Cenários para o Setor Externo e a Taxa de Câmbio
Um dos grandes desafios para a próxima equipe econômica será tentar reduzir o crescente déficit em conta corrente em curso, negativo em 3,7% do PIB nos 12 meses até outubro e considerado pelo FMI o pior desempenho entre os emergentes. Muitos têm dúvidas sobre sua sustentabilidade, caso passe de 4% do PIB; outros argumentam que com reservas cambiais folgadas, em torno de US$ 376 bilhões, seu financiamento se torna administrável. Será mesmo? Aqui, o debate se desloca para a capacidade de pagamento do País, diante dos compromissos futuros e os rumos da economia brasileira e da mundial.
Basicamente, o desequilíbrio atual do saldo em conta corrente se explica pela piora da balança comercial e da deterioração das contas de serviços e renda. Façamos então uma análise aprofundada destas variáveis e as perspectivas para 2015 (incluindo aqui a taxa de câmbio).
Comportamento da balança comercial.Nos últimos anos houve uma forte deterioração da balança comercial. Em 2012 o superávit era de US$ 19,4 bilhões, no ano seguinte despencou a US$ 2,4 bilhões e neste ano, até novembro, estava negativo em US$ 4,2 bilhões, com as exportações recuando 5,2% e as importações 3,7%. Ao fim deste ano deve fechar negativo em torno de US$ 5 bilhões. Como chegamos a tal resultado?
Basicamente, em função: (1) da considerável redução na cotação das commodities, com destaque para minério de ferro e soja, principalmente em função do período de transição da economia mundial e da China; (2) da piora do saldo da balança de petróleo e derivados (negativa em torno de US$ 22 bilhões em 2013, devendo recuar a US$ 15 bilhões neste ano); (3) da instabilidade cambial, gerando baixa previsibilidade na capacidade de exportar e de importar; (4) de problemas localizados em países importadores de manufaturados, como Argentina, em crise cambial; (5) da retração da demanda interna, derrubando as importações, e (6) do Custo Brasil elevado, tendo como importantes detonadores a carga fiscal excessiva, a fatigante burocracia para exportar e os problemas já crônicos de logística e escoamento.
Comportamento do saldo em conta corrente.Neste ano, até outubro, o déficit foi a US$ 70,7 bilhões e em 12 meses a US$ 84,4 bilhões. Em 2009 estava em US$ 24,3 bilhões, em 2012 foi a US$ 54,2 bilhões e no ano passado a US$ 81,1 bilhões.
Além da balança comercial já analisada, boa parte deste aumento decorreu da piora do déficit de serviços, que de US$ 19,2 bilhões em 2009 foi a US$ 41,0 bilhões em 2012, US$ 47,1 bilhões no ano passado e US$ 39,9 bilhões até outubro deste ano, avançando 1,3% contra o mesmo período de 2013.
Os maiores aumentos ocorreram (1) nas despesas com viagens internacionais; (2) no aluguel de máquinas; (3) nas despesas com transportes (fretes); (4) no aluguel de royalties e licenças; e (4) nas remessas de lucros e dividendos. Sobre o aumento das primeiras, em torno de US$ 15,5 bilhões no ano, avançaram 3,1% contra outubro do ano passado, mas devem perder força nos próximos meses, em função do câmbio depreciado. Já as despesas com transportes, US$ 7,57 bilhões no ano, recuaram 10,3% contra o mesmo período de 2013 e o aluguel de royalties e licenças aumentou 13,4%, em muito pelo aquecimento da indústria de petróleo.
Pelo lado das despesas com rendas, nas atreladas aos investimentos externos diretos (IED), as remessas com lucros e dividendos registraram perdas de US$ 14,10 bilhões até outubro deste ano, crescendo 8,2% sobre o mesmo período do ano passado. Isto decorreu do aumento do passivo total de IED e em ações. Como o ingresso líquido de IED, em torno de US$ 66,0 bilhões em 12 meses até outubro, deve começar a perder dinamismo no ano que vem pelo menor crescimento da economia e dúvidas sobre os ajustes a serem feitos, é possível que esta conta de remessas também desacelere em 2015.
Investimentos externos diretos.Interessante como estes vêm se mantendo elevados, sustentando a capacidade de financiamento externo, estáveis acima de US$ 63 bilhões. Em 2009 estavam em torno US$ 25,9 bilhões, em 2011 foram a US$ 66,6 bilhões, no ano seguinte a US$ 65,3 bilhões e no ano passado US$ 63,9 bilhões. Em 12 meses, até outubro, estavam em torno de US$ 66,0 bilhões, devendo ser o patamar a fechar neste ano. A justificar este bom ritmo de ingressos de IED as potencialidades do mercado consumidor brasileiro e uma “relativa maturidade democrática” das nossas instituições.
Cenário para a taxa de câmbio. Alexandre Tombini afirmou, em entrevista coletiva no anúncio da equipe econômica em fins de outubro, que “o estoque de swap cambial, em torno de US$ 106 bilhões, seria mantido em conformidade com a demanda, mas como já atende não seria necessário crescer mais”. Deixou no ar, portanto, a possibilidade de terminar com esta estratégia ao fim de dezembro (dia 31). Muito se comenta que deve, apenas, rolar os contratos de swapque vencerem ao longo de 2015. Não acreditamos, no entanto, que haja uma parada abrupta desta estratégia, até porque nos EUA o Fed deve começar o ciclo de elevação de juros, talvez em meados de 2015, gerando um realinhamento da liquidez global. Por outro lado, na visão da equipe econômica, o ajuste fiscal mais rigoroso deve gerar algum ganho de credibilidade ao governo, estimulando o reingresso de investidores externos e impactando favoravelmente a taxa de câmbio. Tudo isto, no entanto, são apostas. Temos que aguardar o anunciar das medidas fiscais. Ainda é prematuro tecer qualquer consideração definitiva. Por ora, mantemos a taxa de câmbio em R$ 2,60 ao fim deste ano e em torno de R$ 2,70 em 2015.
Cenário para o setor externo. Pelo lado da balança comercial a suave recuperação da economia mundial e a depreciação cambial recente devem estimular as exportações e inibir as importações, gerando um saldo melhor em 2015, pelas nossas projeções em torno de US$ 4 bilhões. Com isto, o saldo em conta corrente, ainda negativo, neste ano em torno de US$ 84 bilhões, deve recuar a US$ 78 bilhões em 2015. As despesas com viagens internacionais devem perder força, assim como as remessas de lucros, diante de um ingresso menor de investimentos externos diretos, decorrente das perspectivas ainda nebulosas para o País nestes próximos anos.
INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS DIRETOS (IED), TRANSAÇÕES CORRENTES (TC) E NECESSIDADE DE FINANCIAMENTO EXTERNO (NFE)
(acumulado 12 meses)