A Petrobras (SA:PETR4) anunciou ontem altas relevantes nos preços nas refinarias tanto da gasolina quanto do óleo diesel e, com esta medida, deu um claro sinal que a política de preços que busca acompanhar a paridade com o mercado internacional está de pé e operacional. A alta veio em meio aos debates no Planalto e no Congresso para adotar medidas para mitigar a alta dos preços internacionais no mercado local.
Buscaremos nesse comentário tentar estimar o impacto final na bomba destas altas além de estimar os efeitos na inflação plena, o IPCA, e disto derivar percepções sobre a dinâmica dos juros no país. Antes de começar vale notar o tamanho da alta do preço do petróleo no mercado internacional. Apenas em 2022 o barril do Brent subiu 43,5% em dólares e o estrago só não foi maior em moeda local uma vez que o Real se apreciou fortemente neste ano fazendo que o barril subisse 30% em Reais.
A alta do petróleo tende a ser persistente – pelo menos durante três meses – uma vez que não há como imaginar uma resolução rápida para o conflito na Ucrânia e mesmo uma eventual alta da produção da Opep pode demorar a chegar nos mercados globais de maneira consistente. Contudo, vale lembrar que trabalhamos com a hipótese de que o barril tenha queda até o final do ano, uma vez que não acreditamos que a guerra no Leste Europeu se estenderá de maneira indefinida.
Há grande dose de especulação neste nosso cenário, mas é importante lembrar que provavelmente estamos no auge da inflamação desta crise militar, econômica e social. Dito isto, vamos nos debruçar sobre o impacto das altas anunciadas na ponta final do consumidor e para os caminhoneiros.
Segundo o último boletim que encontrei sobre a formação de preço dos combustíveis da Petrobras que data do dia 19 de fevereiro de 2022, a composição do preço da gasolina e do diesel por litro eram o que seguem:
GASOLINA
ICMS | R$ 1,75
Distribuição e Revenda | R$ 0,92
Custo Etanol Anidro | R$ 0,86
CIDE e PIS/PASEP e COFINS | R$ 0,69
Realização Petrobras | R$ 2,37
DIESEL
ICMS | R$ 0,79
Distribuição e Revenda | R$ 0,63
Custo Biodiesel | R$ 0,65
CIDE e PIS/PASEP e COFINS | R$ 0,33
Realização Petrobras | R$ 3,26
Levando em conta estes dados partimos para as aproximações. A primeira é estimar as alíquotas aplicadas do ICMS de um lado e da CIDE, PIS/PASEP e COFINS do outro. Foram tantas as mudanças nestas taxas e impostos que vamos tentar estimar o quanto a Petrobras implicitamente calculou nestes números apresentados. Assumindo que eles descriminaram os impostos, podemos deduzir que estes impostos foram calculados sobre os valores da Distribuição e Revenda + Custo Etanol Anidro (ou Biodiesel no caso do Diesel) + Realização Petrobrás. Assim sendo temos que as alíquotas dos impostos são, no caso da gasolina de 42,17% para o ICMS e de 16,63% para os demais, já no caso do Diesel as alíquotas foram de 17,4% para o ICMS e de 7,27% para os demais tributos.
Tendo isso em mãos, vamos começar a tentar projetar com as seguintes premissas, a saber:
i-) A alta da porção da Realização Petrobras (SA:PETR4) será na integralidade da alta anunciada, ou seja, de 24,93% para o Diesel e de 18,77% para a Gasolina;
ii-) Sabemos que tanto o Etanol Anidro quanto o Biodiesel andam junto com o preço das refinarias, mas vamos assumir de maneira conservadora que a alta destes componentes seja apenas de 30% da alta anunciada na Realização Petrobras, e por fim;
iii-) Iremos assumir uma alta de apenas 1% para os custos de Distribuição e Revenda.
Aplicando as premissas acima descritas com as alíquotas calculadas, chegamos na seguinte alta estimada na ponta final para os consumidores:
GASOLINA: 11,60% (contra um reajuste nas refinarias de 18,77%)
DIESEL: 18,34% (contra um reajuste nas refinarias de 24,93%)
Agora, vamos nos voltar para o IPCA e aplicar as altas encontradas em relação ao peso destes no índice de inflação. Levando em conta que o peso da gasolina no IPCA é de 6,58% e do diesel de 0,24%, a alta ponderada da gasolina será de 76 pontos base e do diesel de 4 pontos base, ou seja, o impacto total das altas anunciadas hoje será de 80 pontos base. Neste sentido vamos supor que você tenha projetado um IPCA de 5% em 12 meses sem considerar a alta da gasolina e do diesel, neste caso você teria que rever para 5,80%.
Nossa projeção hoje para o IPCA está em 6%, mas muito provavelmente iremos rever para 6,5% ou mais. Vale lembrar que calculamos exclusivamente o impacto da alta na Gasolina e no Diesel, não levamos em conta os efeitos difusos da alta dos combustíveis no resto do tecido econômico.
A alta anunciada hoje foi mais forte que o mercado esperava (entre 8 a 10% para a gasolina) e neste sentido devemos ver revisões nas projeções dos economistas.
Agora, entramos numa questão mais sutil desta alta e que envolve aspectos sociais. Em primeiro lugar, é preciso notar que haverá um custo claro na popularidade do presidente a alta da gasolina e do diesel, mesmo que não seja culpa dele diretamente este descontrole dos preços. Do ponto de vista político tanto faz, a população irá responsabilizar alguém e geralmente é o presidente o alvo do desconforto popular. Sendo assim, é possível que vejamos medidas do Planalto em tentar mitigar o mal-estar com a população e alguma coisa deve ser anunciado em breve, seja uma política de subsídio ou mesmo mais gastos públicos em transferências.
O segundo ponto que nos chama atenção e que devemos monitorar com atenção é uma eventual greve dos caminhoneiros. Aparentemente a classe dos caminhoneiros é aliada do presidente e neste sentido não devemos ter nenhuma greve generalizada, mas se a elevação dos preços indica algo é sim a possibilidade de greve. Vejamos os números.
A greve dos caminhoneiros de 2018 começou dia 21 de maio. A alta em 12 meses até essa data havia sido de 25,47% e, levando em conta os últimos dados, a alta acumulada nos últimos 12 meses é de 32,46%. Se eu estiver certo sobre a alta estimada do diesel de mais 18,34% em cima desta alta de 32,46% haverá uma forte fonte de estresse sobre a classe dos caminhoneiros e da sociedade de maneira geral.
Sabemos que movimentos sociais são um fenômeno complexo e preços por si só não dizem nada, contudo é necessário ficarmos atentos, o Planalto vai ter que fazer algo, agora exatamente o que não sabemos.
Em tempo: revisamos esta semana a SELIC para 13,25% ao final do ciclo, não iremos rever por ora.
*Publicado originalmente nos canais da Necton Investimentos