No clássico mercado de baixa do petróleo, a Opep nunca vence no primeiro round.
Quem conhece o modus operandi do cartel não ficou nada surpreso com o resultado da reunião de abertura de ontem, em Viena, onde 23 países produtores de petróleo estão tentando encontrar uma solução para a mais recente derrocada dos preços do petróleo.
Após um breve repique, tanto o Brent quanto o WTI acabaram fechando o dia em queda, com os vendidos intensificando os efeitos do choque de demanda provocado pelo coronavírus da China, mesmo depois de a Opep sugerir que poderia realizar mais um corte de 1 milhão de barris por dia (bpd) na oferta. Resultado: 1 x 0 para os vendidos no petróleo contra a Opep.
Perdendo agora, na esperança de ganhar mais tarde
Perder não é uma novidade para a Opep. Com exceção de alguns membros inclinados à teatralidade, é comum que os países produtores de petróleo e seus ministros de energia, sob a liderança inquestionável da Arábia Saudita, pintem um quadro de surreal tranquilidade, mesmo em uma crise.
Apesar de ter que trabalhar mais atualmente do que há 40 anos para influenciar o mercado, a verdade é que a Opep acaba conseguindo, com o tempo, obter o preço que deseja para o petróleo através da restrição de oferta, sem se importar com as críticas de que se tornou irrelevante para a era moderna das negociações da commodity.
A forma como a Opep atua é quase sempre a mesma: caos total e discórdia no primeiro dia; no segundo, incrível e repentina solidariedade; logo em seguida, anúncio de racionamento do produto, provocando uma alta do mercado, ainda que ligeira.
Assim, conforme nos aproximamos do segundo dia da reunião da Opep – que desta vez é uma “reunião técnica” entre os 13 membros originais do cartel liderado pela Arábia Saudita e 10 aliados sob os auspícios da Rússia –, não seria demais esperar mais do mesmo da velha e desgastada cantilena do grupo.
Também não devemos ficar surpresos em ouvir, antes do fim do dia, o ministro de energia da Arábia Saudita, Abdulaziz bin Salman – que não está na reunião, mas obviamente a está acompanhando em tempo real através das informações dos seus representantes –, tentando assumir o controle da narrativa perdida na terça-feira.
Desde que iniciou seu mandato à frente do ministério, após o ataque terrorista de setembro contra instalações petrolíferas do seu país, o príncipe Abdulaziz concluiu a quase impossível abertura de capital da petrolífera estatal Saudi Aramco (SE:2222). Antes mesmo da atual crise, o ministrou saudita anunciou, em dezembro, um ambicioso corte de produção da Opep+, que poderia retirar do mercado 2,1 milhões de bpd, ou 2,1% da oferta mundial – uma promessa que ajudou os preços do petróleo a encerrar 2019 com sua maior valorização em três anos.
O desafio agora é diferente para a Opep
Mas a epidemia de coronavírus gera um problema totalmente diferente para o príncipe saudita.
Como dissemos no artigo de ontem, ao contrário das quedas passadas do petróleo, quando o excesso de oferta sempre era o problema, a crise atual do coronavírus tem mais a ver com a demanda ou, melhor dizendo, com a falta dela.
Do ponto de vista saudita, a demanda anêmica faz com que haja excesso de petróleo no mercado, não deixando outra alternativa ao reino a não ser cortar ainda mais a produção.
Mas a derrocada atual dos preços é diferente da ocorrida durante o crash de três anos provocado pelo shale oil dos EUA, que teve início em 2014 a partir do excesso de óleo barato.
A demanda petrolífera está desaparecendo a uma taxa aterrorizante, tudo por causa de uma fonte, a China, que é a maior compradora da commodity.
Muitos números foram citados nas últimas 48 horas sobre o impacto na demanda da China, desde estimativas de uma queda diária de 3 milhões de barris, ou 20% do seu consumo, até o fechamento completo de quase metade das 40 refinarias independentes do país.
Opep atira no escuro, tentando conseguir um resultado mágico
Mas a verdade é que ninguém sabe quão grave pode ficar a situação na China.
Embora o primeiro dia de uma reunião da Opep raramente dê resultado, o fato de o petróleo ter fechado a terça-feira em queda, depois de um repique inicial, diz bastante sobre o que o buy-side do mercado descobriu e que a Opep ainda não entendeu.
E o que o cartel ainda não entendeu é que se trata de uma crise de demanda, e não de oferta. A Opep ainda parece estar fixada na ideia de que o problema é o contínuo excesso de abastecimento do qual ela pode se desvencilhar.
Sem uma indicação concreta do quão grave pode ficar a queda de demanda petrolífera na China, a verdade é que a Opep está atirando no escuro, ao dizer que vai cortar “x” barris de petróleo.
O temor do mercado é que, no fim das contas, os esforços da Opep não sejam suficientes, e a demanda chinesa despenque ainda mais do que o cartel prevê.
Mas é difícil criticar a Opep pelo que ela está fazendo, porque não existe nenhum outro truque para fazer o mercado voltar a subir a não ser provocar o racionamento do produto.
A melhor esperança da Opep é reduzir a oferta de petróleo até atingir o equilíbrio com a demanda mundial e chinesa.
Portanto, a palavra mágica que o cartel está buscando basicamente é: equilíbrio.