Alvaro Bandeira é economista-chefe e sócio do Banco digital modalmais
É fato que taxas de depósito e juros já estão negativos em alguns países por muito tempo. Estamos falando de taxas nominais e/ou reais. Podemos citar isso acontecendo em regiões como Japão, Zona do Euro, Suíça e outros países escandinavos; e também no BCE (BC europeu). Porém, também é fato que as preocupações com tal comportamento se acirraram muito nos últimos meses, originando artigos técnicos de diferentes economistas.
Agora mesmo, o BIS (Bank of International Settlements), o banco central dos bancos centrais, confirmou o que já vinha sendo estimado por profissionais da área financeira. Calcula-se que existam US$ 17 trilhões em títulos circulando no mercado com taxas negativas. Se essa pesquisa for para taxas reais negativas, então esse estoque ainda sobe bem mais.
A pergunta que não quer calar é: por qual motivo alguém aplicaria seus recursos por longo prazo com taxa negativas, se simplesmente poderia deixar em conta corrente, sem nada render. A explicação para taxas negativas pode estar no excesso de poupança girando no mundo, baixo crescimento global não estimulando novos investimentos, envelhecimento da população e menor propensão ao risco, inflação muito baixa e processos deflacionários podendo ocorrer associados com mudanças tecnológicas, que reduzem custos industriais ou da prestação de serviços, etc.
Já a vertente do porquê não deixar parado em conta corrente tem componentes mais complicadas e tem explicação no título desse artigo. Em um movimento típico de bolha, quem compra títulos pensa em vender o papel por um preço mais caro. Ou seja, quanto mais o retorno fica negativo, mais os preços dos títulos sobem. Isso lembra aquele histórica contada sempre nos mercados da venda da caixa fechada de bacalhau cada vez mais cara, até que alguém resolva abrir a caixa e constatar que o bacalhau está estragado. Mais recente podemos fazer alguma ilação com a operação conhecida como subprime, que foi a responsável pela derrocada do crescimento do mundo globalizado em 2007/2008 e quebra de instituições centenárias.
Ocorre que o momento é de bancos centrais tendentes para reduções de juros e/ou maior flexibilização, o que induz a compra de ativos. Isso significa que bancos centrais estão alimentando a demanda por títulos e os investidores simplesmente reagem a isso, em um movimento de feedback (retroalimentação) contínua. Se é isso, poderíamos estar sim sob um movimento de bolha que, em algum momento, pode ser estourada e o desfecho todos já conhecem.
Uma reviravolta nesse mercado poderia levar muitas empresas e países para grande dificuldade em saldar compromissos. Hoje a dívida global já deve estar rondando cerca de US$ 250 trilhões (ao final do primeiro trimestre, estava em US$ 246 trilhões, segundo o IIF – Institute of International Finance), ou algo como 320% do PIB global. Adicionalmente, entendemos que bancos centrais teriam muita dificuldade em domar essa situação, até por conta de taxas de juros no patamar em que se encontram na maior parte do mundo.
Reforçando isso podemos lembrar que, nessas últimas semanas, todos os movimentos feitos por bancos centrais foram no sentido da queda de juros ou de manutenção de políticas em vigor. A exceção dentre bancos centrais importantes fica por conta do BOE (BC inglês) com juros positivos em 0,75% (mas ampliando compra de ativos) e em declarações do Fed de que não lidam com a possibilidade de juros negativos, apesar de terem reduzido o patamar de juros para o intervalo entre 1,75% e 2%, com viés ainda baixista.
O Brasil tem nível de endividamento externo baixo. Nossa dívida externa bruta é estimada em US$ 323,6 bilhões. Nosso problema maior reside no endividamento interno ao redor de R$ 4 trilhões e déficit fiscal crescente, com reformas que demoram a serem concretizadas.
É por isso que batemos na tecla de que o Brasil tem urgência de se ajustar o mais rápido possível para, caso haja efetivamente uma bolha da renda fixa, estar em situação um pouco melhor.