O escritor e consultor empresarial Raj Sisodia, em recente passagem pelo Brasil, reiterou as críticas que, há bons anos, vem tecendo ao modelo atual de produção e condução dos negócios no mundo. Para ele, colocar interesses de acionistas acima de quaisquer outros objetivos acabou por nos aprisionar em um sistema que, com frequência, sacrifica a gestão humanizada e relativiza seu impacto na sociedade como um todo.
O resultado é colhido em muitas esferas, sob diversas formas: colaboradores em burnout, colapso do meio ambiente, mudanças climáticas extremas e miséria generalizada. Para resumir usando uma palavra recorrente no seu discurso, sofrimento.
Nascido na Índia, Sisodia é amplamente conhecido por ter criado um movimento chamado "Capitalismo Consciente", em 2010, ao lado do fundador da rede de supermercados multinacional Whole Foods, John Mackey. Apesar de conectados, o conceito ao qual quero me ater nasceu da parceria com outro norte-americano, o também escritor e coach executivo Michael Gelb.
Foi essa dupla, Sisodia e Gelb, que criou a ideia de "Healing Organization" ou, em português, "Empresa que Cura". Juntos, publicaram um livro sobre esse tema, que permeia e questiona o status quo corporativo através de estudos de caso de grandes organizações. O jogo como jogamos hoje não é sustentável no longo prazo, está obsoleto e precisa mudar, se quisermos continuar usufruindo dele.
Em sua pesquisa, os autores constataram que as marcas que se empenharam para amparar funcionários, clientes e comunidades no geral obtiveram mais retorno financeiro e social. Permita-me adiantar um pouco da conclusão (e, garanto, o spoiler não estraga uma eventual leitura): se, por um lado, os negócios causam muitas das aflições do planeta no século 21, por outro, também têm potencial para ser a solução da maior parte delas.
Especialistas já afirmaram que esta pode ser uma maneira eficiente de medir o sucesso de uma organização: pelo impacto que ela causa em ambas as esferas – micro e macro. Por definição, a empresa que cura tem um motivo que transcende a geração de lucro. Dinheiro não é sua única razão de existir. A operação só é válida quando capacita pessoas e entrega sua melhor contribuição a serviço de um senso de propósito maior. O tal impacto, então, é positivo.
As diferenças
Uma empresa tradicional enxerga uma lacuna no mercado como uma oportunidade de ganhar dinheiro. Uma instituição de mentalidade, cultura e prática mais avançadas, identifica a mesma demanda como uma chance de aumentar os lucros e, ao mesmo tempo, iniciar ações de responsabilidade social e corporativa para ajudar a mitigar qualquer impacto negativo que possa ser causado ao longo do caminho.
Como começar
Não existe fórmula secreta, é verdade. Mas empresas que curam têm pontos em comum que podem nortear os primeiros passos de outras. Trago três que julgo pertinentes:
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Adotar uma abordagem holística em cada projeto e na condução da organização, analisando o desempenho social, ambiental e financeiro simultaneamente – e não sequencialmente, como geralmente se faz.
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Manter um compromisso público e visível com objetivos tangíveis (iniciativas sociais e ambientais são bons exemplos). Isso cria orgulho, entusiasmo e otimismo entre os funcionários e outros stakeholders.
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Ampla colaboração. Nenhum dos desafios pode ser resolvido sozinho, especialmente os mais significativos. É preciso firmar parcerias com a sociedade civil, o campo das pesquisas e estudos e o governo.
Para encerrar, completo com um clichê: ter paciência e persistir – fazer o exercício de ouvir e honrar todas as partes interessadas para entender melhor os problemas, bem como participar da solução. O tempo é chave para que uma empresa de cura funcione e impacte positivamente e de fato.