Nos últimos dias ocorreram algumas mudanças significativas no ambiente político-econômico do Brasil.
No plano social, o repique da pandemia colocou-nos sob uma onda de desalento e temor como nunca experimentada. A queda continuada da mortalidade, durante o segundo semestre do ano passado, tinha acendido uma chama de esperança, cuja apagão recente está difícil de ser digerido. Passamos de 300 mortes diárias para mais de 3 mil e o pior está por vir.
Felizmente, ainda que o ritmo de vacinação seja lento, a expectativa de uma reversão da mortalidade nos próximos meses é viável, pois o grupo de risco maior estará imunizado: já se observam ganhos animadores nos estratos já vacinados. Mas os jovens continuariam a se contaminar, lotando os hospitais, o que exigirá a manutenção de um isolamento indispensável, mas prejudicial à geração do PIB deste ano.
Ajudaram bastante a construir um futuro mais alvissareiro duas manifestações desta semana: primeiro, o manifesto de economistas e empresários a favor da racionalidade perdida no combate à pandemia, registrando um consenso raramente presente neste grupo e demonstrando que a sociedade não tolerará mais irresponsabilidade perante o trágico desafio que enfrentamos; em sintonia, acrescente-se o pronunciamento do Presidente Jair Bolsonaro em cadeia de TV, quando, mesmo ao custo de renegar posições do passado sem passar recibo, Bolsonaro encampou uma postura mais científica no enfrentamento da pandemia, que será importante para acelerar nossa saída desta crise a médio prazo.
O mapeamento desta nova atitude construtiva sobre o econômico é positivo. No plano estrutural da economia, o desgaste do Executivo fragilizava a perspectiva de aprovações modernizantes, acalentada a partir da mudança do comando do Congresso, pois o seu aliado principal, o Centrão, é movido a expectativa de votos. E um presidente minguante soava o alarme de que poderia estar chegando a hora de desembarcar da canoa furada. A partir da nova postura do Presidente, a esperança de avanços estruturais é preservada e se soma à queda de mortalidade projetada para reverter clima de desalento em breve, ainda que com um PIB capenga.
Lamentável, entretanto, a posição assumida pelo Banco Central, na última reunião do Copom. Alegando que a economia pode estar-se aquecendo demais, contratou uma alta de 75 por cento na taxa Selic até maio. Ora, a alta dos preços de alimentos e a desvalorização cambial impõem uma perda de renda real significativa sobre a maioria da população, que, com o pacote de auxílio, o Governo mitigará parcialmente. Porém, ao subir a taxa Selic com truculência, o sinal que fica é de um Governo que pisa no breque e no acelerador ao mesmo tempo, consumindo energia para nada, justamente quando os preços no atacado vêm exibindo uma perda de aceleração irretorquível. Pior: combater pressão de oferta com elevação de juros mais eleva o déficit fiscal do que produz resultados. E joga o empresariado, já há tempos no purgatório, nas labaredas do Inferno, imprensado entre custos de produção afetados pela pandemia, juros punitivos e demanda anêmica.
Paradoxo doloroso: no mesmo dia, o banco central americano, mesmo que pressionado pelo mercado a subir juros em um cenário muito similar ao nosso, manteve constante o de curto prazo, atendo-se aos ensinamentos da boa Economia. Aqui, ao contrário, submetemo-nos às projeções da Faria Lima, na busca de uma ilusória ancoragem. Para se alinhar ao espírito do mercado, o Banco Central agravará um desaquecimento já em curso, para combater uma inflação que já está perdendo vigor e que é inelástica à ação dele a curto prazo. E, na dinâmica, erodindo uma credibilidade construída por uma gestão até aqui exemplar.
Repare como é difícil a vida de quem avalia a conjuntura brasileira: chamaria de louco quem me dissesse há 15 dias atrás que eu estaria hoje escrevendo uma nota elogiando a atitude de estadista de Bolsonaro perante a pandemia e criticando a postura oportunista do Banco Central na condução da politica monetária...