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Boi Gordo: É possível barrar as exportações de carne bovina? Entenda

Publicado 13.09.2022, 06:05
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Nos últimos dias surgiu a brilhante ideia de limitar as exportações brasileiras de carne bovina.

Por coincidência, ou não, tal medida foi tomada na Argentina diversas vezes, em níveis também variados. Aqui, vamos focar no que aconteceu a partir de 2006 na Argentina, quando o então presidente Nestor Kirchner suspendeu as exportações de carne bovina com a rasa justificativa de baixar os preços e conter a inflação no mercado doméstico.

O impacto esperado

Em uma teoria que só se sustenta em discurso, a ideia era que, ao limitar as exportações argentinas de carne bovina, sobrasse mais carne no mercado doméstico, que seria abastecido de maneira abundante e a população nunca mais se preocuparia com os preços da carne, com “asados” de segunda a segunda.

A realidade batendo à porta

Ao limitar uma via importante de escoamento, há um impacto negativo direto nos preços, o que afeta a viabilidade da produção pecuária (que é feita no pasto, não em uma planilha ou palanque).

Até aí, para quem não é da área, pode parecer que houve algum êxito na medida. Em um segundo momento ainda há o aumento das vendas de fêmeas, o que ainda retroalimenta a oferta por mais um período.

Aqui faremos um parêntese. Quando uma indústria resolve fechar as portas, seu maquinário, seus meios de produção, simplesmente param e são desativados, vendidos etc. Qualquer que seja o fim desses meios, eles não afetam a oferta do que a indústria produzia (carros, colheres, pias, ou qualquer coisa).

Como se já não fosse complicado o suficiente trabalhar dependendo de clima e da biologia, a pecuária ainda tem no descarte de seus meios de produção (vacas) o aumento da produção de carne.

Isso porque quando um produtor opta por vender fêmeas, para diminuir a produção ou mesmo sair da atividade, ele aumenta a oferta de carne no mercado, que já vinha em alta, afetando o retorno, resultando na decisão de deixar a atividade.

O “exemplo” argentino

Vejamos o que aconteceu na nossa vizinha, país de uma pecuária historicamente forte e tradicional.

As suspensões e limitações de embarques começaram em 2006. Nos anos seguintes, com o desinvestimento na atividade, com descarte de fêmeas, houve um aumento na oferta de carne, o que não durou.

Entre 2006 e 2010, as exportações de carne bovina diminuíram 58,3% e a produção de carne, desestimulada, cedeu 18,4%, com uma queda de 10,0% no rebanho bovino. Mesmo com o tombo das exportações, o consumo doméstico total do país diminuiu 11,4%.

Ou seja, não “sobrou” carne internamente porque a produção respondeu às incertezas de escoamento.

Nos últimos anos, com a demanda forte da China e uma produção ainda se recuperando (com alguns anos de respiro para o setor produtivo entre 2016 e 2019), o consumo doméstico perdeu espaço para um cliente ávido como a China.

Mais uma vez surgiu a solução mágica de limitar embarques de diversos produtos e atualmente as projeções são de uma inflação terminando 2022 em 95% no país.

Figura 1. Evolução das exportações argentinas de carne bovina, em mil toneladas, e da produção e consumo doméstico de carne, em milhões de toneladas.

Fonte: USDA / HN AGRO

Considerações

Voltando ao Brasil, a pecuária é feita de ciclos de oferta, que ocorrem em intervalos de três a quatro anos para cada fase (alta e baixa).

Estamos entrando em um momento de oferta maior de gado, o que tende a conter um pouco as cotações nos próximos anos.

A própria demanda chinesa deve trabalhar mais acomodada (em patamares elevados, mas sem os saltos do passado recente).

O que gerou esta oferta começando a aumentar aqui no Brasil foi justamente o investimento em produção feito nos últimos anos, quando as cotações tiveram um bom reforço do escoamento externo.

Em 2022, mesmo com recordes de exportação, a resposta de produção da pecuária foi suficiente para segurar as cotações, em uma perspectiva histórica.

Limitar as exportações pode até ter um efeito de barateamento do produto no curto prazo, talvez no horizonte de um mandato, mas às custas de desinvestimento e altas fortes em um segundo momento.

Isso sem pensar no impacto em geração de riquezas das cadeias relacionadas, mas isso seria abstração demais para responder o raciocínio barato inicial.

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