Com a alta dos IGPs chegando a 15 por cento no ano, só se fala sobre o risco da inflação no Brasil.
Se você já foi no supermercado esses dias, deve ter se deparado com os preços do arroz. Esse item foi tão comentado nesses últimos dias que até já virou meme.
Os alimentos estão entre as maiores altas do IPCA, chegando a quase 10 por cento na comparação anual. Por outro lado, o IPCA mostra que os serviços têm caído bem, dando uma boa compensada no índice total.
Itens ligados à construção civil também mostram altas fortes e preocupam. Ainda, relatos de escassez no fornecimento de outros produtos também chegam aos jornais.
Como se proteger da inflação?
Quando se fala em proteção contra a inflação, o título mais procurado entre as pessoas físicas é o IPCA+. Este título te rende uma taxa chamada de juro real, mais a variação do IPCA.
O que se imagina é que, se o IPCA subir, seu título renderá mais, retornando o seu poder de compra.
Mas não é bem assim! Tem uma pegadinha aí, e quem me acompanha já está careca de saber.
O título IPCA+ é um título híbrido, pois tem um componente pós-fixado, que é a variação do IPCA, e um componente prefixado, que é o juro real.
O componente pós-fixado de fato faz seu título render mais quando a inflação sobe. E, quanto mais ela subir, maior será a atualização de preço do seu título.
Porém, o componente prefixado pode "cancelar" os ganhos com a alta do IPCA.
Como assim?
Se o aumento da inflação for tal que acabe fazendo com que os investidores esperem que novas altas de juros sejam necessárias, o juro real desse título subirá.
Nesse caso, com a alta da parte prefixada do seu título, você terá prejuízo de marcação a mercado. Ou seja, a alta do juro real causará a queda do preço do seu título.
Eu sei que é um pouco contraintuitivo, mas isso não seria novidade no mundo dos investimentos.
Em 2012, quando Tombini controlava o Banco Central, testamos taxas de juros muito baixas para a época. O mercado achou que o BC estava exagerando na queda e começou a esperar inflação crescente no futuro. O mercado precificou que, mesmo que Tombini quisesse manter as taxas artificialmente baixas no curto prazo, elas teriam que subir no longo prazo, conforme a inflação desse as caras.
Olhe este gráfico da taxa do IPCA+ 2050 (em azul), com o IPCA (em preto):
Fonte: bloomberg
A inflação (preto – escala à direita) começou a subir a partir de 2012, chegando ao pico de 10,67 por cento em 2015. A taxa do IPCA+ 2050 (azul – escala à esquerda) também subiu forte já em 2013, antecipando a alta da inflação e a necessidade de juros maiores.
Em 2013, o título em questão teve uma queda de incríveis 32 por cento no seu preço! Isso mesmo, prejuízo digno de Bolsa, não é mesmo?
Em 2015, mesmo com o IPCA de mais de 10 por cento, o investidor desse título perdeu dinheiro!
Ou seja, para você ganhar dinheiro no IPCA, não basta que a inflação seja maior. Isso precisaria acontecer com o juro real estável. E isso é o mais difícil, pois quando a inflação sobe, o mercado começa a precificar novas altas de juros.
Mas, Marília, e se eu não vender meu título e segurar ele até o vencimento, de tal forma que eu não sofra a "marcação a mercado"?
Você até poderia fazer isso, mas não é uma boa estratégia. Note que, nesse mesmo exemplo, as taxas do IPCA+ foram parar em 7,5 por cento! Imagina se você tivesse se travado em IPCA + 4 por cento para os próximos 30 anos e, depois de 1 ano, esse mesmo título estivesse te pagando IPCA + 7,5.
Você não ficaria arrasado? Você realmente acha uma boa estratégia se travar antecipadamente em uma taxa que você sabe que vai subir? Você não acha uma péssima estratégia comprar um ativo que você sabe que vai se desvalorizar?
Pense assim: se você sabe que uma ação da sua empresa preferida vai cair 30 por cento, você compra agora ou espera cair para comprar?
Então por que faria isso com o seu IPCA+?
Além de tudo, você não pode se assegurar de que nunca vai vender o papel, ainda mais um papel longo assim. Sempre podem aparecer demandas de gastos para esse seu dinheiro ou novas oportunidades de investimento muito melhores. Não faz sentido travar seu dinheiro em algo que você sabe que não vai performar.
É o que eu prego diariamente para quem pergunta como se proteger. Tem formas muito mais eficientes!
Sua carteira de Renda Fixa tem que ter esse olhar oportunista, para que você não passe pelo dissabor de acertar o cenário, mas perder dinheiro.
Uma boa semana!