, seguido de uma divisão acentuada entre os setores (e países) vencedores e perdedores. Isso explica, por exemplo, os ganhos firmes das techs, enquanto as aéreas ainda sofrem, abrindo caminho para um “novo normal”.
Não seria nem uma recuperação em “V”, com uma queda rápida da atividade seguida de uma melhora igualmente veloz; nem “U”, com uma retomada mais lenta; e muito menos um “L”, que aponta para recuperação alguma, caminhando para um “D”, de depressão. Mas o movimento em “K” cria uma nova dinâmica no mercado de trabalho, prolongando a necessidade de ajuda fiscal aos desempregados e pequenos negócios.
E é por isso que o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, tem insistindo no necessidade de um novo pacote trilionário de estímulo por parte do governo, fazendo com que o dinheiro chegue nas mãos das pessoas e empresas que precisam, pois as perdas de empregos estão durando bem mais que o esperado. Mas o impasse entre republicanos e democratas persiste, a seis semanas das eleições presidenciais nos EUA.
Aqui no Brasil, a fragilidade fiscal impede uma extensão do auxílio emergencial aos mais afetados pela pandemia, sob o risco de “furar” o “teto dos gastos”. A questão é que se tais estímulos forem interrompidos, a recuperação da economia também tende a perder tração no ano que vem, como salientou o BC na ata da reunião deste mês, com os mais pobres (e desempregados) ficando sem renda para consumir - mitigando a pressão nos preços, sobretudo dos alimentos.
Dia de agenda cheia
A agenda econômica do dia está carregada de indicadores e eventos relevantes. Nos EUA, as atenções se dividem entre a leitura preliminar do índice PMI sobre a atividade nos setores industrial e de serviços em setembro, às 10h45, e a nova participação do presidente do Fed no Congresso norte-americano, a partir das 11h.
Será o segundo de três depoimentos de Powell programados nesta semana, com o tema central novamente sendo a crise do coronavírus. No mesmo horário em que tem início a fala dele, saem a vendas de imóveis residenciais usados em setembro. Na sequência, às 11h30, é a vez dos estoques semanais de petróleo bruto e derivados nos país.
Já no Brasil, o calendário começa cedo, às 8h, quando sai o índice de confiança do consumidor neste mês. Mas o destaque fica com a prévia de setembro da inflação oficial ao consumidor brasileiro (IPCA-15). A previsão é de aceleração da alta mensal, para +0,4%, no maior resultado para o mês em mais de cinco anos.
Com isso, a taxa dos últimos 12 meses até setembro deve superar a marca de 2,50%, indo a 2,6%, interrompendo, assim, quatro meses seguidos em que o resultado acumulado ficava abaixo do piso do intervalo de tolerância perseguido pelo BC para este ano. Os números efetivos serão conhecidos às 9h.
Depois, a agenda doméstica traz ainda dados do BC sobre as transações externas (9h30) no mês passado e sobre a entrada e saída de dólares (fluxo cambial) do país até a última sexta-feira (14h30).