Estoques vs. demanda: quem vai vencer? Até agora, tudo indica que os estoques irão determinar a direção dos preços do petróleo no curto prazo.
O otimismo pelo fato de alguns estados norte-americanos estarem saindo dos confinamentos provocados pelo coronavírus começará a incentivar a demanda de combustíveis, fazendo com que os preços do petróleo subam pela segunda semana seguida. O problema é que a valorização do West Texas Intermediate – que foi de 25% na semana passada após 17% na semana anterior, e um total de 100% em relação às mínimas de 10 dias – pareceu forte demais para uma recuperação ainda incipiente.
Os estoques de petróleo, enquanto isso, continuaram subindo sem muito alívio.
Cerca de 70 superpetroleiros ficaram imobilizados por pelo menos quatro semanas em águas internacionais, segundo a corretora marítima Gibson em uma postagem em seu blog no fim da semana passada.
Contango deve voltar a ocorrer
Isso significa que o chamado “contango” – quando o desconto no contrato futuro com vencimento mais próximo em relação ao contrato subsequente faz com que valha mais a pena estocar o petróleo – possa voltar a ocorrer, sugeriu a empresa.
O contrato futuro de WTI com vencimento em junho apresentava um desconto de menos de US$ 1,30 em relação ao contrato com entrega em julho, ao passo que o Brent negociado em Londres com entrega em julho apresentava um desconto de menos de US$ 1,10 em relação ao contrato de agosto. O contango no WTI era cerca de 20 vezes maior há menos de três semanas, quando o petróleo norte-americano atingiu pela primeira vez uma cotação negativa perto da expiração do contrato que vencia em maio.
Ainda que esse evento não venha a ocorrer novamente no contrato em vigor, o aumento dos estoques petrolíferos nos EUA já está começando a assustar alguns investidores no mercado.
Cerca de 28 navios-tanque com petróleo da Arábia Saudita, incluindo 14 superpetroleiros carregando no total 43 milhões de barris, estão começando a chegar à costa Oeste e do Golfo nos EUA.
A frota saudita se juntará a outras dezenas de navios-tanque que estão esperando para descarregar nos portos americanos. Trinta e quatro petroleiros estão ao longo da costa ocidental dos EUA, carregados com cerca de 25 milhões de barris de óleo. Outras 31 embarcações, carregando um volume similar, estão esperando para descarregar na Costa do Golfo.
O governo Trump está sendo pressionado a aplicar tarifas ou outra ação punitiva ao petróleo saudita, no intuito de evitar que haja um excesso de oferta maior nos EUA. Mas isso será difícil, já que os sauditas começaram a “entrar no jogo” do presidente Donald Trump, ao concordar primeiro com a nova rodada de cortes de produção, depois elevando seus preços oficiais de venda na Ásia, na tentativa de provocar uma alta no preço do petróleo no mercado mais amplo.
“Os futuros do petróleo estão voláteis, e a estrutura de preços pode mudar drasticamente nas próximas semanas”, alertou a Gibson em uma nota na semana passada. “No que se refere ao estoque flutuante, o cenário continuar evoluindo”.
A corretora marítima disse ainda:
“Ainda é preciso ver quantos navios-tanque fecharam contratos de fretamento por tempo recentemente e qual volume de petróleo ficará armazenado em estoque por um período mais prolongado. Da mesma forma, é possível haver novas situações de contango em vista dos níveis de preço reduzidos no mercado à vista. É preciso ter atenção com esse cenário.”
Desaceleração nos fechamentos de poços com a alta dos preços
O Goldman Sachs utilizou palavras mais pessimistas em uma nota emitida aos clientes na sexta-feira.
“Embora os investidores estejam menos negativos em relação à demanda, a alta do Brent para cerca de US$ 30/bbl e do WTI para perto de US$ 25/bbl está aumentando a preocupação de que podemos estar sacrificando a alta do petróleo no futuro em favor dos níveis atuais, o que pode provocar uma reversão precoce das atuais interrupções de produção nos poços.”
O banco de Wall Street disse ainda:
“Isso tem deixado os especialistas desconcertados, principalmente em relação a empresas com balanços patrimoniais mais frágeis, inclusive aquelas que possam estar protegidas contra preços mais baixos em 2020.”
Tudo isso indica que o rali do petróleo pode estar com os dias contados.
“O que estamos vendo neste momento é um drible falso antes de outra disparada nos volumes de petróleo capazes de fazer os estoques atingirem a capacidade máxima e os preços registrarem novas mínimas”, declarou Art Berman em um tuíte no fim de semana, que conta com 22.000 seguidores no Twitter, os quais são, em sua maioria, profissionais do setor de óleo e gás.
Ex-geólogo de petróleo, Berman é agora analista de investimentos com mais de 35 anos de experiência, com foco no estudo comparativo de estoques petrolíferos. Em suas palavras, o atual repique “lembra aquele falso rali de março-junho de 2015 no petróleo, antes de os mercados aceitarem que as coisas não voltariam a ser o que eram antes”.
Cinco ralis no petróleo nos últimos dois anos falharam
Berman lista cinco grandes ralis no petróleo desde meados de 2018 até este ano que fracassaram prematuramente: 1. Isenções a importadores do petróleo iraniano em outubro de 2018; 2. Ataques a navios no Golfo Pérsico em abril de 2019; 3. Extensão dos cortes pela Opep+ em julho de 2019; 4. Ataque às refinarias sauditas em setembro de 2019; 5. Extensão da Opep+, acordo comercial EUA-China e assassinato de Qassem Soleimani.
“Qual é a possibilidade de um sexto rali?", perguntou o analista, prevendo que a possível corrida no petróleo norte-americano até o nível intermediário da faixa de US$ 30 “pode ser seguida de uma queda abaixo dos US$ 20”.
Isso não quer dizer que os preços do petróleo não vão disparar de novo se o rali atual fracassar. O colapso no número de sondas nos EUA e os esperados fechamentos de poços sugerem que o maior desajuste na oferta/demanda deve acontecer em algum momento, como sugere Morgan Stanley. Mas isso é para o futuro. O problema do mercado petrolífero, no entanto, é o “agora”. A oferta ainda é muito grande em comparação com a trajetória das perdas de produção, o que eventualmente fará com que o armazenamento atinja sua capacidade máxima. E isso em breve afetará o rali atual.
Acúmulo de petróleo desacelera, mas a economia dos EUA está piorando
Embora os acúmulos de estoques tenham desacelerado no centro de distribuição de Cushing, Oklahoma, são necessários apenas 11 milhões de barris para que seu espaço de armazenagem atinja a capacidade plena. E a maior parte do espaço disponível em Cushing já foi arrendada, de acordo com fontes internas.
A economia dos EUA, enquanto isso, continua se deteriorando tanto em relação aos empregos quanto ao crescimento.
O Departamento de Trabalho afirmou que mais 3,17 milhões de americanos ficaram desempregados na semana até 2 de maio, aumentando o número de desocupados para mais de 33 milhões desde o início da pandemia nos Estados Unidos.
A economia norte-americana, fortemente dependente do consumo, encolheu 4,8% no primeiro trimestre. Embora esse tenha sido o declínio trimestral mais acentuado desde a crise financeira de 2008/09, economistas preveem que os números deste trimestre serão piores, na medida em que a reabertura econômica não deve apresentar uma recuperação vigorosa até o período de julho a setembro.
Alta do ouro pode depender da China
Nos metais preciosos, o ouro deve permanecer abaixo de US$ 1.750, a menos que, evidentemente, Trump resolva arrumar briga com a China no comércio, processando Pequim pelas mortes provocadas pelo vírus nos EUA.
As tensões comerciais entre EUA e China devem continuar se agravando depois que Trump disse à Fox News, na sexta-feira, que estava “bastante inclinado” a encerrar a primeira fase do acordo comercial com Pequim. O governo Trump está avaliando aplicar punições à China por causa da maneira como Pequim administrou o início da pandemia, incluindo possíveis tarifas e mudança de cadeias de suprimentos para fora do principal fornecedor dos EUA.
“Seria extremamente desestabilizador se o presidente saísse do acordo sem dar aos chineses a chance de cumprir seus compromissos", declarou Craig Allen, presidente do conselho comercial sino-americano.
Trump afirmou que encerraria o acordo comercial se a China não cumprisse seus compromissos de compra. O presidente afirmou, na quarta-feira, que avaliaria em uma ou duas semanas se isso seria possível.
Jeffrey Halley, analista sênior de mercado da OANDA, em Nova York, declarou que um movimento decisivo anti-China por parte de Trump pode gerar uma corrida em busca de segurança no ouro, que ainda não estabeleceu uma direção clara em maio.
“O ouro continua ancorado no meio da faixa maior de US$ 1650 a US$ 1750 por onça. Até que haja um rompimento de um dos lados, o ouro deve continuar ocupando os assentos mais baratos do teatro do mercado financeiro", declarou Halley.
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