Este artigo foi escrito exclusivamente para o Investing.com
- Embate entre a velha e a nova escola de investimentos
- Warren Buffet e seu sócio não escondem o que pensam sobre as criptomoedas
- Peter Thiel, empreendedor da nova escola, tem opinião diferente
- Thiel dispara contra Buffett
- Confronto entre Thiel e Buffett reflete o debate sobre a evolução da revolução da tecnologia financeira.
Em 2010, quando um colega me falou pela primeira vez sobre o Bitcoin, minha reação inicial foi achar que era uma espécie de videogame parecido com Pacman, Asteroids e Pong que eu costumava jogar na faculdade. Eu pensava que as criptomoedas, com sua tecnologia blockchain, eram como aqueles parques de diversões e jogos de fliperama, em que você ganhava fichas ou ingressos para continuar tentando resgatar recompensas inúteis, como brinquedos ou bichinhos de pelúcia.
Outros compromissos que julgava mais importantes à época impediram-me de investir no Bitcoin e me aprofundar na tecnologia blockchain, que são os blocos de construção inovadores de uma revolução tecnológica nas finanças. Sempre depositei mais fé no ouro e na prata do que nas moedas fiduciárias, e inicialmente não fiz a devida conexão dessa posição com as criptos.
Quando finalmente abri os olhos para as moedas digitais, o Bitcoin já havia saído de US$1 para mais de US$100 por token. Eu considerei, de forma totalmente equivocada, que já era tarde demais para entrar no mercado. De lá para cá, a blockchain está mudando o mundo das finanças, e o Bitcoin abriu espaço para o nascimento de mais de 18.750 criptos.
O incrível rali do Bitcoin até quase US$70.000 em novembro de 2021 alimentou um frenesi especulativo por toda a classe de ativos, fazendo-a se tornar o mercado mais volátil que já conheci.
Apesar de os ativos serem extremamente arriscados, sua utilidade permanece bastante atraente.
Muitos acreditam que o mundo financeiro irá se beneficiar dessa inovação tecnológica, gerando opiniões divergentes, em que alguns investidores proeminentes abraçam as criptomoedas, ao passo que outros expressam sua oposição de modo veemente.
No início de abril, em uma conferência sobre criptomoedas em Miami, Flórida, os dois campos colidiram, com um renomado apoiador colocando na mira um opositor igualmente reconhecido.
Embate entre a velha e a nova escola de investimentos
Benjamin Graham, pai do investimento em valor, em 1934, foi coautor do livro Securities Analysis, que se tornou leitura obrigatória para analistas do mercado financeiro e gestores de portfólio. Em 1949, Graham publicou The Intelligent Investor, que foi revisado para cada nova geração de investidores até três anos antes do seu falecimento, em 1976. Os livros são considerados os textos fundadores do clássico investimento em valor.
No capítulo quatro do segundo livro, Graham escreveu:
“Sugerimos, como regra fundamental, que o investidor nunca deva ter menos de 25% ou mais de 75% dos seus recursos em ações ordinárias, com a correspondente faixa inversa entre 75% e 25% em títulos.”
Alguns dos investidores de maior sucesso ainda consideram Graham como professor e se inspiram em seus princípios.
Mas a nova escola de investimentos – seguida por empreendedores iconoclastas endinheirados, como Elon Musk, Jeff Bezos, Jack Dorsey e Mark Zuckerberg, que fizeram fortuna através das mais recentes inovações tecnológicas –, passaram a ter voz ativa em favor da nova tecnologia. É uma filosofia que geralmente abraça o pensamento não convencional, assim como diferentes perspectivas para construção de portfólio e alocação de ativos.
Warren Buffett e seu sócio não escondem sua opinião sobre as criptomoedas
Quando se fala na “velha guarda” de investidores, logo são aventados os nomes de Warren Buffett, CEO da Berkshire Hathaway (SA:BERK34) (NYSE:BRKa), e do seu sócio e vice-presidente da companhia, Charlie Munger. Buffett e Munger também são sinônimos de investimento em valor. Não é de surpreender que seu mentor tenha sido Benjamin Graham.
Evidentemente, Graham faleceu muito tempo antes da explosão das criptomoedas. Embora ele não tenha vivido para ver esse novo meio de troca, Munger e Buffett testemunharam sua ascensão, e ambos têm opiniões bastante fortes a respeito da classe de ativos.
O que esses investidores da velha guarda afirmam é que as criptomoedas, ao contrário de moedas fiduciárias, como o dólar, a libra e o euro, que são respaldadas por governos nacionais, derivam seu valor unicamente das negociações de mercado. As ofertas de compra e venda estabelecem os valores sem qualquer intervenção governamental. Ao mesmo tempo, os governos geralmente compram e vendem moedas fiduciárias para dar estabilidade ao mercado de câmbio oficial.
Dessa forma, Buffett uma vez chamou as criptomoedas de “veneno de rato ao quadrado". Munger foi ainda mais longe. Ele afirmou que as moedas digitais são uma “doença venérea”, “repugnantes e contrárias aos interesses da civilização”.
Outros investidores de valor acreditam que as criptos sejam uma moda passageira, não muito distinta da euforia com as tulipas que ocorreu na Holanda durante os anos de 1600.
Peter Thiel, empreendedor da nova escola, pensa diferente
Peter Thiel é um empreendedor bilionário, capitalista de risco e ativista político. Como um dos fundadores da plataforma de pagamento PayPal (SA:PYPL34)(NASDAQ:PYPL) e da empresa de tecnologia de infraestrutura de software Palantir Technologies (NYSE:PLTR), ele acabou acumulando grande fortuna, empregada em sua empresa de capital de risco Founders Fund, que teria lhe rendido centenas de milhões de dólares em Bitcoin.
Thiel também foi o primeiro investidor externo do Facebook, agora chamado Meta Platforms (SA:FBOK34) (NASDAQ:FB). Não há dúvidas de que ele é um proeminente investidor da nova escola que fez bilhões durante a revolução tecnológica.
Politicamente, Thiel é um libertário. Dessa forma, a ideologia das criptomoedas reflete sua política. As criptos rejeitam o poder governamental sobre a oferta monetária e o devolvem aos indivíduos.
Em outubro de 2021, ele afirmou que poderia estar pouco investido em Bitcoin, quando seu preço superou a marca de US$60.000.
Thiel dispara contra Buffett
Em 8 de abril, na conferência sobre Bitcoin mencionada anteriormente, Thiel fez uma apresentação em que teceu críticas aos formadores de opinião financeiros, acusando-os de tentar parar as criptomoedas.
Ele chamou Buffett de “vovô sociopata de Omaha”. Ele também colocou na mira Jamie Dimon, CEO do banco de investimento global JPMorgan Chase (NYSE:JPM), e Larry Fink, CEO da BlackRock (SA:BLAK34)(NYSE:BLK), além de outros críticos das criptomoedas. No entanto, ele chamou Buffett de "Inimigo nº 1" do Bitcoin.
Thiel se posicionou como o porta-voz da nova escola de investimento, rotulando Buffett, Diamond, Fink e outros críticos das criptomoedas de garotos-propaganda da velha e, segundo ele, ultrapassada escola de investimentos, referindo-se a eles como a “gerontocracia”.
Confronto entre Thiel e Buffett reflete o debate sobre a evolução da revolução da tecnologia financeira.
Esse debate sobre o valor das criptomoedas sem dúvida continuará, pois ilustra perfeitamente a filosofia de investimento da velha escola contra a nova escola de finanças e economia, representando o capitalismo tradicional contra o libertarianismo.
Assim como Peter Thiel, Elon Musk, pessoa mais rica do mundo, é um entusiasta das criptos. Talvez não por coincidência, Thiel e Musk eram sócios e cofundadores do PayPal, a empresa de pagamentos que criou uma alternativa eletrônica aos métodos tradicionais de pagamento em papel.
Em 2020, bem antes do discurso público de Thiel contra Buffett, Musk disse: “Deveríamos ter menos pessoas fazendo Direito e menos pessoas fazendo finanças e mais pessoas empreendendo”, em referência a Buffett.
Ainda assim, vale a pena notar que o valor de mercado de todas as criptomoedas, em 19 de abril, estava no nível de US$ 1,931 trilhão, com Bitcoin e o Ethereum respondendo por mais de 60% desse montante. Essa capitalização de mercado não representa qualquer risco sistêmico às ações, tipo de investimento favorito de Buffett e outros. A Apple (SA:AAPL34)(NASDAQ:AAPL), empresa mais valiosa do mundo, tem uma capitalização de mercado de cerca de US$2,7 trilhões ao preço de US$167.23 por ação no fechamento de quarta-feira.
Ainda assim, as criptos possuem uma base rica e influente de apoiadores e detratores. À medida que cresce a capitalização do criptomercado, mais acirrado tende a se tornar esse desacordo. Apesar de toda a euforia especulativa que os ralis nas criptomoedas possam desencadear, a utilidade das moedas digitais e seu desafio às finanças tradicionais e ao controle governamental da oferta monetária estão no centro do debate político, ideológico e econômico refletido no embate entre a nova e a velha escola de investimentos.