O receio de errar pode tornar o erro maior, acreditamos que os gestores da política monetária brasileira caíram nesta armadilha e, agora, sem o desprendimento de fazer uma intervenção corretiva “fora da bula” assistem a deterioração das expectativas de recuperação da economia brasileira, que, lamentavelmente, sinaliza entrar num processo de retração do crescimento com a concomitância da aceleração inflacionária bastante disseminada por todos os setores.
A mais recente reunião do BC/COPOM deixou “por fazer” pontos importantes, pró-ativos imponderáveis, ante um quadro que já se delineava prospectivamente inflacionário e que precisava criar antídoto para cercear a alavancagem do câmbio, ou seja, ajustar mais intensamente a taxa de juro SELIC, colocando-a à frente da curva, e assim exercendo bem a zeladoria pela política monetária nacional.
Agora, como diríamos em tom irônico “Inês é morta” e só resta correr atrás com “remendos operacionais” pouco efetivos visto que a situação instalada tem forte intensidade.
E o que mais desapontador, o BC/COPOM por seus membros em manifestações públicas denotam ter a perfeita noção das péssimas perspectivas, mas fragilizam suas decisões contrariando expectativas e subordinando-se aos ditames dos analistas das instituições que “forçam” suas conveniências. Esta subserviência contumaz fragiliza o órgão gestor da política monetária.
Inflação a 10% é uma perspectiva delineada claramente pelos indicadores e precisava de um tratamento de choque e o instrumento indicado era um aumento forte da taxa SELIC, positiva para conter a inflação e o câmbio, pondo “ordem na casa” e deixando esta história de que poderia conter a recuperação da atividade econômica, que, em realidade, já não ocorre e a economia tende a conter os preços altos pelos preços altos, que acabam inibindo o consumo e provocando a retração consequente da atividade econômica.
Há uma desestruturação total do ambiente nacional, cada uma atribui a culpa à sua conveniência, e o Presidente sem melhores argumentos ironiza ao identificar a política do “fique em casa”, protetiva à saúde e à expansão da pandemia do coronavírus, a causa pelas agruras do impasse que esta seu governo ao ver a perspectiva de retrocesso quando precisava angariar apoio populista com foco nas próximas eleições, principalmente com a dinamização de programas assistenciais relevantes que dependem da elevação da arrecadação.
Faltam fontes sustentáveis para dar suporte às pretensões programáticas de assistência à população mais carente que convive com o empobrecimento crescente, e isto numa situação de equilíbrio fiscal fragilizado é sempre preocupante e reflete sobre o conceito de risco do país.
O mercado financeiro ajustou suas taxas de renda fixa, grandemente já atrelada a IPCA + %, e isto rompe barreiras e tornam mais atraente, pelo menos no curto/médio prazo os investimentos em detrimento da Bovespa, que desta forma perde tração e efetiva atratividade. Até os fundos imobiliários, normalmente perdedores quando o juro é elevado, em grande parte atrelaram suas carteiras a recursos indexados à inflação e ganham atratividade ao oferecerem rendimento atraente.
Por outro lado, o mundo global convive com o receio de retração da dinâmica de recuperação e está atento e mutante a todos os sinais e indícios relevantes.
Os Estados Unidos, que conseguiu equacionar momentaneamente a sua questão orçamentária, tem expectativa de recuperação acentuada da geração de empregos, a ser divulgada hoje, e acentua as especulações de que possa reduzir seus programas de incentivo, o que repercute nas taxas de juro dos treasuries e fortalece o dólar no mercado internacional, mas tem a China com seu problema central na Evergrande, mas com sinais dúbios gerados por sua economia e há incertezas sobre as diretrizes no cenário europeu.
Em realidade, na grande maioria das vezes, correlacionamos a situação brasileira com o resto do mundo, mas o “nosso problema” é muito maior e não encontra no ambiente global pontos de ancoragem para novas expectativas.
O IPCA de setembro divulgado hoje de 1,16% rompendo a barreira de 10,25% nos últimos 12 meses é uma sinalização de que podemos ir além e o quanto a nossa política monetária está atrás da curva.
É imperativo pacificar o entendimento de que o juro alto, em tese, fragiliza o potencial de crescimento da economia, mas a inflação tem poder maior de corrosão da renda e do poder de consumo da população, e os preços administrados tem ainda forte propensão a correção dada a crise hídrica-energética.
O cenário prospectivo é extremamente nebuloso, e há um crescente descrédito na gestão da política monetária, faltando pró-atividade e liderança do órgão gestor.
O câmbio tende a manter volatilidade e, a despeito de algumas mutações momentâneas, o viés continua de alta, da mesma forma que o desempenho do IPCA, que pode atingir parâmetros surpreendemente negativos.