A restauração florestal é um dos principais pontos de convergência nas agendas do clima e da biodiversidade no Brasil. Se o mundo precisa depender menos da energia fóssil, por aqui conter os avanços da crise climática passa obrigatoriamente pelo fim do desmatamento e pela recuperação de ecossistemas nativos. Essas ações também são cruciais para manter a qualidade e quantidade de nossos recursos hídricos e conservar a nossa ampla biodiversidade de fauna e flora nos diferentes biomas brasileiros.
O Brasil tem um passivo superior a 21 milhões de hectares para atender o que prevê o Código Florestal em relação à conservação e recuperação de áreas degradadas nos seis biomas brasileiros. Deste total, o país assumiu o compromisso internacional de restaurar 12 milhões de hectares até 2030, o que equivale a quase três vezes o tamanho do estado do Rio de Janeiro.
Promover essa restauração é um desafio que envolve não apenas o compromisso do setor público e do terceiro setor, mas principalmente o engajamento do setor produtivo, um dos grandes beneficiados com a produção de serviços ecossistêmicos – como água, polinização de culturas agrícolas e controle climático, mediante compensação de emissões de gases de efeito estufa.
Em 2018, a TNC Brasil publicou o livro “Economia da Restauração”, no qual traz dados de um estudo feito pelo Instituto Escolhas em 2016, que mostra que, para recuperar os 12 milhões de hectares do compromisso assumido pelo Brasil, seriam necessários investimentos de R$ 42 bilhões a R$ 70 bilhões, valores já corrigidos pela inflação (IPCA).
Hoje, boa parte dos investimentos em restauração vem de editais públicos, de organizações da sociedade civil, ou de capital concessional (ou filantrópico) bastante pulverizados. Ou seja, os recursos para a restauração, na prática, são bastante limitados e geralmente associados a riscos.
Por conta dos altos investimentos necessários, comumente se diz que a restauração é onerosa, mas ela não deveria ser tratada simplesmente como um ônus. Deve ser pensada como investimento para o caminho de um futuro sustentável, buscando ações que promovam uma economia de baixo carbono competitiva, responsável e inclusiva, integrando as agendas de conservação da biodiversidade, uso sustentável das florestas e mitigação e adaptação às mudanças climáticas, sempre de olho na garantia de recursos naturais para as novas gerações.
Precisamos mudar essa visão e desenvolver mecanismos de redução de risco e financiamento privado combinados, de forma a apoiar a restauração em grande escala, além, claro, de buscarmos técnicas mais eficientes, inovadoras e menos onerosas. Para tanto, é necessário diversificar o investimento, desenvolvendo mecanismos de mitigação e repartição de riscos, capazes de atrair financiamento privado, para apoiar a restauração em grande escala, aproveitando também os produtos e serviços ecossistêmicos oriundos da floresta, como a cadeia de valor da sociobioeconomia, por exemplo.
Além disso, a restauração tem potencial para gerar R$ 31 bilhões em retornos econômicos e contribuir com cerca de R$ 5,3 bilhões a R$ 8,8 bilhões em arrecadação de impostos.
Cabe ressaltar que os benefícios da restauração vão além dos ambientais e econômicos, alcançando também os sociais com a geração de empregos. Um estudo realizado pela Sociedade Brasileira de Restauração Ecológica (SOBRE), Pacto pela Restauração da Mata Atlântica (Pacto), Aliança Pela Restauração na Amazônia e Coalizão Brasil, Clima, Floresta e Agricultura, com apoio de instituições como a TNC Brasil, mostrou que, no país, a restauração florestal tem capacidade de gerar um emprego a cada 2,5 hectares restaurados.
Caso seja cumprida a meta de restauração – de 12 milhões de hectares até 2030 – o setor poderia contribuir com mais de 2,5 milhões de empregos. Em um país cuja taxa de desocupados ultrapassa os nove milhões de pessoas, segundo dado do IBGE referente ao trimestre de agosto a outubro de 2022, o potencial de emprego da restauração não pode ser ignorado. No melhor dos cenários, com os incentivos adequados, estima-se que a restauração conseguiria suprir quase 30% do déficit ocupacional do país. Além disso, novas oportunidades de trabalho podem alavancar investimentos adicionais para a implementação da restauração e apoiar a sua manutenção a longo prazo.
Os desafios ambientais da humanidade são crescentes e as soluções para o combate à crise climática e conservação da biodiversidade passam necessariamente por ações interdisciplinares, que podem ser finalmente integradas em políticas públicas governamentais. Sabemos que investimentos em floresta e em restauração, além de manterem serviços para garantir a vida no planeta, como água e alimento, também ajudam a movimentar a roda econômica. Temos um belo e necessário desafio pela frente: a integração da agenda econômica e ambiental.