Recentemente, assistimos um debate acalorado sobre os juros praticados no Brasil sobre a meta de inflação e finalmente a independência do Banco Central. O calor desse debate tem alguns aspectos curiosos. Primeiro, a literatura econômica tem documentado de maneira bastante ampla a necessidade de um Banco Central Independente do ciclo político. Ou seja, a ideia fundamental é transformar o Banco Central em uma instituição de estado, uma vez que o combate da inflação é um bem social que está além dos interesses de curto prazo dos governantes. Logo, não é nenhuma surpresa que o principal crítico do Banco Central seja exatamente o presidente do Brasil, que tem seu poder reduzido com a independência. O incômodo do presidente é um sinal claro de tentativa de intervenção e deveria ser visto pelos economistas como um sinal de que o Banco central independente foi uma medida acertada e fim de papo.
O curioso que o debate não parou, mas ao contrário, avançou muito, atingindo outros temas como o nível de juros e a meta de inflação. Neste aspecto, outro ponto curioso sobre a meta de inflação merece destaque. O sistema de metas de inflação tem mais de vinte anos e a meta sempre foi definida pelo Conselho Monetário Nacional, que tem ampla participação do governo atual. Logo, o governo define a meta e o BCB independente persegue a meta, simples né? Parece que não, dado o debate que foi observado. Um debate que não respeitou a racionalidade, uma vez que estes temas já estão pacificados no mundo todo. E o mais curioso é, como o presidente, com argumentos aleatórios e que não tem amparo em especialistas, conseguiu tamanha mobilização? Quero discutir nessa coluna como esse assunto entrou na nossa sociedade e mobilizou as melhores cabeças do país por pelo menos um mês.
Comecemos por um dos grandes desafios contemporâneos, o ruido informacional. Como tentei explicar nos meus últimos artigos, vivemos um momento de superinformação, no qual há grande dificuldade de perceber quando uma informação é válida ou não.
Na Idade Média, a situação era oposta. Não existiam informações e, quando o Rei queria se comunicar, enviava seus mensageiros. É fácil imaginar a dificuldade em aceitar que este ou aquele mensageiro era o verdadeiro mensageiro do Rei. Para provar a autenticidade da mensagem, os mensageiros levavam cartas com um selo real e outras coisas. Porém, o mensageiro deveria ter principalmente uma boa reputação para que sua mensagem fosse rapidamente considerada. Ou seja, existia desde a Idade Média um tipo de efeito informacional chamado efeito mensageiro.
O conceito de "efeito mensageiro" foi desenvolvido pelo historiador francês Lucien Febvre (1878-1956). Febvre argumentou que a credibilidade de uma mensagem na Idade Média dependia não apenas do seu conteúdo, mas também do mensageiro que a transmitia. Ele afirmava que, na ausência de um sistema de comunicação confiável, as pessoas tendiam a confiar mais em mensageiros que consideravam confiáveis e dignos de crédito.
Segundo Febvre, o "efeito mensageiro" se tornou cada vez mais importante à medida que a comunicação se tornou mais complexa e as informações se espalharam por grandes distâncias. A confiança no mensageiro era crucial para garantir que a mensagem fosse transmitida com precisão e que a informação fosse recebida de forma confiável.
Quando um presidente de um país ou mesmo o presidente de uma empresa traz uma informação, pelo efeito mensageiro, é fácil observar que a informação afeta imediatamente a percepção das pessoas. Talvez, de forma até mais intensa do que o conteúdo da informação passada. Na verdade, isso ocorre também por conta de outro efeito que pode potencializar o efeito mensageiro, o efeito halo.
O efeito mensageiro é uma tendência humana em avaliar uma mensagem com base na fonte de onde ela vem, em vez de avaliar o conteúdo da mensagem em si. Em outras palavras, a credibilidade do mensageiro pode influenciar a forma como as pessoas recebem e interpretam a mensagem.
Da mesma forma, o efeito halo é uma tendência em que a impressão geral que temos de uma pessoa influencia nossa percepção de suas características específicas. Por exemplo, se temos uma boa impressão de alguém, podemos ser mais propensos a avaliar suas habilidades ou características positivamente, mesmo sem ter evidências concretas para apoiar essa avaliação.
Portanto, com base nos efeitos de comunicação analisados é fácil compreender como um presidente consegue mobilizar os assuntos de um país de forma tão impactante. E, da mesma forma, como um presidente de uma grande empresa do varejo nacional pode causar um pânico no setor quando informa problemas em sua própria empresa. A conclusão mais uma vez é que a comunicação deve ser tratada de forma muito prudente, dado seu efeito nos mercados. Principalmente se forem considerados assuntos complexos, tendo em vista os efeitos multiplicadores dos algoritmos nas redes sociais. Tema que vem inclusive sendo debatido na Suprema Corte dos Estados Unidos. Será que comunicação corporativa pode gerar um Cisne Negro no mercado brasileiro? Veremos isso em meu próximo artigo.
Claudio de Moraes – Professor e Pesquisador do Coppead, especialista em Banking, com artigos publicados em diversos periódicos internacionais. Atua no Banco Central do Brasil na área de estabilidade financeira, com experiência em regulação e supervisão bancária.