Como sempre afirmo, a maior beleza do Bitcoin é a independência de governos e organizações centrais. Isso se dá por meio da descentralização e do protocolo de consenso criado por Satoshi Nakamoto. Na visão descrita por Satoshi em seu white paper, havia uma crítica ao sistema de reservas fracionárias; no primeiro bloco do Bitcoin havia uma inscrição criticando esse aspecto do sistema bancário e sua relação com governos.
Entretanto, desde a criação por Satoshi, as coisas mudaram. As placas ASIC chegaram e aumentaram a concentração de mercado do Bitcoin por meio da criação de custos fixos para a mineração. Outras economias de escala e energia elétrica formaram mais um tipo de concentração: a em lugares com energia elétrica barata. O país que mais se destacou nisso foi a China. Cerca de 80% do hashpower do Bitcoin vem de seis mineradores; cinco deles estão no gigante asiático.
Pode-se ver que há fatores geopolíticos que podem vir a prejudicar o Bitcoin. Apesar da proeminência do mercado de mineração e produção de ASICs, a China é extremamente volátil quanto ao que fazer com as criptomoedas. Já houve banimentos completamente draconianos da tecnologia e, por isso, criptomoedas como, por exemplo, a NEO tiveram grande destaque justamente por serem chinesas e possivelmente mais próximas de pautas as regulações do governo.
No dia 5 de outubro, saiu um artigo no repositório ArXiv a respeito do poder descomunal da China na manutenção do Bitcoin. O artigo é extremamente interessante por mapear os possíveis ataques do governo chinês ao Bitcoin e demais criptomoedas onde ele tenha poder. Além do mais, esses resultados são relacionados a motivações para a China realizar esses ataques e evidências de que ela já tenta influenciar o desenvolvimento do mercado quando necessário.
Para recapitular os potenciais impactos da China, podemos lembrar que reguladores emitiram decretos políticos para influenciar diretamente exchanges e setores de mineração; eles também afetam o Bitcoin indiretamente através de externalidades como os preços da energia. Sua estrutura de vigilância da internet permite bloqueio de exchanges e sites relacionados a ICOs e criptoativos. Apesar desse passado, julgo que os motivos da China para ataques são, no curto prazo, improváveis; ideologia, controle de lavagem de dinheiro, controle financeiro e ataques a países dependentes não parecem justificar o mal-estar internacional de atacar uma tecnologia que o Ocidente está olhando de maneira razoavelmente positiva.
Por fim, recomendo a leitura desse artigo. As motivações listadas, ainda que improváveis, dão uma dimensão da geopolítica do Bitcoin. Acompanhar a evolução da posição da China frente aos temas que a motivariam é fundamental para evitar surpresas. Como sempre, “o preço da liberdade é a eterna vigilância”: as criptomoedas, como ferramenta para um mundo descentralizado e investimento, pode vir a ter oponentes poderosos. Saber quando sair, portanto, pode ser importante para retornos positivos em todas as frentes.