Em um momento em que uma parte considerável do hemisfério norte já se encontra em período de férias de verão, levando a uma queda sensível da liquidez dos mercados globais, a Zona do Euro vivenciou uma das semanas mais movimentadas do ano. Nesta semana que se encerra, tivemos elevada expectativa por conta (i) da decisão do Banco Central Europeu, (ii) da queda do primeiro-ministro da Itália, Mario Draghi e (iii) pela expectativa em torno do término da manutenção do gasoduto Nord Stream e se este seria religado ou não. Dado o impacto destes eventos, a semana merece, sem dúvidas, maior atenção direcionada ao velho continente.
O Banco Central Europeu (ECB, na sigla em inglês) elevou suas taxas de juros em 50bps, surpreendendo a mediana do mercado de 25bps. Esse é o primeiro aumento em 11 anos e o maior desde 2000. O ECB também surpreendeu ao anunciar uma nova ferramenta para combate ao risco de fragmentação. O Instrumento de Proteção à Transmissão (TPI, na sigla em inglês) será um complemento ao conjunto de ferramentas do ECB e pode ser ativado para combater dinâmicas de mercado desordenadas e injustificadas que representem uma ameaça à transmissão da política monetária. A escala das compras do TPI dependerá da gravidade desses riscos.
A decisão do ECB chama atenção pelo teor de urgência adotado pela autoridade monetária. Não somente o movimento foi de aperto, mas esse aperto foi na banda superior das expectativas. Isso torna-se ainda mais extraordinário se consideramos o momento delicado de crescimento do bloco. Ou seja, entre sustentar crescimento e combater a inflação, o ECB mostra uma inclinação maior para o segundo neste momento. Nota-se em todo caso que a autarquia foi lenta em atuar, visto que riscos inflacionários já se mostravam de maneira recorrente há algum tempo.
O ponto número dois acima reforça o delicado equilíbrio político do bloco. A Itália é a terceira maior economia da Zona do Euro e, normalmente, sempre precursora de dificuldades dada sua delicada situação fiscal (150% ao final do ano passado). Uma mensuração de risco de desintegração da Zona do Euro bastante utilizada é o spread (i.e., a diferença) entre o título de 10 anos da Itália e da Alemanha. Esse índice atingiu, nesta semana, o maior patamar desde a crise da covid-19.
Nota-se que a Zona do Euro tem características únicas para um bloco econômico deste tamanho. Apesar de ser uma união monetária, ela não é uma união fiscal. Logo, o ECB tem de considerar não somente como a política monetária impacta a inflação em diversas jurisdições, mas como a perspectiva de menor crescimento e custo da dívida mais alto impactam países com posições fiscais diferentes entre si. Não à toa, o euro permanece pressionado negativamente apesar da perspectiva de aumento dos juros locais.
Finalmente, permanece na Europa os riscos relativos ao fornecimento de gás da Rússia. O gasoduto Nordstream 1 foi religado esta semana após incertezas sobre a duração de uma manutenção programada. Ainda assim, persistem riscos neste terceiro trimestre que podem levar a uma situação geopolítica muito complexa no último trimestre do ano. Portanto, o mercado segue receoso em relação às perspectivas para a Zona do Euro. Dada sua relevância para a economia global, este torna-se mais um risco a ser monitorado junto à (provável) recessão nos EUA e a desaceleração da economia chinesa.