A reação “causa-efeito” será lenta, mas inevitável face à nova realidade

Publicado 26.03.2014, 07:03

O Brasil não perdeu sua condição de grau de investimento, mas foi submetido a uma redução de nota de crédito pela Agência de “rating” Standard & Poor´s, como consequência de um amplo diagnóstico que apontou uma vasta combinação de aspectos predominantemente negativos em relação ao país, que passa pelo deterioração fiscal agravada pela perda de força da credibilidade na gestão, redução da transparência em sua execução, perspectiva de crescimento baixo e alguma fraqueza pelo lado externo. E, por considerar que não será fácil cumprir a meta de 1,9% do PIB para o superávit primário.

Um arranhão forte na imagem do país que terá suas consequências, após termos recebido um “carimbo negativo” de peso do FED americano, que contestamos, mas que apontavam os mesmos deméritos com outras métricas.

Muito provavelmente a grande maioria dos analistas, surpreendidos pelo rebaixamento que já não esperavam para este ano, imaginavam uma operação desmonte imediata dos posicionamentos nos ativos brasileiros, envolvendo nacionais e estrangeiros.

Muitos atribuíram a não ocorrência da precipitação sob o argumento que “o fato já estava precificado nos ativos”, o que provavelmente seja uma meia verdade, tanto quanto não são iguais a “possibilidade de ocorrência de um fato” e “ a realidade de ter se tornado efetivo o fato”.

Há uma diferença para pior e que impõe um ajuste nos preços e perspectivas que naturalmente mudam quando o fato deixa de ser uma hipótese, a bem da verdade quase desconsiderada, e passa a ser fato concreto.

E inevitavelmente este ajuste ocorrerá e o país será penalizado com natural redução de fluxos de recursos externos, elevação do preço da moeda americana, saída de recursos externos, enfim movimentos típicos de agravamento de perda de atratividade.

O Brasil será objeto de maior rigor na seletividade por parte dos investidores estrangeiros, e isto será muito ruim, pois o país já tem perspectivas preocupantes em relação ao setor externo este ano.

Estes movimentos de ajustes devem ocorrer gradualmente, sendo absolutamente incoerente a reação verificada ontem, apreciando o real e com bolsa em alta. “Andar de lado”, cautelarmente no primeiro dia, seria uma postura sensata, mas os movimentos verificados foram bastante assimétricos com o momento presente, ficando mesmo a impressão de que houve “orquestração” para demonstrar que o fato não sensibilizou o mercado financeiro, só que nas circunstâncias atuais acabou por deixar muito evidente a atipicidade.

A decisão da S&P coloca o governo brasileiro numa “camisa de força” em relação à gestão, quase que o condicionando ao cumprimento das metas de rigor fiscal e gastos anunciados recentemente, sob risco de no ano que vem ser penalizado com a perda do “grau de investimentos” se não obter sucesso.

Em termos Brasil este talvez tenha sido o maior mérito da medida, a S&P não contemporizou e quer ver a entrega do compromisso para devolver a credibilidade ou retirá-la de forma contundente. Também não agiu aleatoriamente, visto que ouviu um grande número de economistas e o próprio governo, e a partir destes encontros adotou a medida.

O ano de 2014 já se configurava difícil em termos de inflação, baixo crescimento e perspectivas ruins para o setor externo. As dificuldades ficarão maiores, especialmente no setor externo.

É ilusório imaginar-se que todos os preços dos ativos financeiros estavam precificados, na realidade já havia certo relaxamento em relação ao risco de redução da nota de crédito, e mesmo que irracionalmente admitamos que estivessem precificados, a queda dos fluxos externos diminuirá o apetite e os fragilizará mais com a queda da demanda.

No oposto, estará o preço da moeda americana que deverá repercutir como já se esperava face à perspectiva de piora das contas externas brasileiras neste ano, mas que sofrerá impacto maior por contenção adicional de ingressos e intensificação de saídas.

O capital especulativo “kamikaze” poderá até ser ousado bastante e procurar o mercado brasileiro caso ocorra alta do preço da moeda americana e com taxa SELIC maior do que a atual, possibilitando melhor conversão para reais e melhor rentabilidade, mas será sempre um “capital arisco” que vem tira proveito e se retira logo.

Os efeitos deverão ocorrer mais nos capitais estrangeiros de médio e longo prazos direcionados à renda fixa, além, naturalmente, de capitais estrangeiros direcionados à conta capital, ou sejam os produtivos, denominados IED´s.

Certamente a perda de capitais estrangeiros de qualidade será mais intensa do que poderá ingressar de capitais especulativos.

A queda do preço do dólar ocorrida ontem que o depreciou até R$ 2,30 foi suficiente para descaracterizá-la como um movimento natural do mercado. É insustentável e absolutamente incompatível com o momento atual.

Certamente, o movimento de ajuste dos preços dos ativos será lento, mas ocorrerá por inevitável em decorrência do novo alinhamento dos fluxos de recursos externos em relação ao Brasil.

O custo das captações externas deverá ser agravado, este tópico não passará incólume a um ajuste desfavorável para o Brasil, e isto pode desestimular captações que estavam sendo programadas.

Não adianta perdermos tempo contestando ou buscando desqualificar quem nos avalia neste momento no contexto global, nossas desculpas serão sempre desculpas, e em grande parte nós mesmos sabemos que são, e os organismos que nos avaliam terão sempre peso maior no mercado internacional.

Tudo poderá ficar melhor ou pior, o Brasil só depende do Brasil para superar este contexto negativo presente.

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