Em junho do ano passado publicamos neste espaço alguns dados sobre a evolução da capacidade de armazenagem no Brasil e a relação desta com a produção de grãos.
A chegada da safrinha 2022/23 impactou fortemente os preços, escancarando o déficit de armazenamento que temos no Brasil.
Trouxemos alguns dados sobre o cenário atual, usando as projeções de fevereiro para a safra brasileira de grãos, segundo a Conab. Em relação à soja, as expectativas ainda apontam para ajustes negativos da produção.
Para o milho, com a boa evolução da semeadura da segunda safra e o enfraquecimento do El Niño, que deve dar espaço a um cenário de neutralidade a partir do trimestre iniciado em abril, o risco de quebra mais relevante na produtividade vai diminuindo.
Aqui cabe uma observação, de que mesmo sem quebras maiores, o balanço projetado pela Conab no mercado do milho não está folgado, ainda que projetando queda relevante nas exportações (42% entre os ciclos 2022/23 e 2023/24). A relação entre o estoque final e a demanda total (já considerando exportações em queda) deve ficar em 5,6%, o equivalente a 20 dias. Essa relação estava em 17 dias no ciclo 2022/23, até mais apertada, no entanto, já oscilou em mais de 50 dias ao final dos ciclos 2019/20 e 2020/21. E se as exportações “caírem menos” o cenário fica ainda mais justo.
Esse equilíbrio é um ponto a ser acompanhado, ainda que a situação projetada para a segunda safra tenha melhorado do ponto de vista produtivo.
A possível redução de área com milho nos Estados Unidos também deve ser monitorada.
Dito isso, considerando os dados de capacidade de armazenagem da Conab e a sua última estimativa de safra, de fevereiro, calculamos a evolução do déficit de armazenagem, considerando apenas soja e milho.
Figura 1. Déficit de armazenagem no Brasil, considerando apenas as produções de soja e milho.
Fonte: Conab / Elaboração: HN AGRO
Como estamos falando de uma safra 8,2% menor para milho+soja, a pressão sobre o armazenamento também será menor.
Aqui cabe a ressalva de que os dados referem-se à capacidade estática, e não considera outras formas, como silos bolsa. Outro ponto é que, como estamos no começo do ano, as capacidades de 2023 e 2024 estão iguais na série da Conab (201,4 milhões de toneladas) e os dados de 2024 serão atualizados ao longo do ano.
Em outras palavras, o “aperto menor” este ano, em relação ao armazenamento, se deve simplesmente à redução projetada para a produção e não a um salto de capacidade.
Mais uma ponderação é que a comparação foi feita apenas com a safra daquele ciclo, sem considerar estoques anteriores. De toda forma, como a mesma análise foi feita para série toda, podemos assumir que o armazenamento em si deve ter menos peso que no ciclo anterior, no cenário do mercado. Isso quer dizer que essa variável deve pesar menos este ano, não que ela será mais importante que as demais na precificação.
A figura 2 mostra a relação entre a capacidade de armazenagem e a produção de milho e soja.
Figura 2. Produção de milho e soja, armazenagem e relação entre a armazenagem e a produção.
Fonte: Conab / Elaboração: HN AGRO
Considerações
Apesar de uma situação de “menos déficit” (quase uma “despiora”) que em 2023, pela produção menor, o viés tem sido de aumento da lacuna de armazenagem no Brasil.
Entre o ciclo 2013/14 e o projetado para 2023/24, a capacidade de armazenamento aumentou em 39,6 milhões de toneladas, uma média de 2,2% ao ano, enquanto a produção de grãos aumentou 106,1 milhões de toneladas (4,5% a.a.), ou 96,9 milhões, considerando apenas soja e milho (+4,7% a.a.).
Isso, já considerando uma redução de produção de 6,3% entre 2022/23 para grãos em geral e de 8,2% para soja+milho, usando as estimativas de fevereiro como referência.
Quanto mais justa é a capacidade de armazenagem, menor é o poder de negociação do vendedor e isso é mais um fator, dentre muitos, que impactam o mercado.