Se há uma coisa natural em mercados financeiros é que uma sequência de retornos negativos e desvalorização fazem muitos abandonarem o mercado. Isso é esperado e é sabido que nem todos investidores possuem baixa aversão ao desapontamento. Entretanto, em mercados recentes, especulativos e baseados em premissas difíceis de compreender sem algum estudo, como o de criptomoedas, esse fenômeno é frequentemente seguido da afirmação “essa bolha morreu”. Será que morreu mesmo?
Eu poderia falar coisas óbvias aqui sobre dinâmica de preços e crescimento do segmento, mas isso seria esconder que, de fato, criptomoedas são ativos extremamente voláteis, de caudas largas e que são sujeitos a sequências ferozes de retornos negativos. Contudo, mesmo assumindo isso há aspectos latentes positivos que podem favorecer o mercado. O mais evidente é olhar as maiores criptomoedas no site coinmarketcap: dentre as top 5, há duas grandes que usam uma tecnologia que não é a blockchain. Por que isso seria positivo? Em apenas dez anos, houve uma explosão tecnológica em decentralização e isso não se limita a blockchains. Consenso clássico, DAGs e outras estruturas emergiram e são testadas em diversas aplicações.
Ao passo que os ledgers públicos ainda penam para desenvolver aplicação de amplo alcance, as aplicações privadas – apesar de extremamente superestimadas por alguns segmentos – continuam úteis. Vale notar que as criptomoedas mais simples – Ripple e Stellar e seus sistemas já apresentam forte possibilidade de uso em mercados tradicionais como os bancários. Essas plataformas são, de certa maneira, independentes de seus tokens (esse link explica a distinção entre XRP e Ripple), mas há interesse das empresas que operam os tokens de eles terem sucesso, por reduzirem a necessidade de confiança na rede e fornecerem um numerário que elas podem controlar.
Além dessas aplicações iniciais, há também novas tecnologias sendo desenvolvidas que possuem algumas potencialidades. Não é possível pensar que “a blockchain surgiu faz dez anos e ficou parada”, como muitas afirmações fazem parecer. Ainda há o desenvolvimento de fronteiras e usos. O fork do Bitcoin ABC, aparentemente relacionado a essa última crise, teve como consequência a confirmação que o Bitcoin Cash seguirá o rumo da interoperabilidade. Isso possibilita, por exemplo, o lançamento de futuros e ativos similares mais facilmente que numa rede como a Ethereum e que, aparentemente, há alguma solução para escalabilidade via aumento do tamanho blocos e outros planos.
A segurança dessas redes em última instância depende dos preços – ao menos no caso das blockchains – e isso pode gerar alguma preocupação. Entretanto, numa rede baseada em Proof-of-Work, há certo tempo de ajuste para os choques de preços atingirem a mineração. Numa rede Proof-of-Stake a crise poderia ser, imagino, ainda pior. A estrutura tecnológica, apesar de relacionada à volatilidade de acordo com alguns autores, não é pouco robusta a choques. Nesse aspecto, as preocupações são referentes a preços demasiadamente baixos, algo que ainda não estamos observando ao menos no Bitcoin.
Em suma, não há como falar que essas quedas representam a morte do Bitcoin ou das criptomoedas. Elas fazem parte de um processo natural e que tem nos legado inovações tecnológicas importantes. Evidentemente, quedas inesperadas e, em certa medida, inexplicáveis nos preços não são desejáveis, porém é sempre necessário lembrar que é um mercado altamente especulativo. As chances de dar errado são não desprezíveis, porém com paciência disciplina para estudar os projetos mais interessantes pode levar a retornos expressivos de médio e longo prazo.