Em julho do ano passado, a criptomoeda Tron comprou a maior rede descentralizada do mundo: o BitTorrent. Essa compra garantiu que a criptomoeda de Justin Sun, o carismático e excelente marketeiro líder da empreitada, realizasse uma das crenças de Satoshi Nakamoto. O lendário, porém anônimo, criador do Bitcoin acreditava que para uma rede do tamanho do BitTorrent seria necessário para trazer real valor a uma criptomoeda sustentada por proof-of-work. Vale notar que o Tron usa um sistema de delegated proof-of-stake, porém na criação do Bitcoin não havia de maneira considerável essa possibilidade.
A Tron é uma criptomoeda que divide opiniões. Alguns acreditam que ela é uma opção de plataforma que consegue sustentar grandes inovações e que seu sistema de delegated proof-of-stake é suficiente para garantir descentralização; outros são mais céticos e há desconfiança sobre o real potencial da moeda. Uma coisa, no entanto, é dado e não podemos discordar: houve um forte crescimento da moeda em termos de valor comparado ao Bitcoin. De acordo com o site CoinMarketCap, três de junho do ano passado era possível comprar toda a rede da Tron com 527,827 BTC; atualmente, para fazer essa mesma operação, seriam necessários 531,148 BTCs. Apesar de um crescimento tímido, basta lembrar que a Ethereum em BTC caiu mais de 50% de valor para notar que algo diferente aconteceu com a Tron.
A Tron fez uma série de escolhas que a princípio soavam equivocadas, mas se mostraram razoavelmente corretas. Seu whitepaper possuía trechos plagiados de outros projetos, assim como parte significativa do seu código foi, num eufemismo muito generoso, “inspirado” no client EthereumJ. Esse plágio, no entanto, deixa compatibilidades que tornam migração fácil entre as duas plataformas. Com os problemas de precificação de smart contracts do Ethereum, a Tron pode vir ganhar tração. A princípio o que parecia uma solução claramente errada se tornou algo razoável, apesar de haver críticas técnicas com alguma plausibilidade (que não discutirei por não serem exatamente relevantes para o ponto discutido no texto).
A compra do BitTorrent para muitos soou inicialmente marketing que levaria a uma aplicação cuja maior função seria ser uma “cortina de fumaça” para a falta de killer apps na blockchain da Tron. Entretanto, com o whitepaper do token BTT uma aplicação plausível parece ser discutida. Há poucas menções a aspectos técnicos ou sobre a integração com a blockchain, porém a ideia é conceitualmente agradável: usar a blockchain para criar “memória” na rede Bittorrent e incentivar maior seeding de arquivos.
Contudo, já há críticos a essa proposta. O ex-Chief Strategy Officer da BitTorrent afirmou que atualmente a rede da Tron não seria capaz de comportar o número de transações que o Bitcon necessita. O executivo é mais um dos muitos que duvidam da atual taxa de transação da Tron. Contudo, Justin Sun já anunciou também o uso da tecnologia ZK-Snarks para dar fungibilidade e anonimato para sua rede. Essa aplicação, inspirada no ZCash, também é uma das promessas da Ethereum para resolver seus atuais problemas de escalabilidade. Dessa maneira, há a possibilidade de maior volume de transações que atualmente, seja qual for o valor atual.
Dessa maneira, a Tron saiu de “claramente scam” para “projeto com pontos interessantes”. Ainda não me convenceu plenamente -- sigo a filosofia “o seguro morreu de velho” -- mas vejo chances consideráveis da criptomoeda seguir com um 2019 estável ou positivo frente às outras altcoins. Acompanhar esse ativo pode ser interessante para quem tiver maior paciência para seguir lançamentos e novidades. Vale lembrar sempre, no entanto, que o stop loss é nosso amigo e merece cuidado e atualização constante, ainda mais se tratando com um ativo que divide tantas opiniões e é pouco transparente sobre a origem de suas ideias e códigos.