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Ao Planejar Novos Cortes, Opep Pode Estar Ignorando seu Maior Adversário: Trump

Publicado 03.12.2019, 11:54
Atualizado 02.09.2020, 03:05
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Em “O Plano Perfeito”, o renomado romancista Sidney Sheldon conta a história de um protagonista tão cego pela ambição que não consegue ver um adversário capaz de acabar com seus planos. Talvez fosse interessante que o ministro do petróleo da Arábia Saudita, Abdulaziz bin Salman, lesse esse livro, pois ele pode estar cego para um inimigo que está bem diante dos seus olhos: o presidente dos EUA, Donald Trump.

Depois de várias reuniões tête-a-tête com pessoas de confiança e influenciadores na Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), Abdulaziz aparenta estar pronto para convencer os outros membros e aliados do cartel de que é preciso aprofundar os cortes de produção em vigor, durante a cúpula de dois dias que terá início na quinta-feira.

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Em dezembro de 2018, a Opep+, grupo mais amplo que inclui a Rússia como aliada estratégica, firmou um pacto para reduzir sua oferta em 1,2 milhão de barris por dia (bpd), a fim de impulsionar os preços do petróleo, que estava nas mínimas de 18 meses, isto é, abaixo de US$ 50 por barril de Brent, referência mundial do petróleo. Em julho, quando o Brent já valia em média US$ 65, a Opep+ concordou em estender o pacto até março de 2020.

Na semana passada, o Brent estava cotado acima de US$ 62 por barril, bem abaixo da máxima de abril a U$ 75, mas ainda com uma valorização de 12% no ano. Até a última sexta-feira, tudo o que os investidores sabiam era que a Opep+ iria se reunir no dia 6 de dezembro, um dia depois da reunião exclusiva dos membros do cartel, a fim de discutir outra extensão de três meses, cujo objetivo seria dar suporte aos preços.

Novos cortes da Opep geram choque sísmico no mercado

Isso aconteceu antes do choque sísmico ocorrido no mercado na segunda-feira, em razão de notícias de que a liderança da Opep, protagonizada pelos sauditas, estaria cogitando um corte de 1,6 milhão de bpd – 400.000 barris a mais do que o corte anterior.

Até a semana passada, Abdulaziz estava tendo dificuldade para fazer com que os membros da Opep até mesmo honrassem o pacto de 2018, haja vista que “violadores em série”, como Iraque e Nigéria, vinham persistentemente superando suas cotas de produção.

Essa não era sua única dor de cabeça. O ministro do petróleo da Rússia, Alexander Novak, chegou a sugerir que a Opep+ esperasse até abril, um mês após a expiração do atual pacto, para deliberar sobre uma extensão. Novak claramente demonstrou estar disposto a não fazer nada além de rolar o pacto por mais três meses. Mas agora Abdulaziz trabalha para elevar os cortes em um terço, e seus planos parecem contar com um número considerável de apoiadores dentro da Opep, inclusive do Iraque.

No momento em que escrevo, não se sabe ainda se a Rússia apoiará essa última jogada saudita. Como ressaltei ontem, o auxílio de Moscou tem sido essencial para as iniciativas da Opep no sentido de elevar os preços do petróleo desde 2016.

Independente do que a Rússia decidir, uma coisa parece certa: é bem provável que Trump não fique nada feliz com qualquer corte adicional da Opep, tal como aconteceu nos cortes passados do cartel.

E um Trump descontente com a Opep também pode causar problemas para o grupo, como já aconteceu antes.

Arábia Saudita quer que a Aramco cause uma “boa impressão”

Apesar de Abdulaziz ter surpreendido o mercado com seu último movimento, não é segredo para ninguém por que ele fez isso. De acordo com a Reuters, sua intenção era causar uma “boa impressão” para a Aramco, petrolífera estatal do país, cuja oferta inicial de ações deve ter seu preço anunciado na quinta-feira, mesmo dia da reunião da Opep.

Embora o objetivo saudita fosse compreensivo, é preciso também não perder de vista o mais importante para Trump.

Apesar da proximidade do presidente norte-americano com a família real saudita, Trump se opõe à manipulação de mercado da Opep, pois o petróleo caro pode elevar os preços da gasolina nos EUA, o que, por sua vez, pode prejudicar a economia do país e possivelmente reduzir suas chances de reeleição em 2020.

Mas por que Trump deveria se preocupar com a Aramco?

Nas palavras de John Kilduff, especialista em política do petróleo e sócio fundador do hedge fund de energia Again Capital, de Nova York:

“Os sauditas querem que a Aramco faça uma excelente oferta inicial de ações. É compreensível. Mas você realmente acredita que Trump se preocupa mais com eles do que com sua reeleição em 2020?”

Como afirmou John Kemp, analista de petróleo da Reuters, em seu blog em maio: “o presidente calcula, corretamente, que o voto marginal em sua coalizão eleitoral em 2020, tal como em 2016, virá de um motorista do Midwest, e não de um perfurador de poços petrolíferos no Texas".

Kemp afirma ainda que Trump “arrisca perder mais votantes por causa de uma alta, e não de uma queda, nos preços dos combustíveis”.

Isso explica por que Trump gastou tanta energia brigando com a Opep às vésperas das eleições americanas de meio de mandato em novembro de 2018.

Trump pode voltar a considerar isenções ao Irã...

No ano passado, Trump investiu primeiro contra a família real saudita, no intuito de fazê-la elevar a produção antes das eleições de meio de mandato, proporcionando algum alívio imediato graças ao petróleo mais barato. Em seguida, o mandatário americano concedeu isenções a importadores do petróleo iraniano, inundando o mercado com mais oferta. Só esse movimento devastou 40% dos preços do petróleo em apenas dois meses.

É pouco provável que Trump consiga fazer isso novamente com a cooperação dos sauditas. Mas se realmente houver uma restrição maior da oferta mundial de petróleo por conta dos cortes adicionais da Opep, o presidente americano pode sinalizar novamente que está pronto para considerar isenções às sanções iranianas ou mesmo um acordo diplomático com a República Islâmica, apesar das hostilidades entre ambos os lados neste ano.

Como afirmou Kilduff:

“Com Trump, tudo é possível. Basta imaginar para ele fazer.”

... Ou ele pode voltar a tuitar sobre o petróleo

Outra coisa que Trump sabe fazer muito bem é tuitar reclamando dos preços altos do petróleo e dos danos que isso pode causar à economia norte-americana e mundial.

Um tuíte típico dele seria como esse: “Os preços do combustível estão altos, e eles estão fazendo pouco para ajudar. Essa deve ser uma via de mão dupla. REDUZAM O PREÇO JÁ!”

Não há dúvidas de quem Trump reclama ao usar “eles” em uma frase sobre os preços altos da energia: Opep.

Embora seja difícil quantificar o impacto de longo prazo desses tuítes nos preços do petróleo, em algumas ocasiões, o Brent e o WTI chegaram a cair 2% ou mais em um único dia após manifestações assim de Trump no Twitter.

Guerra comercial ajuda Trump a manter o petróleo em baixa

E o presidente dos EUA também pode continuar pressionando para baixo os preços do petróleo ao simplesmente prolongar sua interminável guerra comercial com a China, cujos efeitos continuam pesando bastante sobre a economia mundial e o sentimento do mercado de energia. Neste momento, um tuíte negativo de Trump sobre a China também acaba sendo negativo para o petróleo.

Não é possível saber quando Trump direcionará toda a sua atenção à briga contra a Opep, mas uma aposta segura seria quando os preços nas bombas de combustível chegarem perto de US$ 3 por galão. Há meses que a média nacional da gasolina não ultrapassa US$ 2,60, de acordo com a Associação Automotiva America, o que explica por que o mercado petrolífero continuou no radar do presidente por um bom tempo.

Não nos esqueçamos do shale e da produção fora da Opep

E pode ser que Trump nem precise brigar tanto assim, principalmente se o rali no petróleo voltar a estimular outro grande pico de produção nos EUA, provocando a reversão do movimento de alta do mercado.

O shale, bastião da produção petrolífera norte-americana, pode ter desacelerado neste ano, mas continua ajudando o país a gerar o recorde mundial de 12,9 milhões de barris por dia.

Como sugeriu uma reportagem da Bloomberg na segunda-feira, a Opep está fazendo uma aposta ousada de que 2020 marcará o fim da era de ouro do shale, na medida em que os produtores norte-americanos não param de fazer cortes. Mas, como também ressalta a reportagem, a produção fora da Opep não para de crescer no Brasil e na Noruega, gerando novas dores de cabeça para o cartel.

Em suma, Abdulaziz e a Opep têm muitos adversários, sendo o principal deles Trump, que não pode passar despercebido pelo cartel.

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