Vai perder, vai ganhar, vai perder… perdeu.
Desde a última terça-feira (28/04) o setor bancário da bolsa tem vivido uma montanha russa de emoções.
Enquanto o mercado esperava uma queda no seu resultado, Santander (SA:SANB11) reportou um lucro 3,4 por cento maior do que o do 4T19 e um retorno sobre o patrimônio (ROE) de 22 por cento.
O mercado ficou otimista com as ações dos bancões, que subiram entre 8,3 por cento (ITUB4) e 13,4 por cento (BBAS3 (SA:BBAS3)) naquele dia, já que as principais instituições financeiras do Brasil frequentemente reportam variações de resultado similares.
Mas 2020 definitivamente não está sendo um ano regular (o pentágono até divulgou vídeos oficiais de OVNIs recentemente… e ninguém deu bola).
Na quinta-feira (30/04), o Bradesco (SA:BBDC4) soltou um resultado bastante diferente, consideravelmente abaixo das expectativas de mercado. Foi reportada uma queda de -43,5 por cento no lucro, e o ROE caiu de 21 por cento para 12 por cento.
Como consequência, as ações dos bancos caíram entre -3,6 (BBAS3) e -7,2 (BBDC4) no pregão pré-feriado.
Ontem, as ações dos bancões caíram mais de -3,6 por cento (em média), com o mercado ansioso para saber se o Itaú (SA:ITUB4) adotaria uma postura mais conservadora (como BBDC), ou se também entenderia que maiores provisões para perdas com a crise não precisariam ser feitas agora (como SANB).
Quem apostou no conservadorismo do banco acertou.
Se no ano passado Itaú ultrapassou a barreira dos 7 bilhões de lucro por trimestre, no 1T20 o lucro foi de “apenas” 3,9 bilhões, 46 por cento menor em relação ao 4T19.
O ROE do banco caiu de 24 para 13 por cento, transformando o Santander no banco privado mais rentável no Brasil — ao menos neste trimestre.
Devido à baixa visibilidade sobre a extensão e profundidade dos efeitos da crise atual, os bancos aproveitaram a divulgação de resultados para descontinuar seus guidances para 2020.
A variável chave: provisão para perdas
O que fez o lucro do Itaú e Bradesco cair pela metade em apenas um trimestre foi o reconhecimento da “gordura” para proteção contra o esperado aumento da inadimplência na crise.
Os bancos devem seguir regras objetivas da Res. nº 2.682/1999 do CMN para contabilizar sua provisão para devedores duvidosos (PDD). Mas, apesar disso, eles têm bastante discricionariedade para definir seus níveis de perdas potenciais/complementares, baseados em suas experiências com crises anteriores e seus modelos de crédito.
Como a variável que impactou negativamente os resultados foi a provisão para perdas (e não inadimplência em si, que deve começar a aparecer no 2T20), a enorme diferença entre os resultados dos dois maiores bancos privados do país com o do Santander pode ser explicada pelas diferentes visões que os bancos têm face o potencial de dano da crise em seus respectivos negócios.
É importante ressaltar também que o Santander pode elevar suas projeções nos próximos trimestres, assim como Itaú e Bradesco podem reverter suas reservas de PDD caso a crise não seja tão grave assim.
Mosaic Theory
Eu adoro divagar sobre as possíveis conexões entre fatos, que a princípio não são relacionados, e acabar chegando à conclusões malucas.
Algumas coisas me chamaram a atenção no resultados dos bancos no 1T20.
O mercado esperava um aumento na taxa efetiva de impostos para algo próximo de 34~35 por cento, devido ao aumento da CSLL para os bancos que entraria em vigor no começo de 2020.
Mas o que observamos foi uma alíquota efetiva estável em 30 por cento em Santander e Bradesco, e uma queda para menos de 20 por cento na alíquota efetiva do Itaú.
Acontece que o governo publicou no DOU do dia 28/04 que o aumento de 15 para 20 por cento na alíquota do CSLL está valendo, apenas, a partir de março e isto se aplica para todos os bancos.
No caso de Itaú a redução ocorreu porque o menor resultado antes de impostos tornou mais relevante economicamente o benefício fiscal dos juros sobre o capital próprio, com impacto de 13 pontos percentuais na alíquota teórica.
Meu ponto é: dado o iminente aumento nos impostos, uma provisão de perda maior neste trimestre faria sentido. Mas às vezes isto é apenas uma divagação minha indo longe demais, encaixando as peças erradas no quebra-cabeças. Outro detalhe me deixou ainda mais intrigado.
Apesar de a carteira com rating D-H (de menor qualidade) ser praticamente igual entre os três, a concentração entre os 100 maiores clientes do Santander é a segunda maior, com 24 por cento, contra 33,5 por cento no Bradesco e 16 por cento no Itaú.
Além disso, o percentual da carteira destinado a grandes empresas (salvas as diferenças de classificação) representa 31 por cento no Santander, enquanto no Bradesco e Itaú representa mais de 40 por cento da carteira expandida total no Brasil.
De maneira generalizada, o segmento de grandes empresas tende a performar melhor que o de pessoas físicas ou de pequenas e médias empresas durante a crise.
Ainda assim, a PDD do Santander cresceu apenas 15 por cento, enquanto as de Bradesco e Itaú cresceram ao redor de 70 por cento no trimestre.
Se fosse para ter uma PDD maior agora, com objetivo de aproveitar o imposto menor, era de se esperar que todos os bancos o fizessem, mas não foi este o caso. Também vale citar que nem todos os tipos de provisões são despesas que deduzem o imposto a ser pago.
Enfim, chega de mosaicos malucos… por enquanto.
Copo meio cheio, copo meio vazio
Se a PDD veio para massacrar o resultado do Itaú neste trimestre, a carteira de crédito, por sua vez, apresentou uma boa evolução: 9 por cento entre o 4T19 e o 1T20.
Com destaque para o segmento de grandes empresas, que vinha caindo há muito tempo, a carteira inverteu a tendência em meados do ano passado e cresceu 12,5 por cento apenas neste trimestre. Adicionalmente, o segmento de PMEs cresceu 10 por cento e o de pessoas físicas caiu -1 por cento.
Os spreads financeiros — por motivos claros — serão bem mais gordos para aqueles que precisam de recursos bem no meio da crise. O Itaú também se beneficia da credibilidade que tem e o funding de clientes cresceu 28 por cento em relação ao 4T19.
A redução de 7 por cento nas despesas operacionais também foi um destaque positivo e ocorreu devido a menores despesas com a participação nos resultados, com desligamentos e processos trabalhistas, com serviços de terceiros e com processamento de dados.
Por fim, os demais destaques negativos foram:
- a queda na receita em serviços e seguros (-8 por cento) nas operações com cartões, impactadas pelas medidas de distanciamento social. Houve também a redução dos serviços de assessoria financeira e corretagem devido a menor atividade no mercado de capitais e de menores receitas com taxas de performance na administração de fundos;
- a redução na margem financeira com clientes devido a mudança regulatória na taxa de juros do cheque especial, os impactos negativos da queda da selic no capital de giro, os menores spreads de crédito e o mix de produtos com maior participação do segmento de grandes empresas;
- redução na margem financeira, com o mercado tendo menores resultados das estratégias de hedge dos investimentos no exterior e da mesa de trading;
- aumento de 13 por cento na carteira de crédito renegociado, principalmente devido à carência oferecida a clientes adimplentes para auxiliar no enfrentamento a COVID-19.
Apesar do resultado ruim no trimestre, é fato que crise não vai durar para sempre e, mesmo com as dificuldades que o banco tem a enfrentar, acreditamos na retomada de sua rentabilidade após a tempestade.
Até preferimos a postura conservadora do banco em um momento de tantas incertezas como este, mas o crescimento na sua provisão de perdas no trimestre parece ter sido um pouco exagerado.
E não podemos nunca nos esquecer da variável preço: ITSA4 (SA:ITSA4), nosso cavalo para investir em Itaú no Investidor de Valor, negocia a apenas 7x lucros e 1,3x seu patrimônio (ainda sem os resultados do 1T20 divulgados). Uma pechincha.
Abraço