Este artigo foi escrito exclusivamente para o Investing.com. Publicado originalmente em inglês em 21/05/2021
- Tsunamis inflacionários
- Madeira serrada atinge máximas incríveis
- Paládio registra nível recorde
- Ascensão do cobre é de tirar o fôlego
- Outros mercados de matérias-primas – alguns retardatários para ficar de olho
O presidente do Fed e a Secretária do Tesouro americano não param de dizer que as pressões inflacionárias registradas recentemente nos índices de preço ao produtor e consumidor são “transitórias”. É impossível deixar de considerar, contudo, que a economia é uma ciência social. As fórmulas de mensuração da economia são tão boas quanto suas variáveis. Embora vários economistas possam discordar, vejo a econometria como uma arte, e não como ciência. Também é uma ferramenta capaz de validar medidas fiscais e monetárias de acordo com uma dada agenda política, e não econômica.
Série Especial – Inflação nos EUA: a Batalha entre Fed e Mercado
Embora tenha crescido a pressão para que o Fed reconheça que a alta dos preços das commodities e ativos esteja validando a subida da inflação, Powell, presidente do Fed, não só chamou as condições econômicas de “transitórias”, como disse que o pleno emprego é necessário para que o banco central “comece a pensar em pesar sobre” em reduzir as compras de ativos ou aumentar os juros de curto prazo. À medida que sobem os preços dos ativos, também aumenta a pressão sobre o banco central e o tesouro americano. No dia 4 de maio, a secretária Yellen disse aos mercados que os juros podem ter que subir, mas logo retificou essa declaração no dia seguinte, qualificando as pressões inflacionárias como “transitórias”. O termo deve entrar para a história, juntamente com outras expressões favoritas do banco central, como a “euforia irracional” citada por Alan Greenspan.
O relatório de empregos de abril nos EUA tirou parte da pressão sobre o Fed, já que os números de vagas criadas foram de apenas 266.000, bem abaixo das expectativas de mercado, e a taxa de desemprego subiu para 6,1%. Entretanto, os preços das commodities continuam mostrando que as pressões “transitórias” estão atingindo níveis bastante perigosos para a economia. A inflação desenfreada é extremamente difícil de conter. Os dados do IPC da semana passada foram de 0,8%, em comparação com a expectativa de 0,2%.
Ainda que os economistas estejam confiantes de que podem gerenciar as pressões com instrumentos de política monetária, não há garantia disso. Ademais, foram medidas fiscais e monetárias que criaram as atuais pressões inflacionárias, assim como aconteceu no período de 2008 a 2012, durante a crise financeira global.
Albert Einstein afirmou que a definição de insanidade é continuar fazendo a mesma coisa e esperar um resultado diferente. A pandemia de 2020 é um evento muito diferente da crise financeira de 2008, mas os instrumentos para estabilizar a economia têm sido os mesmos. A única diferença é que o volume de 2020 superou em muito os níveis utilizados em 2008.
Tsunamis inflacionários
Com uma taxa de US$ 120 bilhões por mês em compras de dívida e juros básicos entre zero e vinte e cinco pontos-base, o banco central americano criou um tsunami de liquidez nos mercados financeiros. Os gastos governamentais trilionários para estabilizar a economia durante a pandemia atingiram níveis sem precedentes. Se bem que as vacinas estejam criando imunidade de rebanho contra a Covid-19, os gastos e o fluxo de liquidez continuam inundando o sistema financeiro. As cotações são espantosas, e o debate político de como lidar com a fatura perdurará por vários anos, talvez décadas. A dívida pública americana está atingindo o patamar de US$ 30 trilhões. O Índice Dólar está flertando com o nível de 90, apresentando viés de baixa novamente, na medida em que as medidas monetárias e fiscais afetam o poder aquisitivo. Como o dólar é a moeda de reserva do mundo, a ascensão dos preços das commodities nos diz que todas as moedas fiduciárias estão perdendo valor.
Aumentam as pressões inflacionárias, mas o Fed segue dizendo que não é hora de “pensar em pensar sobre” aumentar os juros de curto prazo ou encerrar o afrouxamento monetário (quantitative easing). O comportamento dos preços nos três mercados atingiu recentemente máximas históricas, alertando que a inflação pode não ser tão "transitória" assim.
Madeira serrada atinge máximas incríveis
Antes de 2018, os preços futuros da madeira serrada nunca superaram US$493,50 por 1000 pés-tábua.
Fonte: CQG
O gráfico anual da madeira serrada desde 1972 mostra o explosivo comportamento dos preços desse mercado, com sua cotação atingindo US$ 1711,20 em maio de 2021, cerca de três vezes e meia o preço registrado na máxima de 2018. As paralisações e atrasos nas madeireiras provocaram escassez do produto durante a pandemia, quando a demanda por novas casas explodiu. A madeira estrutural está em falta nos últimos dias. Além disso, o programa de reconstrução da infraestrutura americana está dando suporte aos preços da madeira, já que se trata de um insumo essencial na construção.
A madeira serrada é um mercado futuro ilíquido, com baixo nível de posições em aberto e volume de negociação. Entretanto, o mercado futuro serve de referência para o preço da madeira, que está na máxima histórica em maio de 2021. Cabe dizer, no entanto, que esse produto não é a única matéria-prima na máxima histórica neste mês.
O minério de ferro é o principal componente do aço. Os preços do minério de ferro também atingiram níveis estonteantes nos últimos meses.
Em maio de 2021, a cotação do minério de ferro atingiu quase US$ 220 por tonelada, diante da explosão da demanda por aço.
Paládio registra nível recorde
O paládio é um raro metal precioso que pertence ao setor de metais do grupo PGM ou platina. O paládio é um ingrediente fundamental em catalisadores que reduzem as emissões de motores à combustão. O paládio é um metal denso com alta resistência ao calor, o que explica suas várias aplicações industriais e como metal precioso.
Fonte: CQG
O gráfico anual destaca a ascensão do paládio até a máxima histórica em maio de 2021 a US$ 3019 por onça. A produção anual de paládio vem principalmente de dois países: África do Sul e Rússia. Apesar de a produção sul-africana ser primária, na Rússia o metal é um subproduto da produção de níquel, principalmente na região Norilsk da Sibéria.
A revolução verde na questão climática é o que está dando suporte ao paládio, assim como o aumento das pressões inflacionárias no sistema financeiro global.
Ascensão do cobre é de tirar o fôlego
Diversos participantes do mercado consideram que o cobre seja capaz de “diagnosticar” a saúde da economia global com a ação dos seus preços, razão pela qual é chamado de Dr. Cobre. Seu maior produtor mundial é o Chile e, pelo lado da demanda, a China é um player de peso.
Em 2011, o aumento da inflação após a crise financeira de 2008 e a expansão econômica mundial fizeram o cobre atingir a máxima histórica de US$4,6495 por lb. Em maio de 2021, esse pico deu lugar a outro ainda mais alto.
Fonte: CQG
O gráfico anual do cobre mostra o movimento até US$4,8985 em maio de 2021. Recentemente, o Goldman Sachs (NYSE:GS) chamou o cobre de “novo petróleo”. O Goldman previu que os preços do metal vermelho na Bolsa de Metais de Londres (LME) poderiam alcançar US$11.000 por tonelada nos próximos 12 meses. Sua cotação estava rumo a esse nível na última semana. Os analistas acreditam que o cobre possa atingir US$14.000 por tonelada ou mais em 2025. As políticas verdes, a construção de infraestrutura na China e sua reconstrução nos EUA, além da escassez de semicondutores, estão elevando a demanda por cobre. São necessários de oito a dez anos para desenvolver novas minas. A demanda crescente está superando a atual oferta anual, fazendo o metal vermelho atingir níveis recordes.
O cobre é líder entre os metais de base negociados na Bolsa de Metais de Londres (LME). Os preços do alumínio, níquel, bronze, zinco e estanho estão todos subindo na esteira do cobre.
Outros mercados de matérias-primas – alguns retardatários para ficar de olho
Embora cada commodity tenha características idiossincráticas em suas equações de oferta e demanda, o fator comum que está impulsionando os preços até a estratosfera é o aumento das pressões inflacionárias que deterioram o poder aquisitivo do dinheiro.
E o mesmo pode acontecer com outras commodities. O contrato futuro contínuo de milho registrou máxima a US$ 7,75 por bushel neste mês. A máxima histórica foi em 2012 a US$8,5475. O contrato futuro mais próximo da soja disparou para US$16,7725, com o pico recorde de 2012 a US$17,9475 por bushel. Outras commodities agrícolas, como trigo, açúcar e café estavam recentemente em suas máximas plurianuais.
O ouro atingiu seu recorde a US$2063 em agosto de 2020. O metal amarelo tem um longo histórico de “barômetro” da inflação e atingiu o pico histórico em dólares e praticamente todas as outras divisas. Depois de recuar até a mínima de US$1673,30 no início de março, o ouro começou a registrar mínimas e máximas ascendentes nas últimas semanas.
Fonte: CQG
Como mostra seu gráfico mensal, o ouro futuro voltou para perto do nível de US$1840 no fim da semana passada. Se o comportamento dos preços em outras commodities servir de guia, o ouro pode testar a máxima do ano passado e registrar novos picos recordes. A prata e a platina também são candidatas a valorização no atual ambiente. Além disso, o petróleo e outras commodities energéticas estão em tendências de alta. Se bem que o preço do barril de petróleo esteja bem abaixo dos US$ 100, o etanol recentemente atingiu seu maior preço desde 2014.
Em vista de tudo isso, pode ser que a inflação não seja tão “transitória” assim. Os preços estão subindo, assim como a liquidez e as medidas de estímulo, que funcionam como combustível para a inflação.