Em um estudo recente, o BNY Mellon fez uma análise muito interessante sobre o futuro da gestão de recursos.
Para entender o que nos aguarda, primeiro vamos contextualizar o que estava acontecendo anteriormente. A indústria internacional de Hedge Funds, que são os fundos com mandato mais amplo (similares ao multimercado no Brasil), estava definhando nos últimos anos. No primeiro trimestre de 2021 tivemos a menor quantidade de fundos de investimento ativos sendo lançados nos EUA dos últimos 20 anos. E, olhando as liquidações anuais, temos uma massiva finalização de fundos anualmente, seja por rentabilidade baixa, falta de cotistas ou outros motivos.
Ok, este resultado é distante da realidade brasileira, onde temos notado o grande crescimento expressivo de casas independentes de gestão de recursos. Porém este não é um fenômeno único no mercado local, dado o crescimento no número de investidores da B3 (SA:B3SA3) e a maior demanda por serviços especializados de investimentos. Aqui cresceram os fundos e todos os outros produtos de investimento, um fenômeno atípico, mas motivado por uma taxa de juros mais baixa do que a média histórica.
Entretanto, ao olhar o mercado internacional, muito mais maduro e desenvolvido, podemos obter alguns insights a priori do que pode acontecer com a indústria local.
Na última década houve uma mudança significativa na indústria financeira americana, com a queda no volume de aplicações em hedge funds ativos, isto é, fundos que tentavam superar o benchmark, e um volume significativo de recursos migrando para ETFs passivos e mutual funds, que tendem a performar próximo dos seus índice de referência.
Esta migração pode ser explicada por alguns fatores: o primeiro é que muitos dos gestores ativos não conseguiam bater o seu benchmark. Estudos demonstravam que a maioria dos gestores ativos perdia em janelas longas, seja pela sua seleção de ativos ou seja pelas taxas cobradas. O segundo que os investidores passaram a desejar pagar menos taxas, visto que a massificação do mercado financeiro online pode fazer com que os custos diminuíssem em quase todas as classes de produtos.
A sabedoria convencional indicava que a indústria migrava cada vez mais para um mercado passivo, entretanto os gestores de recursos parecem ter encontrado uma nova solução e estão se reconstruindo. O lançamento crescente de ETFs ativos, isto é, fundos similares aos hedge funds, mas que são negociados em bolsa, demonstra que o trabalho dos gestores de recurso está voltando a ganhar relevância. Os influxos para ETFs norte-americanos ativamente gerenciados nos primeiros seis meses deste ano chegaram a US$ 55 bilhões, aproximando-se rapidamente da entrada de US$ 59 bilhões em 2020, de acordo com a Morningstar:
No ano passado já foram lançados mais ETFs ativos do que passivos e alguns dados demonstram que podemos estar no início de uma mudança significativa na indústria que possui US$ 9,4 trilhões sob custodia (total de ETFs passivos).
Voltando ao estudo do BNY Mellon, a casa argumenta que, depois de mais de uma década de trancos e barrancos, a gestão ativa está ganhando força nos ETFs, um setor há muito visto como quase sinônimo de investimento em índices.
Atualmente, o maior ETF ativo é o ARK Innovation ETF (NYSE:ARKK), o carro-chefe da ARK Investment Management, uma boutique de gestão de recursos administrada por Cathie Wood. O fundo cresceu mais de US$ 15 bilhões de patrimônio (AUM) de novos investidores no ano passado e se tornou o maior ETF gerido ativamente nos EUA, de acordo com o banco de dados de ETF (etfdb.com).
A gestora ficou famosa por ter revolucionado a indústria ao quebrar alguns paradigmas antigos, como por exemplo abrir completamente a sua carteira e as alocações diariamente (normalmente segredo dos gestores) e cobrar FEEs mais baixos que o tradicional 2% + 20% de performance (2/20).
Além disso, os fundos ARK alocaram grande parte dos recursos em empresas de tecnologia, uma filosofia da casa que acabou sendo uma das maiores vencedoras na crise de 2020.
Obviamente que alguns investidores foram impressionados pelos ganhos espantosos de alguns fundos temáticos ativamente, porém outros buscam a segurança na gestão ativa. Estratégias discricionárias que usam opções para limitar a exposição a desacelerações do mercado de ações estão se tornando uma forma cada vez mais popular para os poupadores permanecerem alocados no mercado de ações, mas receosos caso venha ocorrer uma nova crise. E as empresas sentadas sobre pilhas de dinheiro (seguradoras e bancos) estão abocanhando os ETFs de renda fixa de credito privado (dívida curta) geridos ativamente, tentando compensar a queda do juros enquanto minimizam o risco inerente nas durations mais longas.
“Os investidores finalmente entendem”, disse Ben Johnson, um diretor de pesquisa global de ETFs da Morningstar. “ETF ativos podem ser lucrativos. Há uma série de fundos com histórico suficiente para mostrar que podem entregar valor para os seus cotistas.” Os resultados mostram que os investidores estão cada vez mais propensos a tentar alocar uma parcela maior do seu capital em ETFs ativamente geridos:
Na minha opinião, os ETFs passivos e ativos não são excludentes, mas poderá haver sim uma canibalização neste mercado. Em um mundo de juros estruturalmente baixos, inflação elevada e ganhos reais negativos, o investidor precisará tomar mais risco se visa apresentar ganhos mais consistentes. No passado os custos da gestão ativa, liquidez baixa dos fundos e falta de transparência eram um problema que os clientes acabavam aceitando por falta de opção ao tentar buscar maiores retornos, porém na nova era da informação e do fácil acesso a grandes nomes do mercado financeiro via live ou redes sociais e taxas mais baixas, os investidores podem se tornar muito mais propensos alocar os seus recursos em ETFs ativos em busca de auferir maiores ganhos. Neste cenário a indústria da gestão de recursos talvez consiga voltar a ganhar o relevância nos portfolios e as assimetrias de mercado possam ser capturadas mais rapidamente por estes grandes investidores.
-Guilherme Zanin CGA, CNPI-T e Series 7