Ações versus risco fiscal: é hora de migrar para o crédito?

Publicado 09.01.2023, 12:16

Um erro muito comum na hora de investir é avaliar o risco apenas pela volatilidade de um ativo, como se este fosse o único ponto a ser considerado. De forma simplificada, existem dois tipos de riscos. Um é o matemático, calculado em cima do preço do ativo, ou seja, em cima da volatilidade. Outro é o qualitativo dos portfólios, que não se define pela volatilidade do preço e sim pelo próprio fundamento.

No crédito corporativo privado, se o investidor olhar para a volatilidade, o risco é baixo. Porém, se o empréstimo for feito para a pessoa ou empresa errada, que deixa de pagar a dívida, o investimento passa a valer zero. O risco é binário. De fato, o preço do ativo normalmente não varia, mas quando isso ocorre a perda é total.

Com ações de boas empresas é diferente. Em geral, o investidor não profissional considera que a volatilidade do preço é todo o risco que possui. No entanto, na prática, se ele comprar bem, com margem de segurança, mesmo que a empresa venha a quebrar, há uma série de instrumentos de proteção, além de ativos, de dinheiro em caixa, que podem evitar ou reduzir a perda do dinheiro investido.

O próprio mercado cria mecanismos de defesa, como agora. A expectativa é de que haja uma forte recessão no primeiro semestre de 2023 e, talvez, até uma depressão econômica no segundo. Tal possibilidade, em adição à confusão retórica do novo governo, já está sendo precificada. Isso tem provocado a queda dos preços das ações, até que questões de cunho estrutural da economia sejam corrigidas ou pelo menos, esclarecidas. 

Em outras palavras, o mercado está precificando o risco do País frente a um novo governo que quer expandir gastos sem espaço no orçamento e sem encontrar as fontes de receitas. Mas os bons fundamentos das empresas, por mais que balancem, devem prevalecer no longo prazo, mitigando possíveis perdas. Afinal, bons negócios são aqueles que conseguem repassar aumentos de custos, inflação e impostos para o consumidor. 

A conta da irresponsabilidade fiscal vem no médio longo prazo. A gastança iniciada nos dois mandatos de Lula e de Dilma levaram à crise de 2015. Quem obteve ganho de renda a partir de 2003 viu o poder aquisitivo despencar e voltou à pobreza. A destruição de riqueza gerou a pior retração econômica da história do Brasil. Para se ter uma ideia, desde 1901, houve 8 ocasiões em que o PIB brasileiro teve queda real acima de 1% em relação ao período anterior: 1908, 1914, 1918, 1930, 1942, 1981, 1990 e 2015.  Em alguns desses casos, a recessão se prolongou por mais de um ano, não necessariamente consecutivos, como na crise de 29 e na moratória dos anos 80.

Neste momento de transição de governo, por não terem conhecimento de toda esta espiral, investidores, principalmente os mais leigos, ficam na dúvida entre comprar ações na Bolsa de Valores ou investir em algum fundo de crédito privado. Em 2022, principalmente, a quantidade de resgates registrados em fundos de ações e fundos multimercados foi gigantesca. 

Muito dinheiro foi migrado para fundos de crédito privado corporativo. Mas esta decisão não considera que hoje o nível de endividamento das famílias e das empresas já está nas máximas históricas. Dados da Serasa dão conta de um aumento da inadimplência das empresas de 8,5% em outubro, na comparação anual. A permanecer esta tendência, veremos uma crise no mercado de crédito e o prejuízo será muito maior. Será uma perda permanente de capital. 

Como o segmento de crédito corporativo basicamente não tem volatilidade pois não existe mercado secundário, é natural achar que seu risco é menor. Mas a partir de janeiro deste ano, os fundos para investidores não profissionais terão que marcar seus títulos ao mercado, o que vai causar um susto nos investidores. Já no caso das ações na Bolsa, se o investidor não estiver alavancado, se expondo além do seu patrimônio, e estiver comprado em negócios sólidos e com vantagens competitivas, pode ter uma correção de preços, mas não de valor ao longo do tempo. Talvez perca 10%, 20% ou 30%. Se cometeu o erro de comprar ações de uma empresa muito cara, ou ruim, talvez perca até 50%, mas não tudo. No crédito, perderia.

O mercado de crédito não é uma opção melhor do que o de ações ou de fundos multimercados com volatilidade e risco controlados, mesmo neste momento de altas variações da Bolsa. A recessão econômica impacta tanto o crédito privado quanto o mercado acionário. A diferença é que, mesmo a empresa perdendo parte do seu preço em bolsa, o investidor não precisa, necessariamente, desfazer-se dela, pois seu valor está intacto. Como diz um grande investidor do mercado: “preço é o que você paga, valor é o que você leva”. 

 

*Fernando Luiz é sócio fundador e gestor da Trópico Investimentos

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