Há um principio na política de gestão em torno do câmbio que evidencia que o “faz-se antes e explica-se posteriormente”, se e quando necessário, é a melhor opção para a implementação de medidas de impacto.
Contudo, no Brasil a partir de agosto de 2013 percebeu-se que era crescente a perda de confiança na moeda nacional, o real, o que provocaria substantiva depreciação e então o governo, por seu Banco Central, resolveu estabelecer uma intervenção diária com oferta mínima garantida de “hedge” (proteção de preço) e para não deixar duvidas a estabeleceu de forma programática anunciada definindo volumes e prazo de vigência do programa, com o claro intuito de afastar incertezas.
A necessidade era tão imperativa que para atingir o seu objetivo se tornou necessário o anúncio na forma realizada, contrariando o principio básico.
Com esta atitude buscou “comprar” do mercado a credibilidade que a moeda nacional por si só já não inspirava e assumiu o risco da variação cambial versus juros, massificando os leilões dos contratos dos instrumentos financeiros denominados “swaps cambiais”, operação que não envolve moeda estrangeira efetiva, mas que garante ao tomador o preço do dólar e é liquidável por diferença em reais, ou seja “hedge”.
Liquidamente, o estoque destes contratos em poder do mercado financeiro atingiram montante próximo de US$ 120,0 Bi, um recorde nunca visto não só no Brasil, e, atribui-se a aceitabilidade dos mesmos pelo mercado ao fato do país deter reservas cambiais em torno de US$ 370,0 Bi.
Assim, quando o programa venceu pela última vez em dezembro de 2014, prorrogou-o até o final do 1º trimestre de 2015 comprometendo-se à rolagem dos contratos vincendos até lá e agregando uma oferta adicional de 2.000 contratos diários, equivalentes a US$ 100,0 Mi.
O governo ao longo da ultima década utilizou vorazmente o preço da moeda americana como instrumento coadjuvante da política monetária com o objetivo de conter pressões inflacionárias oriundas de má gestão da política fiscal, extremamente expansionista e comprometedora do superávit fiscal.
O país chegou ao final do ano de 2014 absolutamente deteriorado em suas contas e com uma política econômica errática e sua economia em estado de inanição.
Um quadro caótico que impôs à nova equipe econômica a proposta imediata de alinhamento dos preços administrados, totalmente afetado por desonerações concedidas de forma equivocada e por contenções de ajustes de preços focando mascarar a inflação.
Passado o “raio x” pela nova equipe e surgiram então necessidades prementes de fortes correções no rumo, o que vem provocando forte impacto nos preços administrados em percentuais aterrorizantes para a sociedade e não somente isto, contaminando e provocando ajustes nos preços livres da economia, que ganharam adicionalmente os riscos e consequências dos problemas climáticos que provocaram seca e deixam a perspectiva de falta de energia. A inflação vem demonstrando estar acumulando os efeitos imediatos.
Com crescimento do PIB em torno de zero em 2014, saldo negativo de superávit primário, crescimento descontrolado da divida bruta, inflação elevada e com forças propulsoras presentes, etc, o conjunto de fatores negativos era e é preocupante, ainda mais quando se agrega a isto fatores políticos que evidenciam que a base de apoio político do governo, bastante fragmentada, tornou-se um elemento perturbador que se opõe às medidas pretendidas pelo nova equipe econômica.
Para complementar este quadro geral, temos a indústria nacional vitimada pela desindustrialização causada pela artificialização do preço da moeda americana no nosso mercado e um ambiente externo projetando os preços das commodities em queda.
O país perdeu sua atratividade no exterior para investimentos produtivos e mesmo para capitais especulativos a despeito da elevada taxa de juros ofertada, pois deixava em aberto o risco de um abrupto ajuste no preço do dólar, já que a moeda nacional estava sobrevalorizada.
Então, o Ministro Joaquim Levy falou que não desejava o preço do dólar artificializado. Ocorreu então o ajuste inicial forte no preço da moeda americana.
O entendimento colocado intensamente em nossos comentários era que tinha o claro objetivo de estimular a indústria, primeiro a reconquistar o mercado interno perdido para os concorrentes importados que assim ficariam mais caros e depois aumentando a sua competitividade externa a partir do fator preço, deixando um chamamento a mesma ao investimento focando a produtividade.
Adicionalmente, promoveria uma melhor remuneração aos produtores de “commodities” em moeda nacional, visto que os preços eram decadentes no mercado internacional.
E ainda, tornaria o país atraente aos capitais especulativos ao acabar com a sobrevalorização do preço da moeda nacional, já que a taxa de juro ofertada é elevada, o que naturalmente nunca foi dito, mas claramente subentendido.
E, este ponto sim enfatizado pelo Ministro Levy, o país ofereceria oportunidades para investimentos externos na infraestrutura brasileira, a grande e quase única janela de captação de recursos externos produtivos em grande volume.
A despeito da alta do dólar o esperado não vem acontecendo, pois o grau de confiança no governo continua baixíssimo, há o risco do país entrar em recessão colocando em risco o objetivo de obter um superávit primário de 1,2%, o que poderá retirar do país o grau de
investimento, e ocorreu o acirramento dos ânimos no campo político em oposição da sua base às medidas, com o agravamento adicional das questões em torno do LavaJato.
De repente, parece que houve um despertar ao entendimento de que os males presentes não decorrem da crise internacional como foi largamente utilizado como argumento e nem a seca, fato recente. Há problemas sérios estruturais que o governo vê como conjunturais.
É crescente o entendimento de que o Brasil é o único culpado pelos males do Brasil.
Já não devemos olhar as reservas cambiais como sustentáveis pelo critério de que paga tantos dias das nossas importações. Somos um país que não emite um meio de pagamento internacional e que temos um risco cambial bastante ampliado ultimamente e que atinge a cifra em torno de US$ 1,1 Tri. Evidentemente não se espera que todos saiam do país, mas um pequeno percentual é muito frente a uma reserva cambial de US$ 370,0 Bi sem qualquer chance de ser elevada na atualidade.
A oferta de “hedge” transformou-se num custo elevado, mas insinuar deixar de cumprir o compromisso do programa no mês de março da rolagem total foi um ato falho do BC, da mesma forma que é o silêncio em torno da continuidade de um programa, tendo em vista que tendo contrariado o principio de nada ser anunciado previamente no câmbio ao inicio do programa sujeita-se a continuar com este comportamento, e atualmente a situação não é menos premente do que em agosto de 2013.
É notório que há limites técnicos, que já há um volume excessivo colocado no mercado, mas o silêncio é fomentador de especulação clara e notória que ocorre no mercado de câmbio, com formação de preço afastado dos fundamentos, mesmo que estes não sejam alentadores no momento.
O BC agora precisa falar, sair do silêncio, mais do que agir, para serenar as expectativas, visto que a rigor não tem condições de interromper o programa de oferta de swaps, minimamente que seja para rolagem, sob o risco de ver o preço da moeda americana ter elevação expressiva num momento em que já dispõe de frágeis instrumentos de defesa.
Ainda não é o momento de realizar oferta de moeda ao mercado à vista, missão que vem sendo cumprida pelos bancos que assim evitam a presença do BC e a queima direta das reservas cambiais.
No contexto atual, onde já há a presença de especuladores, não pode haver erro na estratégia de condução e é preciso trabalhar sobre as expectativas para o mercado de câmbio, o silêncio acaba fomentando a alta do preço da moeda americana de forma especulativa.
É possível que o preço do dólar possa ir mais longe, mas não de forma inteiramente abrupta e emocional como vem ocorrendo, mas sim de forma gradual e racional.
O BC precisa se manifestar, “brincar com fogo” pode provocar especulação perigosa!