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A origem do colapso monetário: Crise do marco alemão nos anos 20

Publicado 28.11.2023, 06:00
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A década de 1920 na República de Weimar, Alemanha, constitui um capítulo singular na narrativa econômica global, uma sinfonia caótica de forças financeiras que culminou em uma das mais proeminentes hiperinflações já testemunhadas. Nesse período efêmero, a curva ascendente dos índices de preços testou os limites da compreensão econômica e da estabilidade monetária. 
 
Entre os anos de 1921 e 1923, o Reichsmark, a moeda alemã da época, mergulhou em uma espiral inflacionária, onde as taxas anuais ultrapassaram as centenas de percentuais, catapultando-se, em 1923, para o espetacular reino dos milhões por cento em termos mensais. Os fundamentos desse fenômeno, embora multifacetados, encontram suas raízes nas exacerbadas políticas e econômicas instáveis frente à ocupação francesa do Ruhr. Como um pesadelo econômico que transcendia os cálculos convencionais, a hiperinflação alemã da década de 20 até hoje traduz os perigos latentes de políticas monetárias e fiscais no cenário do pós-guerra.

 

Muitos sujeitos eminentes, como Karl Hellferich, ex-chanceler do Reich, advogavam que a hiperinflação do marco alemão se deu por conta de um desequilíbrio estrutural da balança de pagamentos, principalmente por conta da dívida de guerra que a Alemanha mantinha após a Primeira Guerra Mundial, firmada a partir do Tratado de Versalhes. Essa tentativa de imputar todos os problemas estruturais, tanto do marco, como da condução das políticas fiscais e monetárias, apenas ao déficit na balança comercial foi um grande impedimento para uma reforma das instituições e regras do Reichsbank.

Se seguirmos as raízes e a cronologia dos eventos, nos deparamos com uma amálgama de eventos, causados por displicências para com a condução da política econômica e completo descaso com os predicados básicos da economia.

O marco alemão foi desvinculado do padrão ouro em 1914, durante a Primeira Guerra Mundial. O abandono do padrão ouro foi uma medida adotada por muitos países participantes da guerra devido à necessidade de financiar os esforços de guerra, o que levou a uma flexibilização das políticas monetárias e à suspensão da conversibilidade das moedas em ouro. No caso alemão, a desvinculação do marco ao ouro ocorreu para permitir uma maior flexibilidade nas políticas monetárias e facilitar o financiamento das despesas relacionadas à guerra.

Aqui, é importante ressaltar que, uma moeda não necessariamente precisa ser lastreada, desde que ela componha as características qualitativas, que são: Durabilidade, Portabilidade, Fungibilidade, Divisibilidade, Aceitabilidade e Limitação da Oferta. O conceito de valor utilidade na teoria econômica destaca a ideia de que o valor de um bem está intrinsecamente relacionado à sua capacidade de satisfazer as necessidades e desejos dos indivíduos. No contexto das moedas, o valor utilidade se manifesta na capacidade da moeda de facilitar trocas e transações econômicas, servindo como meio eficaz de armazenamento e transferência de valor. Vide o bitcoin e algumas outras criptomoedas, que cumprem o papel de meios circulantes sem estarem vinculados a nenhum ativo físico, uma vez que sua emissão já é controlada a partir da sua programação.

Contrariamente à necessidade de lastro, a teoria do valor utilidade defende que a moeda não precisa ser respaldada por um ativo físico, como ouro, para ser valorizada. Em vez disso, sua aceitabilidade e confiança na sua utilidade para realizar transações são fundamentais. Se uma moeda é amplamente aceita, divisível, durável, e possui outras características mencionadas anteriormente, ela adquire valor por meio da confiança coletiva na sua capacidade de facilitar as trocas econômicas, independente de lastros tangíveis.

Agora, o padrão-ouro, é uma importante ferramenta para controlar a emissão massiva de meios circulantes, delimitando o poder, muitas vezes discricionário que um governo possui, em manipular a oferta monetária em uma determinada economia, principalmente para angariar algum capital político no processo.

Com a monetização da dívida sem a contraprestação de uma receita fiscal, que seria uma fonte de receita que não causaria um aumento nos meios circulantes, porém, a sua valoração seria altamente impopular, o Reichsbank começou a cobrir os déficits crônicos da economia alemã pela emissão de letras do Tesouro. O desconto das letras do Tesouro propiciou o canal para uma inflação que era mostrada diretamente pelo agregado monetário. A Alemanha passou todo o ano-fiscal de 1914 e grande parte de 1915 sem criar nenhuma fonte de receita ordinária.

Com os crescentes déficits e os eventuais pagamentos de reparações, estava formada a "tempestade perfeita" para a catástrofe do marco alemão: pagamentos de reparação, desvalorizações cambiais, elevação nos preços domésticos de importação e exportação, elevação nos preços domésticos, déficits orçamentários e, um consequente aumento da demanda por créditos bancários e, para cristalizar e retroalimentar esse ciclo, o aumento na emissão de moeda.

No ano de 1923, na edição de dezembro do jornal Wirtschaft und Statistik, publicaram algumas mensurações da desproporcionalidade das emissões de letras do Tesouro e empréstimos do governo em comparação com as fontes de receita do governo alemão angariadas a partir de impostos. O resultado revelou que apenas 15% das despesas totais foram cobertas com impostos, indicando uma defasagem significativa entre os gastos governamentais e as receitas tributárias. Como resultado, a lacuna financeira foi preenchida por meio da monetização, com emissões massivas de letras do Tesouro, impulsionando a inflação e desvalorizando o câmbio do marco alemão.

 

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