O mercado do boi gordo tem trabalhado com pressão de baixa, influenciada por um cenário de escalas atipicamente confortáveis para o período de entressafra em boa parte das regiões.
O principal motivo dessas programações maiores são animais negociados a termo. O termo nada mais é que uma negociação antecipada com a indústria, definindo época do abate e os preços ou alguma referência, como diferencial de base ou ágio frente a um indicador de preços.
Vamos abordar alguns pontos do cenário atual.
Quanto o termo aumentou?
Considerando dados do IMEA para Mato Grosso, do 2º levantamento das intenções de confinamento em 2022, um quinto dos produtores entrevistados tinham feito contratos a termo até o momento da pesquisa (feita em julho e divulgada dia 15/8) e 1% havia travado as cotações na B3 (BVMF:B3SA3). Em 2021 o percentual de termo era de 1% e o da B3 de 7%.
No último ano, com a suspensão dos embarques para a China no segundo semestre, houve redução dos abates e pecuaristas muitas vezes não encontraram opções de venda do gado confinado.
Esclarecendo, para quem não é da área, que o gado confinado tem um período de “estocagem” bem limitado. Depois do peso de abate atingido, um prolongamento do tempo de confinamento é feito à custa de redução de desempenho zootécnico e econômico.
É culpa do tal do ciclo pecuário?
O cenário é de oferta crescente de categorias jovens e maior abate de fêmeas, características do momento de baixa do ciclo pecuário, mas há alguns pontos a serem citados.
Embora a oferta realmente esteja maior que em 2021, ela ainda está historicamente enxuta. Considerando dados oficiais de abates do primeiro trimestre e associando estes aos parciais do segundo, temos um aumento de 4,1% na quantidade de gado ofertada à indústria nesta primeira metade de 2022 (14,28 milhões), frente a 2021 (13,72 milhões).
A variação é até razoável, algo em torno de 560 mil cabeças, no entanto, esse aumento ocorreu sobre os piores abates desde 2009. Veja a figura 1.
Obs: para 2022 são dados preliminares do segundo trimestre. Fonte: IBGE / HN AGRO
Em outras palavras, a oferta de reposição melhorou e a de gado terminado também, mas não está chovendo boiadas.
O mesmo relatório recente de intenção de confinamento (IMEA) traz projeção de redução de 22,7% no volume de gado confinado, frente ao último levantamento de 2021, para aquele ano.
Paralisações de plantas
Na última semana, a JBS (BVMF:JBSS3) paralisou plantas em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Pará, o que gerou uma pressão adicional sobre as cotações, pelo remanejamento do gado que ia para uma ou outra unidade.
Em um cenário de escalas mais alongadas em plena entressafra, esse tipo de notícia trouxe a lembrança da pancada da suspensão da China em 2021, mas não estamos falando de algo parecido, nem de perto.
Enquanto em 2021 houve a suspensão das vendas ao nosso maior cliente, em um período no qual as exportações estavam acelerando, este ano foram meia dúzia de plantas mais focadas no mercado interno, cuja produção (gado) pode ser direcionada para outras.
Não estou dizendo que isso não impacta regionalmente o mercado, nem que o pecuarista se preocupar é bobagem, de forma alguma. Mas, em perspectiva, o que ocorreu em 2021 foi um outro patamar de relevância.
Outro ponto é que a paralisação de plantas não faz surgir gado a mais ou extingue a demanda por carne. Estamos em meados de agosto e a oferta de gado de cocho de novembro já está, ou não, em terminação.
Menos frigoríficos ativos diminuem a busca por gado em algumas regiões, mas um ajuste em plantas funcionando pode ajudar a enxugar o mercado de carne, melhorando a margem da indústria que não acessa China, por exemplo.
Caso essa melhoria de margem ocorra, tende a aumentar a busca por boiadas, por estes frigoríficos menores, mais voltados ao mercado interno e que, coincidentemente, costumam ter menos termo. A busca vai ser no spot.
Pensando em quem vende gado, ter mais plantas abatendo é melhor, isso não se discute. Mas esses ajustes repentinos podem ter desdobramentos inusitados, ainda mais quando estão associados a uma época de consumo doméstico mais forte.
Exportações
Segundo a Secex, nos primeiros dez dias úteis de agosto, o volume médio diário de carne bovina in natura embarcada foi de 8,9 mil toneladas, aumento de 7,6%, na comparação com agosto de 2021.
Projetando esta média diária nos 23 dias úteis de agosto, teríamos 204,2 mil toneladas no fechamento do mês. Os maiores volumes mensais já embarcados pelo Brasil foram 187 e 182 mil toneladas, respectivamente, em setembro e agosto de 2021.
Mercado externo segue forte e nos próximos meses temos as compras da China para o ano novo, além de algum efeito positivo da copa do mundo sobre a demanda do Oriente Médio.
Resumindo
O aumento do termo e o cenário do boi gordo pressionado das últimas semanas gerou um “degrau” na precificação do boi gordo. Essa queda em agosto não estava nas expectativas e ainda temos que acompanhar a dissipação das escalas, para que o mercado ganhe tração.
Dito isso, apesar de um patamar de preços inicial mais baixo para as altas, o cenário esperado ainda é de recuperação de preços para os próximos meses.