De acordo com algumas reportagens, a Casa Branca enviou convites para 200 pessoas, preparando o palco para a conclusão da primeira fase do acordo comercial com a China. Mas, restando apenas cerca de 72 horas para a assinatura, as expectativas dos mercados de commodities estão bastante baixas em relação ao que o acordo pode proporcionar ao petróleo e aos grãos, em especial.
O presidente dos EUA, Donald Trump, e o negociador-chefe da China, Liu He, devem firmar um pacto de 86 páginas no dia 15 de janeiro, uma semana antes do aniversário de dois anos das tarifas que Trump aplicou sobre painéis solares e máquinas de lavar da China, abrindo espaço para uma guerra tarifária de US$ 735 bilhões, que já gerou perdas reais de US$ 46 bilhões a empresas americanas.
Não houve qualquer informação oficial até agora sobre o que os dois lados vão assinar na quarta-feira.
A Bloomberg preencheu alguns vácuos no fim de semana, afirmando que a primeira fase se concentrará principalmente no compromisso da China de respeitar a propriedade intelectual dos EUA e não manipular sua moeda.
A questão das compras de US$ 200 bilhões da China
No que tange às commodities, o acordo parece envolver novas aquisições de US$ 200 bilhões, as quais, segundo a Bloomberg, devem “reparar alguns dos danos sofridos pelos agricultores [americanos]”. Isso significar que a China pode aumentar suas importações de soja norte-americana, embora o acordo também preveja o compromisso de aquisição de petróleo bruto.
Mas os investidores não têm qualquer ideia dos prazos envolvidos. Seriam US$ 200 bilhões em quatro anos ou mais, considerando que Trump exigia US$ 50 bilhões em aquisições de produtos agrícolas por ano da China?
Até que se saibam os detalhes, o melhor para os investidores de commodities é manter as expectativas baixas em relação ao acordo, mesmo que os mercados acionários continuem em clima de festa. As ações abriram em alta na Ásia nesta segunda-feira, preparando o terreno para a alta das ações europeias e a continuidade do rali em Wall Street, que atingiu máximas recordes novamente na sexta-feira, antes de se consolidarem.
Os preços das commodities, no entanto, praticamente não se mexeram até o momento em que escrevo. O West Texas Intermediate, referência do petróleo nos EUA, subia 2 centavos, a US$ 59,05 no início do pregão em Cingapura, permanecendo bem abaixo da marca altista de US$ 60.
O Brent, referência mundial do petróleo, caía 3 centavos, a US$ 64,95, ficando abaixo do suporte de US$ 65.
Petróleo deve cair ou permanecer estável
“Por enquanto, vejo a continuidade do cenário de baixa no WTI”, afirmou Scott Shelton, corretor de futuros de energia na ICAP, em Durham, em uma nota na sexta-feira, dizendo ainda:
“No Brent, acredito que há sinais de que o mercado possa ver uma força adicional nos spreads. Senão, espero que o mercado permaneça estável."
As primeiras semanas do petróleo em 2020 foram bastante voláteis, diante da possibilidade de uma guerra entre EUA e Irã, mas as tensões rapidamente arrefeceram.
Na primeira sexta-feira do ano, o WTI atingiu as máximas de oito meses acima de US$ 64, enquanto o assassinato do alto general iraniano, Qassem Soleimani, deixou em alerta tanto os EUA quanto o Oriente Médio. O Brent disparou para a máxima de quatro meses, a US$ 71,28, na terça-feira, por causa de especulações de que pudesse haver um acirramento do conflito EUA-Irã.
Mesmo assim, até a sexta-feira seguinte, o WTI apresentava uma desvalorização de 6,4%, registrando sua maior perda semanal em mais de seis meses, depois que Trump evitou responder aos ataques a mísseis de Teerã após a morte de Soleimani.
O Brent derrapou 5,3% na semana, com a eliminação do prêmio de risco no petróleo por causa do conflito EUA-Irã.
Embora o assassinato de Soleimani não tenha impactado diretamente a produção nem a remessa de petróleo, os investidores inicialmente precificaram um elemento de risco maior no mercado. Tanto o Irã quanto o Iraque são membros da Opep e, junto com a Arábia Saudita, respondem por cerca de 40% da produção mundial de petróleo. Na semana passada, os petroleiros deliberadamente evitaram o Estreito de Ormuz perto do Irã, priorizando o lado seguro, segundo operadores.
Disparada nos estoques de petróleo
Para piorar o cenário do petróleo, a disparada no estoque nas últimas duas semanas gerou um acúmulo de combustíveis que não era visto havia um ano.
Para quem enfrentou o crash de US$ 4 no WTI na semana passada, a intrincada questão será: quais armas o mercado ainda tem para voltar a subir? A resposta, evidentemente, são os cortes de produção da Opep. E talvez a assinatura da primeira fase do acordo comercial EUA-China exerça algum efeito, ainda que breve, nesta semana.
Quanto aos cortes da Opep, mesmo que sejam aprofundados no primeiro trimestre, a visível indisposição da Rússia em continuar com a manipulação do mercado planejada pela Arábia Saudita e outros aliados da Organização dos Países Exportadores de Petróleo está emitindo sinais de fumaça de natureza diferente ao mercado.
Se a Rússia perder a vontade de permanecer na Opep+ e de contribuir com os cortes de produção da aliança além do primeiro trimestre, a situação pode ficar ainda mais instável. Moscou não demonstrou qualquer intenção concreta de deixar a parceria.
No entanto, está ficando cada vez mais preocupada com a perda de participação de mercado que a Opep+ está provocando às exportações petrolíferas do país, principalmente em vista das máximas recordes de remessas de petróleo dos EUA no início do ano. A Opep+ se reunirá em Viena nos dias 4-6 de março, quando Moscou terá a oportunidade de tomar sua decisão.
Perspectiva para o ouro é melhor que a do petróleo
O mais sintomático de tudo é que a perspectiva para o ouro está tão turva quanto a do petróleo, ainda que seja melhor.
Os futuros do ouro para entrega em fevereiro na COMEX de Nova York fecharam o pregão de sexta-feira em alta de US$ 5,80, ou 0,4%, a US$ 1.560,10 por onça. O contrato atingiu as máximas de abril de 2013, a US$ 1.613,30, logo após os ataques de mísseis feitos pelo Irã, na terça-feira.
Já o ouro spot, que acompanha as negociações em lingotes, fechou com alta de US$ 9,46, ou 0,6%, a US$ 1.562,20 por onça. Sua cotação chegou a atingir US$ 1.611,52 na semana passada.
Assim como o petróleo, o ouro disparou com as tensões entre EUA e Irã. Mas, mesmo com a redução da animosidade, o metal amarelo permaneceu em alta, à medida que os investidores buscavam uma proteção contra outros riscos, como as máximas históricas nos preços das ações nos EUA.
Analistas dizem que, enquanto Wall Street continuar atingindo novos picos, a expectativa é que o ouro siga subindo, reforçando a nova relação entre as ações e os ativos de proteção, que costumavam ter uma correlação inversa.
Ouro deve ofuscar Wall Street
O ouro disparou na sexta-feira, à medida que os três principais índices dos EUA atingiam máximas recordes, antes de Wall Street fechar o dia em queda. O Dow 30 brevemente cruzou a marca de 29.000 pontos em 10 de janeiro, pela primeira vez na história, depois de um relatório de empregos apagado para dezembro nos EUA.
O ouro geralmente segue na direção contrária das ações, mas, desde o ano passado, essa correção inversa parece ter mudado, na medida em que os investidores buscam um seguro contra a possibilidade de uma reversão repentina em Wall Street após a série de máximas históricas nas ações. George Gero, analista de metais preciosos na RBC Wealth Management, de Nova York, afirmou:
“O ouro continua em tendência de alta, em conjunto com as melhores ações e o dólar."
O Índice do Dólar (DXY), outra correlação inversa ao ouro, atingiu a máxima de uma semana a 97,303 na sexta-feira, antes de fechar estável a 97,08.
O ouro spot fechou o ano passado com uma alta de 18%, enquanto os futuros do ouro se valorizaram 16%. Ambos já subiram quase 3% desde o início de 2020.