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42 Trilhões de Destruição de Riqueza: Nova Era ou Uma Pedra Sobre a Atual?

Publicado 05.05.2022, 10:06
Atualizado 09.07.2023, 07:32

Antes de mais nada, você leu certo e são realmente 42 trilhões, com um T no começo. A perda de valor de mercado combinada com o valor das ações listadas nas bolsas globais, mais o prejuízo dos títulos emitidos pelos governos globais. Ou seja, não estamos levando em consideração a maior parte do mercado de crédito que é privado. Nem as empresas não listadas que, com certeza, também se desvalorizaram e que têm um impacto mais importante dado que o private equity nunca foi tão expressivo quando comparado com as empresas de capital aberto. 

Desde os anos 1980, quando a inflação americana foi enterrada pelo então presidente do Federal Reserve, Paul Volcker, um tipo de carteira subiu a proeminência como quase sendo um tipo de investimento à prova de qualquer cenário, uma carteira com partes quase iguais em bolsa e em renda fixa americana. 

Um dos principais expoentes desse movimento, o empresário americano Ray Dalio, criador da maior gestora independente do mundo, a BridgeWater, com mais de 140 bilhões de dólares sob gestão, conseguiu tal proeza criando uma carteira chamada "all weather" com cerca de 40% do portfólio investido em renda variável e 60% em renda fixa. 

Essa mistura funcionou quase como um relógio por praticamente 40 anos, uma vez que os ativos têm correlação inversa um com o outro e, com o tempo, foram capazes de se valorizarem juntos. 

O que isso quer dizer? Em momento de choque, a bolsa caía trazendo perdas para essa parte do portfólio, mas que era compensada por ganhos nos títulos prefixados que se apreciavam com a expectativa de que o Fed iria ter que cortar os juros para reanimar a economia. 

A partir da era Greenspan à frente do Fed, quase toda vez que a economia nos Estado Unidos entrava ou estava prestes a entrar na recessão, então, o BC americano cortou os juros, o que fazia depois do susto. Com isso, tanto os títulos prefixados como as ações se valorizaram. Isso funcionou toda vez durante décadas.

No entanto, existia uma limitação: o juro não poderia passar para baixo de zero. E dessa forma, a porção da carteira de renda fixa não teria mais como apreciar, quebrando o modelo à prova de choques econômicos. Mas, mesmo assim, isso não foi um problema.

A partir de 2009, aos poucos, o Fed começou a efetivamente comprar títulos emitidos pelo Tesouro no mercado, chegando aos atuais níveis de 6 trilhões de dólares no seu balanço. Essa política monetária conhecida como Quantitative Easing teve exatamente o efeito que beneficiaria ambos os mercados: renda fixa e variável. 

Por estar presente comprando bilhões todo mês de papéis do Tesouro, o Fed conseguiu derrubar ainda mais as taxas de juros de longo prazo para níveis artificiais, o que, por outro lado, fez com que as empresas na bolsa se valorizassem. Mais uma vez, o portfólio funcionou.

No entanto, dessa vez, todos sabiam que apenas uma coisa realmente traria ao fim essa época de excessos: a inflação. E foi o que aconteceu, depois do atual presidente do Fed, Jerome Powell, se provar errado no diagnóstico do atual movimento inflacionário (dizendo que era transitório, o fenômeno que hoje sabemos ser o maior surto de alta de preços em quase 40 anos), os mercados não tiveram opção a não ser subir os juros de forma agressiva, prevendo que o Fed teria que fazer algo mesmo se não quisesse, dado que seu mandato principal é o de combate à inflação. 

Apenas para ilustrar, as taxas de juros de 2 anos dos títulos públicos americanos saíram nos últimos 7 meses de 0.25% para 3% ao ano, fenômeno também observado em outros pontos mais longos da curva. É isso: a taxa foi multiplicada por 12x, algo tão drástico que faz o movimento na nossa Selic parecer normal, ainda mais quando levado em conta a história de estabilidade no mercado americano. 

Essa dinâmica de alta nas taxas de juros causou uma queda no preço dos títulos e nas ações da bolsa, ao mesmo tempo, diferentemente de outras vezes, uma vez que o juro zero e a inflação galopante não permitia mais criatividade financeira por parte do BC americano. 

E, infelizmente, a conta por enquanto tem sido essa. Da sua máxima em novembro, o prejuízo da carteira "all weather" global já está em 42 trilhões. Depois de 40 anos, parece que, por ora, esse modelo de investimento pode ter se esgotado. O mês de abril foi o pior já registrado para esse tipo de estratégia com a forte alta das taxas de juros e com a queda das bolsas. 

O futuro é incerto e podemos estar vendo o começo de um movimento ainda maior ou apenas uma pedra no meio de um caminho que deve continuar inalterado. Difícil tirar conclusões, mas me parece ser possível concluir que o papel de uma gestão de recursos mais ativa e tática pode voltar a ser um diferencial. 

Temos pela frente um ambiente desafiador o qual saber onde e quando entrar em determinada classe de ativos ganha peso e importância. E agora que os juros sobem no mundo, ter cash parece ser uma opção válida em cenários de incerteza. Mas, em geral, a lição maior é que o mercado financeiro é como a vida e tudo sempre muda. Essa é a única certeza que podemos ter.

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