Diariamente, somos bombardeados por dados e informações do mercado que, após alguma análise, chegam a uma mesma conclusão: tudo certo e nada resolvido. A profundidade da crise no mundo e, especialmente, no Brasil, ainda é incerta, devido ao grande número de fatores subjetivos envolvidos, como o momento exato e a velocidade de retomada econômica das maiores economias do mundo, além da nossa realidade e desafios locais.
De certo, até o momento, o que podemos afirmar é que teremos uma recessão pela frente e um calendário de balanços majoritariamente negativos. Por isso, falaremos sobre o que muda para as oportunidades do mercado de ações no longo prazo. Começando por dois alertas.
O primeiro ponto é que muito tem sido dito sobre buscar essas oportunidades, calculando o dividend yield - ou seja, o retorno da ação de acordo com o dividendo pago por ela. O fato é que, isoladamente, esse indicador não é o suficiente para uma boa análise e, neste momento, apresenta muitas distorções devido à volatilidade que tivemos no mês passado. Além disso, é claro, no cenário de recessão que enfrentamos os lucros diminuem e isso deverá afetar diretamente o pagamento de dividendos e investimentos das companhias.
O segundo alerta é sobre o entendimento de ações “baratas” em relação ao valor das empresas, considerando a soma de seu patrimônio, que isoladamente não representa o nível do endividamento da empresa, ou a liquidez do seu patrimônio em caso de urgência de caixa.
Percebam que minha crítica não é sobre o modelo de análise – que tem entre os seus objetivos reduzir a subjetividade por meio dos dados, para que os investidores possam tomar uma decisão mais racional e pautada nos fundamentos e na probabilidade –, mas sobre o momento que vivemos, onde algumas regras do jogo mudaram para os investidores que não contam com uma reserva de investimentos mais robusta.
Tanta incerteza se deve ao fato de que nós não temos mais um cenário otimista para sustentar leituras parciais. E tudo indica que a recuperação será mais lenta do que se imaginava. A expectativa de uma recuperação em V, de forte retomada após o fundo da crise, já está sendo substituída pelo formato em U, que prevê uma lateralização mais longa, ou seja, o mercado não irá retomar o crescimento de forma tão imediata quanto se imaginava inicialmente.
A bola da vez, portanto, está nos resultados das empresas no primeiro trimestre deste ano. Eles já começaram a ser divulgados e, ainda que os piores resultados ainda sejam esperados para o segundo trimestre, os dados já começaram a dar uma ideia do fluxo de caixa e nível endividamento das companhias, ajudando no processo de identificação daquelas que podem ter maiores chances de passarem pela crise com o mérito de serem chamadas de oportunidades de compra.
Esse fator é fundamental porque trata-se de uma transição do cenário da especulação para a consolidação dos fatos, o que é bom para o mercado e para o investidor. A identificação dos setores mais atingidos e daqueles que se beneficiam do cenário deve ficar mais evidente, conforme os balanços, que são retratos do que já aconteceu, começarem a ser revelados.
Dito isso, reforço a recomendação para que você, investidor que deseja saber quais são as melhores empresas para se investir em tempos de crise, faça a lição de casa e acompanhe esses números e as fontes confiáveis que podem analisá-los para você. No entanto, é preciso desapegar da ideia de buscar as ações que irão bombar no “mês que vem” que, muitas vezes, leva o investidor a achar que investir é o mesmo que apostar. Isso porque a crise passará – mais cedo ou mais tarde – e a busca por empresas com preços atraentes e boa capacidade de geração de caixa no longo prazo é a melhor estratégia para se adotar hoje e sempre.