O câmbio no Brasil, em tempos recentes, mudou drasticamente de rumo em relação ao que vinha fazendo no início de 2022. O real, que vinha se valorizando com força contra o dólar, reverteu o sentido e amarga duras perdas em pregões recentes, atualmente passando da casa dos R$5,10.
Ao passo que isso se traduz em perdas colaterais nos mercados de renda variável e renda fixa prefixada, em função de juros mais altos, o movimento pode aliviar ou mesmo favorecer quem investe de forma global e passiva, com ETFs dolarizados de baixo custo ou BDRs de ETFs negociados diretamente nos Estados Unidos.
A razão disso é simples: esses ativos trazem, além do próprio retorno, o rendimento da divisa americana em relação a moeda nacional. Isso explica, em parte, a razão para 2020 ter sido um ano excepcional para ativos dolarizados – e, por favor, não confunda isso com empresas que fazem negócios em dólar.
Desse modo, quedas mais bruscas na cotação do ativo costumam ser corrigidas, em prazos diferentes, por altas no preço do dólar que aliviam, no Brasil, o tamanho da perda e reduzem o grau de volatilidade total. Por volatilidade, entenda-se o tamanho das variações para cima ou para baixo no curto, médio e longo prazo.
Dólar não é desculpa para investir ativamente
É importante deixar muito claro que o efeito cambial não é nem deve ser tomado como uma razão para investir ativamente em ações estrangeiras ou BDRs de empresas listadas no exterior. A literatura acadêmica e os dados de mercado são unânimes em mostrar que investir ativamente (montar a própria carteira) quase certamente te levará a um resultado pior que a média do mercado, mas correndo riscos muito maiores de perda total ou irrecuperável.
A teoria financeira moderna diz e as evidências comprovam que riscos diversificáveis não são premiados nem possuem expectativa positiva de retorno. Em outras palavras: você não tem rendimento adicional por riscos que não precisa correr, como o de uma empresa, setor ou país específico. Você pode ter rendimentos mais altos por isso, mas esse resultado depende da sorte, não da capacidade individual ou coletiva de ver “o que não foi visto”.
Por isso mesmo, a melhor opção para quem gostaria de investir em renda variável é buscar exposição global através de um ETF de baixo custo com alto grau de diversificação, como o Trend ETF MSCI ACWI Fundo de Índice (SA:ACWI11) ou Investo FTSE Global Equities ETF FDI (SA:WRLD11)}}). Para quem investe diretamente no exterior, uma opção interessante é o Vanguard Total World Stock Index Fund ETF Shares (NYSE:VT) ou equivalente. Ao se expor ao risco do mercado acionário mundial, você assume apenas o risco sistêmico, que é aquele que precisa ser premiado.
Fatores de risco ampliam diversificação
Alguns fatores de risco são amplamente aceitos pela comunidade científica e mostraram-se persistentes no longo prazo, como as empresas small cap, com múltiplos de preço mais baixos e perspectivas de crescimento menores. Os dados são mais robustos para economias avançadas e podem ser capturados com ETFs de baixo custo, com alto grau de diversificação, para ampliar a chance de retornos superiores à média.
Entretanto, é fundamental ter a ciência de que são fatores de risco e não garantias de retorno mais alto. O que quero dizer com isso é que é perfeitamente possível que você acabe tendo um retorno menor que a média, pois esses fatores aumentam o risco da carteira. Apesar de terem um potencial positivo, isso só ocorre porque existe um risco que pode ou não se pagar no longo prazo.
No caso, para se expor a esses fatores, nós partimos de uma carteira globalmente diversificada e aumentamos o peso de ETFs focados nos prêmios, digamos, de small caps e empresas de valor. Por exemplo, com um portfólio que tenha 70% mercado total global, 15% small caps e 15% large caps de valor.
Os riscos do câmbio em países emergentes
Considerando os pontos levantados até aqui e o fato de que, historicamente, mercados desenvolvidos tem um retorno muito mais atraente, faz sentido questionar se não seria o caso de ter toda a renda variável em dólares. Isso nos traz a questão dos riscos específicos de países emergentes, como no caso do Brasil.
Apesar de nossa moeda tender a se desvalorizar frente ao dólar, no médio e longo prazo, nossa condição periférica do ponto de vista da cadeia produtiva global nos coloca sob risco de sanções ou políticas cambiais que podem afetar, negativamente, o preço do dólar. Incluo aqui políticas de congelamento cambial ou desapropriação de ativos atrelados a moeda estrangeira.
Isso faz com que, apesar de financeiramente muito mais atraente, investimentos atrelados ao dólar carreguem consigo riscos macroeconômicos que não existem em economias avançadas. Um exemplo simples e didático, embora distante, é dos ativos dolarizados da Rússia que estão atualmente congelados, com rumores de uma possível expropriação.
Um cenário muito mais próximo da realidade brasileira é de uma mudança na moeda ou na política cambial. É válido notar que o real surgiu em 1994 e que ao longo do século XX tivemos vários planos monetários (e moedas), com direito a inflação superando 1000 por cento ao ano em alguns momentos. Essa instabilidade monetária, assim como política, pode gerar perdas totais ou bastante intensas no caso de investimentos atrelados a cotação do dólar.
A solução, com isso, é buscar um grau de diversificação que pode ser tanto entre índices acionários nacionais e globais, como reduzindo a exposição total a renda variável. No primeiro caso, o grande problema é o histórico ruim do Ibovespa e dos riscos altíssimos de fazer ou pagar por uma gestão ativa de ações. No segundo caso, tem-se que abrir mão de ganhos potencialmente muito altos caso os piores cenários não se concretizem.