Por Samuel Barros e Carlos Augusto Jenier*
O Sistema Financeiro Nacional (SFN) do Brasil é composto por uma rede complexa de instituições, agentes financeiros e estruturas normativas e regulatórias, incluindo bancos, cooperativas de crédito, seguradoras, corretoras de valores, além de órgãos como o Conselho Monetário Nacional (CMN), o Banco Central do Brasil (BCB), a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) e outros. O SFN tem o objetivo de assegurar a estabilidade financeira, promover o desenvolvimento econômico e proteger os interesses dos consumidores, mantendo a discussão em torno da concentração bancária, seguramente, como um dos seus temas centrais de debate, devido a suas implicações para a competitividade no mercado nacional e a garantia da mais ampla inclusão financeira da população brasileira.
É observado que o Brasil possui um dos mercados bancários mais concentrados do mundo. Diversos estudos recentes mostram que, apesar de sua diversidade social e de sua grandeza continental, cinco grandes bancos (Banco do Brasil (BVMF:BBAS3), Caixa, Itaú (BVMF:ITUB4), Santander (BVMF:SANB11) e Bradesco (BVMF:BBDC4)) concentram mais de 80% dos ativos do setor bancário comercial, segundo estudo da Conjur de 2021, centralizando o destino dos recursos por meio de depósitos e operacionalizando a grande fatia de negociações e empréstimos financeiros. Esta concentração, na essência, representa potencial limitação da competitividade no mercado financeiro, acarretando o risco de aumento de custos para os consumidores e a redução do interesse em inovações no setor financeiro.
Os desafios decorrentes dessa concentração são amplamente reconhecidos. A limitação na oferta de crédito, na elevação das taxas de juros e na limitação do acesso aos típicos serviços bancários são alguns dos problemas enfrentados, criando riscos sistêmicos, sobretudo a partir da verificação de que uma eventual falência de uma grande instituição possa impactar todo o sistema financeiro nacional.
No cenário mundial, a concentração bancária também é um fenômeno comum e sempre também preocupante, especialmente nas chamadas economias desenvolvidas. No entanto, muitos países têm implementado políticas para aumentar a competição e reduzir os riscos associados à concentração. A regulação prudencial, a promoção de novas tecnologias financeiras e iniciativas de transparência do mercado financeiro, sobretudo a partir do Open Banking, são algumas das estratégias adotadas para mitigar esse tipo de problema.
O mercado bancário brasileiro tem passado por uma verdadeira transformação a partir da entrada das fintechs (abreviação de "Financial Technology"). Essas empresas, que utilizam tecnologias avançadas para oferecer serviços financeiros mais acessíveis à população, estão desafiando a hegemonia dos grandes bancos, promovendo maior inclusão financeira, oferecendo serviços a populações tradicionalmente negligenciadas pelo sistema bancário tradicional e impondo a necessidade de reavaliação dos modelos tradicionais, tendo em vista a acelerada migração dos interesses dos consumidores em geral, impondo uma ampla rediscussão do formato de atuação daquelas grandes instituições.
A implementação do Open Banking no Brasil é um passo importante para promover a competitividade. Esta iniciativa permite que clientes compartilhem seus dados bancários com diferentes instituições financeiras, facilitando a comparação de produtos e serviços e incentivando a inovação. A competição entre as grandes Instituições Financeiras e a presença das fintechs nesse mercado podem acarretar a produção de soluções personalizadas e muito mais competitivas, especialmente diante da necessidade de atuação positiva na conquista dos interesses dos clientes/usuários.
A concentração bancária sempre foi um desafio no cenário brasileiro. Enquanto oferece vantagens de escala e estabilidade, também impõe barreiras à competição e à inclusão financeira. A evolução de plataformas digitais e novas formas de negociação pela internet, principalmente a partir das fintechs e do Open Banking, apresenta oportunidades para mitigar esses desafios. No entanto, é essencial que a regulamentação acompanhe essas inovações para garantir um mercado financeiro justo e eficiente, garantindo a busca por um equilíbrio entre estabilidade e competitividade, o que será crucial para o desenvolvimento de todo o sistema.
Assim, a partir desse cenário, entendemos que a concentração bancária no Brasil traz ameaças relevantes, mas também oportunidades excelentes, tanto para os agentes financeiros quanto também para os consumidores em geral. Se, por um lado, a concentração pode resultar em um sistema mais robusto e capaz de suportar choques econômicos, por outro lado, pode restringir o acesso ao crédito e limitar a inovação. A pulverização, por outra via, amplia o risco de sustentabilidade, mas possibilita uma maior competitividade entre os seus participantes, de forma a oferecer condições mais favoráveis aos consumidores, impondo aos gigantes do mercado financeiro a necessidade de investimento em inovação, essencial para a sobrevivência no mercado atual.
Nesse sentido, a chave para aproveitar as oportunidades e mitigar os riscos decorrentes dessa inegável mudança reside na criação de políticas regulatórias eficazes e na promoção de um ambiente francamente competitivo, que possibilite o surgimento e o crescimento de novas empresas financeiras, garantindo a sustentabilidade de um sistema financeiro mais inclusivo, inovador, justo e resiliente.
*Carlos Augusto Jenier, Superintendente Nacional de Atendimento Jurídico da Caixa Econômica Federal. Mestrando em Administração pela Université de Bordeaux. Mestre em Direitos e Garantias Individuais. Escreve sobre direito, com foco em Mercado Financeiro e Atuação Bancária e Empresarial.