Desde que os humanos tiveram o primeiro contato com o ouro no Antigo Egito, cuja data é motivo de debate entre especialistas do tema, pessoas de todas as culturas e nacionalidades tornaram-se cada vez mais fascinadas pelo metal precioso que não corrói, não enferruja e nem é degradado pelo ar, por umidade ou por condições ácidas. Hoje, com o avançar do tempo e do desenvolvimento da tecnologia, podemos dizer que o bitcoin caminha para ser uma versão do ouro digital. E diversos argumentos sólidos sustentam a tese.
Começo a explicação do início: assim como no processo de extração do ouro, cada bitcoin depende de um alto custo para passar a existir. Ou seja, diferentemente do que muita gente imagina, bitcoins não são criados do nada, e sim demandam bastantes recursos físicos por meio de hardwares potentes que consomem energia para sua mineração.
Além disso, assim como o ouro não é uma commodity infinita, com dados de janeiro de 2022 estimando que sua quantidade total já extraída no planeta é de 205.238 toneladas, de acordo com o World Gold Council, o bitcoin também é limitado. Enquanto o ouro físico disponível já foi mais de 80% minerado, nosso ouro digital já se encontra na casa de pouco mais de 91% do total de 21 milhões de unidades.
Na verdade, não há necessariamente um limite de quanto ouro pode ser descoberto e minerado, e no fundo estas métricas são apenas estimativas. O que vemos na prática é que essas grandes descobertas de depósitos de ouro podem levar à inflação e desbalanços monetários, diferentemente do bitcoin que garante previsibilidade de sua quantia máxima, o que possibilita prevermos, também, quando teremos a mineração da última unidade.
No caso do bitcoin, por sinal, o aspecto da escassez se torna ainda mais forte com o passar do tempo, tendo em vista que o processo de “halving” corta as recompensas dos mineradores pela metade aproximadamente a cada 4 anos, além de a dificuldade de mineração alcançar constantemente novas máximas, demandando equipamentos mais especializados e tornando exponencialmente mais difícil produzir estes bitcoins.
Quando olhamos para trás, mais de um século antes do lançamento do bitcoin em 2009, o preço do ouro era de US$ 523,15 a onça em abril de 1915. Cem anos depois, enquanto o ouro era negociado a US$ 813 a onça, o bitcoin foi introduzido no mercado a preço 0 e, de lá para cá, alcançou ganhos exponenciais, chegando a valer quase US$ 70.000 ao final do ano passado. Enquanto isso, o ouro vale atualmente US$ 1.729. No último mês, por sinal, o bitcoin performou melhor não somente do que o ouro, mas também em relação às ações norte-americanas.
Curiosamente, ou não, em pleno cenário de adversidade macroeconômica, a correlação entre bitcoin e ouro voltou a atingir nova máxima dentro de um ano, reforçando a narrativa do ouro digital e aquecendo o debate.
Dentro os tópicos que vemos a comunidade debater, frisa-se que um eventual sistema monetário baseado em Bitcoin não deveria ser comparado com o padrão-ouro que entrou em colapso no século XX. Ainda que também tenha suas questões, alguns pontos merecem destaque:
- Como dito, assim como o aspecto de escassez do ouro com uma quantidade minerável finita, Satoshi Nakamoto fixou a quantidade máxima de Bitcoin em 21 milhões e cada bitcoin só pode entrar em circulação através, também, de um processo de mineração.
- Como qualquer moeda fiduciária nacional, o bitcoin também é divisível, e sua menor denominação é chamada de Satoshi (0,00000001 BTC)
- Semelhante ao ouro, o Bitcoin é altamente líquido. Além disto, é extremamente seguro a partir do uso da tecnologia blockchain, que elimina a intermediação de terceiros e não é controlado por uma autoridade central.
- O Bitcoin satisfaz – ou caminha para satisfazer - todas as funções básicas do dinheiro, como reserva de valor, unidade de conta e meio de troca. Esta é uma discussão ampla e profunda, e há muitos argumentos contrários pautados na volatilidade do ativo.
Embora este argumento contrário seja verdade, o BTC aumentou de valor mais do que qualquer outro ativo desde que surgiu no mercado. Vale lembrar que há um processo até que haja uma maturação do ativo para que passe a ganhar tração, exercendo tais funções econômicas da moeda. O próprio ouro sofreu fortes oscilações de preço nos últimos cem anos e, assim como o bitcoin, elas foram majoritariamente positivas. Em 1934, a onça do ouro saltou de US$ 20 para US$ 35 no mesmo, representando um aumento de 75%. Entre 1973 e 1980, subiu mais 700% e, dois anos depois, caiu 50%.
Esse processo é natural e, até lá, veremos a influência de agentes como governos, bancos centrais, legisladores e reguladores influenciando nas oscilações de preço do BTC. Raramente, ou arriscaria dizer que “nunca”, essas variações se deram por questões intrínsecas ao próprio bitcoin.
Voltando à nossa comparação com o ouro, por exemplo, vemos que ele só se tornou a base de um sistema monetário milhares de anos depois do primeiro contato humano. Até então, nunca havia sido usado como meio de troca no comércio até que o rei Croesus da Lydia, atual Turquia Ocidental, ordenou a cunhagem de ouro por volta do século VI a.C. para mostrar riqueza e poder. Essa motivação, por sinal, era comum em diversas civilizações antigas como os Incas, Astecas, Persas, Egípcios, entre outras.
Por outro lado, nem duas décadas se passaram desde a origem do Bitcoin em janeiro de 2009, e já vemos o forte crescimento de narrativas acerca de um “Ouro 2.0” ou de “um novo padrão ouro digital” por um número crescente de economistas, acadêmicos, mídia, profissionais do ramo, dentro outros. E, convenhamos, por motivações muito mais válidas.