Com o recesso parlamentar, podemos parar e respirar um pouco. O Congresso foi o principal agente influenciador – dentro do campo da política – das oscilações do Ibovespa durante 6 meses e meio. Quem não admite que perdeu alguns cabelos durante esse processo está mentindo, ou já não os têm.
O investidor brasileiro acompanhou a tramitação da reforma da Previdência com o coração na mão e, na falta de maior entendimento sobre Brasília e seus desdobramentos, demorou para assimilar o ambiente favorável à reforma robusta como desfecho da trama. Agora que os projetos de lei, as PECs e as MPs estão parados, umas férias não fazem mal a ninguém, não é mesmo?
Nesse contexto, o político deve ficar morno até agosto. É hora de inspirar o ar, colocar a cabeça no lugar e planejar o que vem pela frente no segundo semestre. Aproveito para adiantar outras medidas que estão na pauta para destravar a economia depois que a Previdência for definitivamente aprovada (nunca foi uma questão de se, e sim de quando).
1) Reforma tributária
Sem dúvida, é o projeto mais importante depois da reforma da Previdência. O tema vem sendo abordado pelo Congresso há tempos, mas a dificuldade de encontrar um consenso trava sua aprovação.
Há cinco propostas disputando espaço para serem levadas adiante: uma da Câmara (de autoria de Bernardo Appy e assinada por Baleia Rossi – MDB/SP), uma do Senado, uma da equipe econômica do governo, uma dos secretários estaduais da Fazenda e uma do setor privado. Todas as propostas têm um ponto em comum: simplificação tributária. O Brasil tem um sistema tributário complexo e isso culminou indiretamente em uma guerra fiscal entre os entes federativos.
A proposta de Baleia Rossi (SA:RSID3) já foi aprovada na CCJ da Câmara e, agora, aguarda instalação da Comissão Especial. No caso da proposta do Senado (em uma clara busca por protagonismo da casa), o projeto será apresentado na volta do recesso. O governo, por sua vez, quer entregar o texto pronto agora no hiato dos parlamentares.
O envio de um texto não será uma decisão fácil, na medida em que as propostas são diferentes entre si e defendem grupos específicos de interesse. Em um próximo texto, farei uma análise aprofundada dos projetos para elucidar sobre qual é o mais interessante para o contexto brasileiro.
2) Privatizações
Repletas de polêmicas, as privatizações são um dos principais instrumentos que Paulo Guedes trouxe como aliados para reverter os problemas fiscais do país. A ideia por trás de vender ativos que estão sob gestão estatal é elevar a receita e diminuir as despesas do governo e, ao mesmo tempo, possibilitar à empresa um leque maior de investimentos e geração de empregos. Basicamente, torná-la mais eficiente e direcionar o foco do governo para áreas prioritárias, como educação, saúde, segurança pública, entre outras.
O tema, porém, é bastante espinhoso. Historicamente, existe uma grande rejeição da população e uma forte organização sindical quando o assunto é vendas de empresas estatais. Já tivemos grandes mobilizações em torno do tema, como "O Petróleo é Nosso". O próprio presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) já sinalizou que prefere explorar outros caminhos e que enxerga muitas dificuldades no caminho das privatizações.
Contudo, o governo segue confiante quanto à possibilidade de vender pelo menos alguns ativos. Devemos presenciar em agosto a entrega de um novo Projeto de Lei sobre a privatização da Eletrobras (SA:ELET3), em que o governo lançará ações da companhia no mercado, diminuindo sua participação de pouco mais de 60% hoje para algo inferior a 50%.
Os custos políticos de uma privatização são altíssimos. O governo deverá fazer suas contas e analisar a relação risco-retorno dessa jogada. No caso da Eletrobras, vejo espaço (apertado) para que o projeto seja aprovado e vejo a privatização com muito bons olhos. No caso de outras empresas, como Petrobras (SA:PETR4) e Banco do Brasil (SA:BBAS3), a chance é ínfima. Um caminho alternativo é explorar fortemente a venda das subsidiárias destas empresas.
3) Reforma administrativa do funcionalismo público
Citada por Maia em seu discurso anterior ao resultado da votação da reforma no primeiro turno da Câmara, a reforma das carreiras do funcionalismo público é um dos maiores desafios atuais. Faz sentido pensar que o problema previdenciário, dentre outros fatores, é também um problema de salários do funcionalismo: recebe-se muito e muito cedo; os pisos são altos e os tetos são rapidamente alcançáveis.
Dessa maneira, a reforma tem como objetivo melhorar a produtividade dos trabalhadores do setor público, além de corrigir eventuais ineficiências da máquina estatal. O governo planeja apresentar esse projeto somente em 2020 e toma muito cuidado nas suas declarações. O tema é extremamente polêmico/impopular e pode gerar fortes reações de grupos organizados da sociedade. O assunto também vale um artigo a posteriori.
4) MP da Liberdade Econômica
A Medida Provisória 881/19, apelidada de MP da Liberdade Econômica, foi editada em 30 de abril com o principal objetivo de desburocratizar o funcionamento de empresas no país. Atualmente, a MP está aguardando votação na Câmara e, em seguida, vai para o Senado. Ela foi aprovada em Comissão Mista no início de julho.
Segundo o site do Congresso Nacional, a MP "institui a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, estabelece garantias de livre mercado, análise de impacto regulatório, e dá outras providências." Em outras palavras, é um conjunto de proposições que irão facilitar a vida do empresário, principalmente o pequeno e micro.
O texto prevê dispensa da exigência de alvará para os pequenos negócios que envolvem atividades de baixo risco (costureiras, sapateiros, cabeleireiros, etc.). Os municípios devem definir quais atividades econômicas estarão nesse grupo. Uma vez incluído, o trabalho poderá ser exercido em qualquer horário ou dia da semana, desde que respeitadas algumas normas já vigentes.
Ainda, existem outras medidas relevantes para o ambiente de negócios: startups terão imunidade burocrática, a CVM poderá reduzir exigências de entrada de pequenos e médios empreendedores no mercado de capitais, o eSocial será extinto e algumas leis da CLT (cerca de 30) serão modificadas.
Todo o projeto visa tornar o processo de empreender menos intrincado e aumentar a eficiência – tanto do Estado como ente regulador e fiscalizador, quanto do empresário.
5) Mudanças no FGTS
O governo anunciou que irá aplicar medidas para provocar um choque de demanda na economia. A primeira delas, anunciada na semana passada, é a liberação de parte dos recursos FGTS para trabalhadores.
O governo anunciou que vai lançar mão de medidas de estímulo para a economia. Segundo Paulo Guedes, o governo deve divulgar o pacote completo no decorrer dos próximos dez dias, sendo o anúncio do FGTS previsto para a próxima quarta-feira.
Ainda não está definido como essa liberação será feita. No caso do FGTS, há duas alternativas: em uma delas, o saque contemplaria apenas as contas inativas; na outra proposta, atingiria as contas ativas e inativas com escalonamento de percentuais de saques, à exceção dos trabalhadores demitidos sem justa causa. No segundo caso, a medida teria caráter permanente – o acesso parcial ao dinheiro das contas ativas do fundo seria uma espécie de "décimo-quarto". Fala-se em liberar entre 30 a 42 bilhões de reais, que devem ir para os bolsos de trabalhadores e, consequentemente, aumentar o consumo das famílias.
Um novo panorama
Todas as medidas acima, assim como a reforma da Previdência, contribuem para um cenário em que a economia pode se recuperar de maneira saudável e duradoura. Há uma janela de oportunidades enorme aberta hoje no país, tanto para empresários – que podem protagonizar o crescimento econômico nos próximos anos – quanto para consumidores e investidores do mercado financeiro.