No último sábado (13), foi encerrada a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2021 (COP26), que aconteceu em Glasgow, na Escócia. Dentre vários avanços atingidos no compromisso global para redução de emissões de carbono, dois se destacam ao olhar do investidor.
O primeiro se refere a um compromisso para uniformizar o reporte de métricas ESG. O segundo, à definição de regras importantes para o mercado de créditos de carbono, abrindo caminho para esse promissor comércio internacional.
A falta de uniformização dos dados ESG reportados pelas empresas deixa o analista à mercê da boa vontade das companhias para mostrar o que têm feito nessa agenda. O que, por sua vez, gera um quase inevitável viés: dentro de um mesmo setor, as empresas com maior transparência levam vantagem na análise, enquanto as que têm boas práticas, mas não as reportam rodam abaixo do radar dos investidores ESG.
Durante a conferência, a International Financial Reporting Standards Foundation (IFRS), que determina os padrões globais de reporte financeiro para as companhias listadas, anunciou que vai consolidar os padrões de informações ESG. Para tanto, vai absorver outras três organizações que cuidavam desse padrão específico, mas, até então, de forma independente: o Sustainability Accounting Standards Board (SASB), o International Integrated Reporting Council (IIRC) e o Climate Disclosure Standards Board (CDSB).
Essas organizações independentes faziam um trabalho caro ao investidor, que tinha nos padrões do SASB, especialmente, uma boa referência para checar a relevância das informações prestadas para cada setor. Contudo, o reporte era, ainda, opcional. Agora, com a absorção do SASB pelo IFRS, temos a esperança de não só uniformizar o padrão para todas as empresas listadas do mundo, mas, também, de tornar esse padrão obrigatório.
Isso seria uma grande vitória para os investidores que exercem o seu papel de direcionar cada vez mais capital para empresas que fazem a sua parte na preservação do clima propício às várias atividades essenciais à vida humana – a agricultura entre elas. Isso porque a elevação da temperatura global em mais de 2 °C pode transformar áreas férteis em desertos, o que é especialmente danoso para países com uma matriz econômica dependente da agricultura. Te lembra algum país tropical?
Esse avanço é muito útil, também, para olhar as métricas ESG como indicadores da sustentabilidade dos negócios como um todo, incorporando as facetas social e de governança. Para os investidores, a comparabilidade nesses quesitos é cada dia mais essencial para a escolha de negócios perenes, inclusive financeiramente.
Com a integração dos padrões, ainda, fica mais difícil para as empresas fazerem o “greenwashing”, que tenta sobrepor o discurso ESG às práticas em si. Isso vai desde um discurso bonito sobre atividades filantrópicas por parte das empresas que podem bancá-las até a pompa feita sobre avanços que são imateriais para o impacto que aquele setor exerce na sociedade em todo o espectro ESG.
O IFRS deu até junho do ano que vem para concluir a absorção das entidades mencionadas. Acompanharemos de perto.
O outro avanço da COP26 foi a definição de regras para implementar o Artigo 6 do Acordo de Paris, que trata da regulamentação global do mercado de créditos de carbono. Esse mercado permite que países com dificuldade em reduzir suas emissões de carbono comprem créditos daqueles que são mais sequestradores do que emissores – caso do Brasil, por exemplo.
As definições criam dois mercados para o comércio dos créditos: um entre empresas de todo o globo e outro centralizado entre países. No mercado centralizado, foi definida uma espécie de taxação — que era anteriormente um ponto de discordância —, em que 5% do valor arrecadado com os créditos será direcionado para financiar a transição para uma economia limpa nos países em desenvolvimento. Além disso, 2% dos créditos gerados serão cancelados, como forma de estimular a transição real para o baixo carbono.
Mais um avanço importante nessa frente foi sobre um outro ponto de discordância até então: se os créditos poderiam permanecer na contagem de redução de emissões tanto por parte do país vendedor quanto do comprador do crédito. A proposta do Japão, que foi aceita e teve o apoio do Brasil e dos Estados Unidos, determina que a dupla contagem não é permitida. Ao sequestrar o carbono, o país define se venderá o crédito, deduzindo da sua meta de redução, ou se manterá o crédito para contagem da sua redução de emissões.
Essa definição gera mais confiabilidade para o crédito de carbono, que se torna, no final do dia, um ativo que deve ser cada vez mais negociado globalmente. Com regras mais racionais, esse mercado ganha mais potencial. Para o Brasil, com sua abundante área de Floresta Amazônica, isso é especialmente benéfico.
Durante a COP26, a pauta principal, de compromisso para redução das emissões, também teve seus avanços. Destaco, aqui, o texto final que, pela primeira vez, inclui explicitamente o compromisso de todos os 200 signatários para “reduzir as emissões provenientes do uso de combustíveis fósseis”. A menção aos fósseis nunca havia ocorrido explicitamente em nenhum acordo climático. A título de curiosidade, a Índia, cuja matriz depende em boa parte do carvão, pediu para mudar o texto inicial de “eliminar” para “reduzir”.
Os Estados Unidos e a China, por sua vez, assumiram um acordo bilateral de não importar produtos que contribuam para o desmatamento e alcançar 100% de eletricidade livre de carbono até 2035. Aqui, ganham vantagem as empresas e países que atuam na preservação de florestas – tema sensível a países fortes em agricultura, como o Brasil – e aqueles cujos produtos contribuem para tecnologias de geração de energia limpa. Pensando nas pás necessárias para a construção de parques eólicos, por exemplo, a indústria de aço ganha contornos promissores.
Ao longo dos 15 dias de negociação, estiveram presentes, pela primeira vez, atores-chave da iniciativa privada, como CEOs de empresas e alguns dos maiores investidores do mundo. Os resultados são visíveis.
Um abraço