Apesar de parecerem coisas completamente diferentes, o paralelo entre a compra de um veículo e de uma ação faz bastante sentido. Especialmente quando se trata da compra de um veículo seminovo.
Ao decidir adquirir um carro usado, geralmente você começará o processo com duas perguntas fundamentais: qual tipo de carro você quer? Quanto está disposto a pagar por ele?
Um comprador padrão normalmente vai fazer uma pesquisa para identificar quais são os atributos que mais valoriza e são essenciais, aqueles que podem ser bem-vindos, mas que não são necessários e aqueles que são inaceitáveis.
Mas o carro ideal não passa de um sonho se não cabe no orçamento, então a variável preço se torna fundamental, e você provavelmente vai fazer uma pesquisa na internet para para ter uma noção do preço médio do carro desejado.
Após definir o modelo e aprender que o preço médio para um veículo do ano que você escolheu é de, por exemplo, 75 mil reais, você precisa dar o próximo passo: tomar a decisão de compra.
Você vai se preocupar com os riscos envolvidos no negócio, vai buscar um carro com uma quilometragem baixa e vai ficar atento aos indícios de algo que poderá lhe causar uma dor de cabeça, como algum barulho estranho, uma direção trepidando ou puxando para algum lado, ou até por sinais de uso abusivo do veículo.
Mas o preço geralmente é o fator mais importante, pois se você conseguir comprar o carro pagando um valor próximo do médio de mercado, estará pagando um valor justo.
Se você for sortudo o suficiente para comprar um veículo em condições normais por apenas 60 mil reais, terá feito uma excelente compra. Já se pagar 85 mil reais, provavelmente quem levou vantagem na transação foi o vendedor.
Claramente é muito melhor comprar o veículo por um preço justo ou abaixo dele, você não quer pagar caro demais pelo seu carro.
É lógico que comprar um carro não é um investimento. Você não compra esperando que ele vá se valorizar no futuro (a não ser que seja um veículo extremamente raro ou colecionável).
Mas o fato é que estamos falando de um processo de tomada de decisão em que você precisa adquirir um bem com informação limitada… exatamente como no mercado de ações.
Tudo o que nós queremos é comprar uma empresa cujos atributos atendam nossos critérios de seleção, pagando um preço justo ou abaixo do seu real valor, levando em consideração os riscos envolvidos no negócio. E para fazer tal análise, temos à nossa disposição as informações publicamente disponíveis e aquelas fruto de uma pesquisa própria.
Meu ponto é: se tudo isto vem instintivamente à sua mente na hora de comprar um veículo, por que seria diferente na hora de comprar uma ação?
Investir não é tão complicado quanto dizem por aí.
E não importa se você está comprando carros ou ações, “o preço é o que você paga e o valor é o que você leva”, como o mestre Warren Buffett nos ensinou.
As diferenças entre carros e ações
Mas algumas diferenças entre o mercado de veículos e o de ações são bastante claras.
Primeiro, o mercado de ações é muito mais volátil do que o de veículos.
O preço de uma ação pode variar bruscamente em um curto espaço de tempo, além disso, pode divergir muito mais do que é o real valor daquela companhia (e isso é uma oportunidade para os investidores).
Segundo, o mercado de ações é mais opaco e dinâmico do que o mercado de veículos.
É muito mais difícil calcular o valor de uma companhia. Na verdade, ele pode apenas ser estimado, e ainda assim, varia de comprador para comprador. Além disso, você pode comprar uma empresa que é uma Mercedes-Benz hoje, mas que pode se deteriorar para um Marea Turbo amanhã.
E por fim, o mercado de ações é muito mais líquido do que o de veículos.
Se você decide vender hoje, exceto em raras exceções de ações com baixíssima liquidez, você vai vender suas ações e receber seu dinheiro em 2 dias. Se você decide vender seu carro, primeiro precisa encontrar um comprador e ainda assim não é garantido que você vai receber seu dinheiro.
O fato de que o mercado de ações oferece cotações diárias de preço significa que podemos exorcizar nossos medos a qualquer momento. Se você decide que não gosta mais de uma ação, pode vendê-la para um comprador anônimo, e com um custo de transação baixíssimo, instantaneamente.
O problema é que as cotações diárias de suas ações tendem a divergir sua atenção do real valor daquela companhia.
Se você compra uma ação por 10 reais e por ironia do destino ela sobe +50 por cento rapidamente, o que você deve fazer? Segurar, comprar mais ou vender?
E se você comprar esta ação e ela cair -20 por cento nas primeiras semanas, o que fazer?
Muitos tendem a querer colocar o dinheiro no bolso na primeira opção, e a estancar os danos realizando logo o prejuízo na segunda opção.
Mas para saber a decisão correta você precisa fazer a pergunta correta: qual é o real valor daquela empresa?
Se for algo próximo de 30 reais, por exemplo, você deveria estar comprando mais desta ação, independentemente do que aconteceu com o preço após sua compra.
Viu como nós podemos facilmente nos divergir do que realmente importa por conta das oscilações de preço na bolsa?
Como não ser refém do Sr. Mercado?
O “humor” do mercado, um grande institucional montando ou desmontando posição, uma notícia que é apenas um ruído, mas que no calor do momento parece ser algo relevante… são diversos os fatores que influenciam as oscilações das ações no curto prazo, mas todos têm uma coisa em comum: são completamente imprevisíveis.
Mesmo sem saber o que vai acontecer amanhã, como você pode se aproveitar da volatilidade do mercado, sem sucumbir às tentações perigosas?
A resposta é simples, mas não necessariamente fácil de ser colocada em prática.
Você deve tentar se aproveitar da volatilidade na hora de fazer suas compras ou vendas, mas na vasta maioria do tempo você deve ignorar as flutuações do mercado e focar na progressão dos fundamentos das empresas por trás das ações.
Você precisa alinhar suas expectativas. Ter em mente que para alcançar os retornos esperados nos seus investimentos você deve, no mínimo, respeitar os ciclos empresariais — para uma empresa desenhar uma estratégia, tirar os planos do papel, fazer os investimentos necessários e depois colher os frutos, alguns anos são necessários para que os resultados se tornem realidade.
Eu disse no mínimo, porque em alguns casos o mercado pode demorar para reconhecer adequadamente a capacidade de criação de valor de uma empresa. E você também deve se aproveitar disso, as melhores oportunidades costumam surgir quando o mercado está tomado pelo pessimismo ou simplesmente não enxerga o valor de um ativo que ainda não é muito popular.
A boa notícia é que a disciplina e a paciência são muito bem recompensadas.
Performance acumulada do Investidor de Valor. Fonte: Nord Research.
A série O Investidor de Valor, mesmo nascendo em meio a uma crise e tendo acabado de passar por outra ainda mais intensa, acumula mais de +214 por cento de retorno desde sua criação.
Enquanto isso, no mesmo período, o IBOV rendeu +80 por cento e o CDI +54 por cento.
Não preciso nem dizer que retorno passado não é garantia alguma de retorno futuro, nem que este é o tipo de retorno que você deve esperar obter daqui em diante.
Um abraço.